03 de Novembro de 2018, Sábado: Pois eu sei que isso resultará na minha salvação graças à vossa oração e à assistência do Espírito de Jesus Cristo (v. 19). 

Leitura: Fl 1,18b-26

Continuamos com a leitura da carta aos Filipenses que foi escrita na prisão, provavelmente em Éfeso, entre os anos 55-57 (At 19). Paulo está incerto sobre o rumo que sua situação tornará: poderá ser morto ou posto em liberdade. Mas ele tem grande confiança de que será solto e que poderá visitar de novo, pessoalmente, a comunidade de Filipos.

A Nova Bíblia Pastoral (p. 1434s) comenta nossa leitura no contexto dos vv. anteriores: Paulo se manifesta feliz por estar preso por causa de Jesus Cristo. Mais ainda. É um presente que lhe permite tornar Jesus Cristo ainda mais conhecido. É tática sua aproveitar qualquer situação e auditório para difundir o evangelho, que se afirma nas prisões (v. 7). De fato, devido a elas, Jesus tornou-se conhecido no pretório (v. 13) e elas encorajam outros irmãos a proclamarem a palavra com liberdade (v. 14). Apesar das prisões (v. 17), Paulo se alegra, pois, o que importa é que Cristo seja proclamado (Ef 3,1). Esse júbilo permite ao Apóstolo até certa ironia diante do sofrimento e ameaça de morte, quando conclui: “Para mim viver é Cristo e o morrer é lucro” (v. 21). Contudo, o dilema é real: entre o interesse da comunidade e a morte “para estar com Cristo”, o Apóstolo prefere o primeiro, por ser mais importante que o seu interesse pessoal (2Cor 5,6-9).

De qualquer maneira, com segundas intenções ou com sinceridade, Cristo é anunciado. E eu me alegro com isso, e sempre me alegrarei (v. 18b). 

A Bíblia do Peregrino (p. 2818) comenta: Alguns da comunidade ou nela se aproveitam da prisão de Paulo com segundas intenções, mesmo que não fosse para pregar um evangelho diferente ou contrário (cf. Gl 1,6-9). Por ambição, cobiça ou inveja: ou seja, para ocupar o lugar do ausente, para rivalizar seus êxitos. Paulo denuncia com brevidade rigorosa, mas reage com generosidade: o que importa não é sua pessoa, e sim a imagem de Cristo. Esta é uma lição permanente de apostolado.

Pois eu sei que isso resultará na minha salvação graças à vossa oração e à assistência do Espírito de Jesus Cristo (v. 19). 

“Isso resultará na minha salvação”. Paulo cita Jó 13,16 cuja versão grega reconduz o pensamento à situação do prisioneiro, e talvez evoque as relações tensas entre Jó e seus amigos. Aqui a “salvação” significa a saída da prisão (vivo) mas também a se inscreve no contexto amplo da “salvação” total, a libertação final como dá a entender a seguir (cf. 1,28; 3,20).

Segundo a minha viva expectativa e a minha esperança, não terei de corar de vergonha. Se a minha firmeza continuar total, como sempre, então Cristo vai ser glorificado no meu corpo, seja pela minha vida, seja pela minha morte (v. 20).

“Se a minha firmeza continuar total” Poder-se-ia compreender também: “vendo-o sabendo-o toda a gente”. Paulo se abre-se a qualquer eventualidade, “seja pela minha vida, seja pela minha morte”; cf. a fórmula lapidar de Rm 14,8: “Se vivemos, é para o Senhor que vivemos, e se morremos, é para o Senhor que morremos. Portanto, quer vivamos quer morramos, pertencemos ao Senhor”.

A Bíblia de Jerusalém (p. 2206) comenta: O cristão, unido fisicamente a Cristo pelo batismo e pela eucaristia, pertence-lhe pelo seu próprio corpo (cf. 1Cor 6,15; 10,17; 12,12s.27, Gl 2,20; Ef 5,30). Por isso a vida desse corpo, os seus sofrimentos e até a sua morte tornam-se misticamente de Cristo, que nele habita e que disso tira a sua glória (cf. 1Cor 6,20; Rm 14,8). Essa união é particularmente estreita no caso de um apóstolo como Paulo (cf. Cl 1,24; 2Cor 4,10s).

Pois para mim, o viver é Cristo e o morrer é lucro. Entretanto, se o viver na carne significa que meu trabalho será frutuoso, neste caso, não sei o que escolher. Sinto-me atraído para os dois lados: tenho o desejo de partir, para estar com Cristo – o que para mim seria de longe o melhor – mas para vós é mais necessário que eu continue minha vida neste mundo (vv. 21-24).

A Bíblia do Peregrino (p. 2818) comenta: Discernimento entre dois bens, o seu pessoal e o proveito de seus fiéis (2Cor 5,8). À vida e morte corporais, da pessoa em seu estado corpóreo presente, corruptível, se opõe a vida transformada ou salva pela presença e ação do Senhor glorificado. Vida que já começou no batismo e que continua em plenitude para além da morte corporal ou biológica. Paulo não está avalizando aqui uma concepção filosófica grega da alma separada, mas pensa em sua pessoa concreta, como na promessa ao bom ladrão (Lc 23,43). Esse “estar com” é vislumbrado por alguns orantes do AT (Sl 16,11; 73,23-25).

“Minha vida neste mundo” (v. 24), em grego a mesma expressão de v. 21: “Viver na carne”.

A Tradução Ecumênica da Bíblia (p. 2281) comenta: Não sabendo se sairá vivo ou morto da prisão, Paulo é levado a uma reflexão sobre a vida em Cristo. Em seu pensamento, a vida e a morte corporais estão sempre associadas ao mistério do Cristo (1Cor 6,12-20): por isso é associado tanto aos sofrimentos e à morte de Cristo como à sua ressurreição… Paulo sente um “desejo” ardente (termo muito forte que se traduz muitas vezes por “avidez”) por ser unido a Cristo (com ele: 1Ts 4,17; 5,10; 2Ts 2,1; Rm 14,8) imediatamente após a morte, mas não precisa sob que forma encara essa união. O mesmo desejo se exprime em 2Cor 5,6-9. Em todas as outras passagens, ele fala de uma ressurreição final dos mortos (1Ts 4,13-18) após um juízo universal: 1Cor 15,12-23; Rm 14,10.

Também a Bíblia de Jerusalém (p. 2206) comenta o “estar com Cristo”: A morte, assim como a vida, é uma maneira de estar “com” Cristo (cf.  1Ts 5,10; Rm 14,8; Cl 3,3; etc.). Paulo não explica como ele concebe esse “lucro” (v. 21), essa solução que é “muito melhor” (v. 23), numa existência com Cristo, que sucede diretamente à morte, sem esperar a ressurreição de todos (cf. 2Cor 5,8).

Por isso, sei com certeza que vou ficar e continuar com vós todos, para que possais progredir e alegrar-vos na fé. Assim, com a minha volta para junto de vós, vai aumentar ainda a razão de vos gloriardes em Cristo Jesus (vv. 25-26).

“Sei com certeza” (cf. v. 22 “não sei o que escolher”): A Bíblia do Peregrino (p. 2818) comenta: É curioso Paulo pensar que a escolha dependa dele e não dos romanos, e que a escolha desemboque em convicção sobre o resultado. Paulo oferece sua disponibilidade ao ato de discernimento; então recebe uma luz especial que equivale a uma resposta; daí sua convicção, que não é resultado de previsão humana. Os filipenses e muitos outros saem ganhando; ele sai perdendo por ora, para sair ganhando no final.

“Vou ficar e continuar com vós todos”. Paulo se lembra da urgência da missão e descarta a sorte “de longe melhor” que seria para ele uma condenação à morte (de que ainda falará em 2,17), para estar com Cristo. Mas o apóstolo não quer deixar os que precisam dele, como o pastor não deve abandonar o rebanho (cf. Jo 21,15-17).

“A minha volta para junto de vós”. Em At 20,1-6, vindo de Éfeso, Paulo passa novamente em Filipos; aqui sua expectativa se realizou, diferentemente do pressentimento que exprime em Mileto (At 20,25).

“A razão de vos gloriardes em Cristo Jesus”, ou seja, o orgulho de serem cristãos, de pertencerem com Paulo a Cristo Jesus. A Tradução Ecumênica da Bíblia (p. 2281) comenta: O motivo profundo da “gloria” dos filipenses é a comunhão em Cristo, que também será reavivada … por sua volta a Filipos. Mais adiante (2,16; cf. 1Ts 2,19), é a vida da comunidade que é a glória de Paulo (cf. Rm 4,2…).

Evangelho: Lc 14,1.7-11

No cap. 14, Lc junta quatro cenas que têm a ver com banquete, ou convites à refeição, numa espécie de simpósio ao estilo grego (cf. 5,29a; no AT, cf. as instruções sobre banquetes e convidados em Eclo 31,21-32,13). Como na multiplicação dos pães (9,10-17p), nesse banquete se prefigura a Eucaristia e se anuncia o banquete celeste.

Aconteceu que, num dia de sábado, Jesus foi comer na casa de um dos chefes dos fariseus. E eles o observavam (v. 1).

A primeira frase do evangelho de hoje repete a de ontem que apresentou a primeira cena com a cura de um hidrópico (vv. 1-6, cf. evangelho de ontem); assim Jesus mostrou mais uma vez que a vida (cura) vale mais do que uma regra no sábado (não trabalhar), cf. 6,6-11p; 13,10-17. Em Lc, Jesus é convidado várias vezes por fariseus (7,36; 11,37).

Jesus notou como os convidados escolhiam os primeiros lugares. Então contou-lhes uma parábola: (v. 7).

Aqui “parábola” tem seu sentido bíblico de sentença de sabedoria, com em Mc 7,17.

“Escolhiam os primeiros lugares”, lit. “leitos”. É o que Jesus critica nos escribas em 20,46. Nas refeições solenes da época, não se sentava à mesa; mas os convidados se estenderam sobre os leitos (11,37; 12,37; 13,29; 14,7-10; 17,7; 20,46; 22,14; 24,30).

”Quando tu fores convidado para uma festa de casamento, não ocupes o primeiro lugar. Pode ser que tenha sido convidado alguém mais importante do que tu, e o dono da casa, que convidou os dois, venha te dizer: ‘Dá o lugar a ele’. Então tu ficarás envergonhado e irás ocupar o último lugar. Mas, quando tu fores convidado, vai sentar-te no último lugar. Assim, quando chegar quem te convidou, te dirá: ‘Amigo, vem mais para cima’. E isto vai ser uma honra para ti diante de todos os convidados” (vv. 8-10).

Ao invés de ser um momento de partilha e confraternização, a ceia a qual Jesus foi convidado, era mais um meio para marcar diferenças sociais e discriminar as pessoas consideradas menos importantes. A Bíblia do Peregrino (p. 2505) comenta: Num banquete de casamento, o protocolo designa rigorosamente os lugares. A parábola fala de consequência, não de finalidade. Pois, se alguém se dirige ao último lugar para provocar a honra de ser chamado ao primeiro, está incorrendo na mesma vaidade, inclusive mais refinada: “É melhor ouvir: suba para cá do que ser humilhado diante de um nobre” (Pr 25,6-7).

A Tradução Ecumênica (p. 2009) comenta: À primeira vista, Jesus nos dá nos vv. 8-10 uma lição de habilidade social, comparável a Pr 25,6-7. Mas o seu conselho termina no v. 11 com uma lição de humildade que se opõe às preocupações hierárquicas do mundo judaico (cf. Qumran).

Porque quem se eleva, será humilhado e quem se humilha, será elevado” (v. 11).

Trata-se de um aforismo (sentença breve e conceituosa, cf. Pr 15,33: “À frente da glória caminha a humildade”) de valor geral, que pode desprender-se do contexto (cf. Ez 17,24; 21,34; cf. o Magnificat em Lc 1,51-53). Exemplo máximo é o próprio Jesus que se fez servo (Fl 2,6-11; Jo 13). Aqui a frase condena a segurança orgulhosa dos fariseus (cf. 16,15) e será repetida em 18,14 na parábola do fariseu e do publicano no templo.

O site da CNBB comenta: O mundo em que vivemos é marcado pela concorrência, pela luta constante no sentido de superar as outras pessoas. É sempre uma luta de um contra os outros para vencer, estar por cima, e, por causa dessa concorrência, nunca sobra lugar para a amizade, o amor e a fraternidade. Jesus nos mostra que entre nós, que somos seus discípulos, não deve ser assim. Devemos buscar a promoção das pessoas, valorizar aqueles que estão ao nosso lado, a fim de que, promovendo as pessoas, elas também nos promovam, de modo que temos o crescimento de todos e não apenas de alguns e vivamos como irmãos, filhos do mesmo Pai que está nos céus, e não como inimigos em uma batalha constante.

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