14 de abril de 2018 – Sábado: Ouvimos hoje a leitura da instituição dos diáconos como segundo grupo de líderes além dos doze apóstolos.

Leitura: At 6,1-7

Ouvimos hoje a leitura da instituição dos diáconos como segundo grupo de líderes além dos doze apóstolos.

Naqueles dias, o número dos discípulos tinha aumentado, e os fiéis de origem grega começaram a queixar-se dos fiéis de origem hebraica. Os de origem grega diziam que suas viúvas eram deixadas de lado no atendimento diário (v. 1).

Também na comunidade primitiva dos “discípulos” (v. 1) nem tudo era ideal (cf. 2,24-27; 4,32-37), houve também conflitos (cf. 5,1-11), desta vez entre dois grupos, os “helenistas” e os “hebreus”. Os hebreus são judeus nativos na Palestina (província romana que engloba Judeia e Galileia), falam aramaico, mas no culto leem a Bíblia em hebraico (assim os apóstolos da Galileia e os nativos de Jerusalém). Os “helenistas” são judeus da diáspora, ou seja, dispersos em vários países do Império Romano, cuja língua mais falada nesta parte oriental era o grego. Muitos ficavam no seu país de origem, uns poucos se mudaram para Jerusalém para aí passar seus últimos anos e serem sepultados na cidade santa (p. ex. Simão de Cirene, Mc 15,21p) ou passaram um tempo como peregrinos. Havia sinagogas especiais para eles lá (6,9; 24,12), onde se lia a tradução grega da Bíblia (LXX, iniciada no século III a.C.); muitos eram fieis às tradições dos antigos, outros se converteram ao cristianismo.

Talvez nesse capítulo comece uma segunda parte do livro, com o aparecimento deste novo grupo na comunidade de Jerusalém. Os helenistas provocam tensões novas, “começaram a queixar-se” (v. 1a; lit. “murmurar” que recorda as repetidas queixas ou protestos dos israelitas no deserto, cf. Ex 15,24; 16,2; 17,3; Nm 11,4s; 14,2s; 20,2s).

A ocasião trivial, embora sentida, da partilha, talvez esconda tensões mais profundas: “Os helenistas diziam que suas viúvas eram deixadas de lado no atendimento diário” (v. 1b). As viúvas, grupo social desvalido e objeto de atenção especial na tradição bíblica, vivem da caridade na comunidade cristã. A diferença de língua (e de mentalidade e compreensão da fé) é origem desta discriminação, e esta corrói a unidade.

Então os Doze Apóstolos reuniram a multidão dos discípulos e disseram: “Não está certo que nós deixemos a pregação da Palavra de Deus para servir às mesas. Irmãos, é melhor que escolhais entre vós sete homens de boa fama, repletos do Espírito e de sabedoria, e nós os encarregaremos dessa tarefa. Desse modo nós poderemos dedicar-nos inteiramente à oração e ao serviço da Palavra” (vv. 2-4).

“Os doze” (v. 2; designação inusitada neste livro, cf. 1,15-26) convocam uma assembleia de discípulos e propõem uma solução. Os doze apóstolos (cf. Mc 3,14p; At 1,12-26) pertencem aos hebreus e representam o povo de Israel (doze tribos, cf. Gn 35,22b-26; Ex 1,1-5). Eles são as testemunhas oculares de Jesus (desde seu batismo até sua ressurreição, cf. 1,21s) e não podem “deixar a pregação da palavra de Deus para servir às mesas” (v. 2). É preciso formar um novo comitê (ministério) encarregado de partilha. As duas atividades, da palavra de Deus e do alimento das pessoas se chamam “serviço” (diakonia em grego, v. 4; cf. as obras da misericórdia, materiais e espirituais).

A proposta agradou a toda a multidão. Então escolheram Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo; e também Felipe, Prócoro, Nicanor, Timon, Pármenas e Nicolau de Antioquia, um pagão que seguia a religião dos judeus. Eles foram apresentados aos apóstolos, que oraram e impuseram as mãos sobre eles (v. 6).

A assembleia elege e propõe nomes, todos eles gregos; Nicolau era “um pagão que seguia a religião dos judeus”, lit. “um prosélito” (cf. 2,11), ou seja, recém convertido e circuncidado). Os apóstolos, “oraram e impuseram as mãos sobre eles” (v. 6; cf. 13,3; 1Tm 4,14), lhes transmitiram assim o encargo e a graça para cumpri-lo.

O número é “sete” (cf. os sete dias da criação em Gn 1; os setenta (e dois) povos em Gn 10 e discípulos além dos apóstolos em Lk 10,1), corrente em grupos judeus e diferente dos “doze”. As qualidades requeridas são “boa fama, repletos do Espírito e de sabedoria/prudência” (v. 3; cf. Ex 28,3; Is 11,3). A ordenação, escolha e dedicação dos sete diáconos se parece com a escolha dos setenta colaboradores de Moisés que partilhavam do seu “espírito” (Ex 18,13-26; Nm 11).

Entretanto, a Palavra do Senhor se espalhava. O número dos discípulos crescia muito em Jerusalém, e grande multidão de sacerdotes judeus aceitava a fé (v. 7).

O estranho é que não vemos esses sete homens “servindo a mesa”, mas “pregando a palavra” (Estêvão em 6,8-7,60; Filipe em 8,5-40 que em 21,8 é chamado de “evangelista”), como se fossem uma instância subordinada aos doze para dirigir os helenistas. Com a criação deste novo ministério o incidente fica resolvido, e o narrador o indica noticiando o contínuo crescimento da comunidade; personificando a “Palavra” ou mensagem, diz que “crescia” (v. 7; 12,24; 19,20; cf. 2,41). Até das fileiras dos inimigos acérrimos, a classe sacerdotal, brotavam conversões ao cristianismo.

 

Evangelho: Jo 6,16-21

Depois da multiplicação dos pães, o evangelista narra o milagre de Jesus andando sobre o mar, ambos tradicionais, antes de anexar seu discurso sobre o pão da vida (evangelhos da próxima semana).

Ao cair da tarde, os discípulos desceram ao mar. Entraram na barca e foram em direção a Cafarnaum, do outro lado do mar. Já estava escuro, e Jesus ainda não tinha vindo ao encontro deles. Soprava um vento forte e o mar estava agitado. Os discípulos tinham remado mais ou menos cinco quilômetros, quando enxergaram Jesus, andando sobre as águas e aproximando-se da barca. E ficaram com medo (vv. 16-19).

Após a tarde feliz (multiplicação dos pães), a noite do medo e da epifania; após a incompreensão do povo, a revelação aos discípulos. Já os evangelistas Mc e Mt apresentaram, depois da multiplicação dos pães, a noite em que Jesus caminhava sobre o mar (Mc 6,32-52; Mt 14,13-33). Os dois acontecimentos lembram o povo de Israel no tempo de Moisés, alimentado pelo maná no deserto (Ex 16) e libertado pelo poder de Deus sobre o mar (Ex 14). Moisés e Elias no monte Sinai assistiram uma teofania (Ex 19; 24; 33-34; 1Rs 19), Jesus fará sua manifestação (epifania, cristofania) em ação e palavra. Os discípulos têm que experimentar a oposição dos elementos, água e vento, e mais ainda a ausência do Senhor (cf. 1Rs 19,11).

Em Jo, a versão do milagre no lago é muito simples e despojada. Não faltam os elementos simbólicos: a noite, o mar agitado (cf. Sl 93; 107; Jn 2), a ausência de Jesus. Em troca, falta a ordem soberana de Jesus que acalma o mar (Mc 4,39p). Seu domínio, ele o manifesta “andando” sobre a água (v. 19). “Caminha sobre o dorso do mar” (Jó 9,8) e “não ficava rastro de suas pegadas” (Sl 77,20).

Mas Jesus disse: “Sou eu. Não tenhais medo”. Quiseram, então, recolher Jesus na barca, mas imediatamente a barca chegou à margem para onde estavam indo (vv. 20-21).

O que precisa aquietar são os temores dos discípulos (v. 19). Ele o faz com a fórmula tradicional “não tenhais medo”, e com a fórmula frequente em Jo de autorrevelação: “Sou Eu” (eco do nome divino em Ex 3,14: “Eu sou aquele que sou”; cf. Dt 32,39; Dt 32,39; Is 41,4; 43,10.13; Jo 8,24.28.58; 13,19; 18,5.8).

Em Jo, Jesus não sobe na barca (como em Mc e Mt), mas “imediatamente a barca chegou à margem para onde estavam indo” (v. 21). Em Jo 21,4, Jesus ressuscitado aguarda na margem do lago.

Pode-se chamar esse relato de epifania ou cristofania, porque nele se manifesta sensivelmente a divindade poderosa. É próprio de Deus caminhar sobre as alturas do mar (Jó 9,8; cf. Sl 77,20; Eclo 24,55) e dominá-lo (cf. 4,41; Sl 65,8; 77,17; 89,10; 107,29).

O site da CNBB comenta: Nós podemos nos encontrar com Jesus nas situações e nos momentos em que menos esperamos que isso possa acontecer e, quando isso acontece, podemos nos assustar e até mesmo nos sentir assombrados, com muito medo. Mas a nossa postura deve ser justamente o contrário disso tudo. Quando encontramos Jesus, ele sempre nos mostra algo de concreto para as nossas vidas e para onde devemos chegar, nos revela alguma coisa que nos ajuda na superação das dificuldades que encontramos, ele nos mostra que o seu amor e a sua presença não são algo abstrato nas nossas vidas, mas que a sua presença é sempre amor concreto de Deus, força de superação e conquista do novo que nos revela o Reino definitivo.

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