19 de maio de 2017 – Sexta-feira, Páscoa 5ª semana

Leitura: At 15,22-31

Hoje ouvimos um comunicado oficial da Igreja de Jerusalém enviado pelos portadores Paulo, Barnabé e outros membros da comunidade de Jerusalém, à Igreja de Antioquia e às igrejas da região, “aos irmãos vindos do paganismo” (v. 23). A missão entre os pagãos recebe uma confirmação importante por parte da Igreja de Jerusalém, Igreja-mãe. Havia (antes ou depois) uma estadia de Pedro em Antioquia (Gl 2,11-14) e o tema foi discutido no chamado “Concílio de Jerusalém” que deixou claro que judeus e pagãos convertidos pertencem ao povo de Deus pela fé e pela graça.

O concílio decidiu que os pagãos convertidos não precisam ser submetidos às leis judaicas, por exemplo, à circuncisão. Se não entram no mundo judeu, são chamados a deixar os costumes da vida pagã: sacrifícios aos deuses pagãos e imoralidade sexual. Definitivamente, os cristãos do mundo pagão, convertidos de um passado moral e cultual pregresso, têm cidadania na Igreja. A decisão foi tomada pelos homens em Jerusalém, mas eles estavam movidos pelo Espírito Santo.

Pareceu bem aos apóstolos e aos anciãos, de acordo com toda a comunidade de Jerusalém, escolher alguns da comunidade para mandá-los a Antioquia, com Paulo e Barnabé. Escolheram Judas, chamado Bársabas, e Silas, que eram muito respeitados pelos irmãos (vv. 22).

Terminada a discussão com um acordo, passa-se à assembleia geral que ratifica o acordo e se dispõe a comunicá-lo, por meio de dois delegados, à comunidade de Antioquia onde surgiu o conflito. Os delegados de Jerusalém são como um intercâmbio cortês e pacífico: Judas “Bársabbas”, nome desconhecido em outros lugares (cf. 1,23), e “Silas”, futuro companheiro de missão de Paulo (15,40-18,5), e idêntico ao “Silvano” nas cartas apostólicas (1Ts 1,1; 2Ts 1,1; 2Cor 1,19; 1Pd 5,12).

Através deles enviaram a seguinte carta: “Nós, os apóstolos e os anciãos, vossos irmãos, saudamos os irmãos vindos do paganismo e que estão em Antioquia e nas regiões da Síria e da Cilícia. Ficamos sabendo que alguns dos nossos causaram perturbações com palavras que transtornaram vosso espírito. Eles não foram enviados por nós. Então decidimos, de comum acordo, escolher alguns representantes e mandá-los até vós, junto com nossos queridos irmãos Barnabé e Paulo, homens que arriscaram suas vidas pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo. Por isso, estamos enviando Judas e Silas, que pessoalmente vos transmitirão a mesma mensagem. Porque decidimos, o Espírito Santo e nós, não vos impor nenhum fardo, além destas coisas indispensáveis: abster-se de carnes sacrificadas aos ídolos, do sangue, das carnes de animais sufocados e das uniões ilegítimas. Vós fareis bem se evitardes essas coisas. Saudações!” (vv. 23-29).

Já em v. 20, Tiago propôs estas cláusulas: “contaminar-se com ídolos” é comer carne sacrificada a divindades pagãs (cf. 1Cor 10,20-22). Comer sangue (Dt 12,16.23) ou carne de animais estrangulados (sem tirar-lhes o sangue) repugna à lei (Gn 9,4; Lv 3,17; 17,10-15) e à sensibilidade dos judeus que não comem a carne de animais imolados nos sacrifícios pagãos (cf. v. 29 e 21,25; cf. 1Cor 8,10). A palavra grega porneia (prostituição, fornicação; cf. Mt 19,9), aqui traduzida “uniões ilegítimas”, parece designar todas as uniões irregulares enumeradas em Lv 18.

Mas nesta carta se acrescentam detalhes dignos de nota. São desautorizados os extremistas judaizantes e sua ação espontânea (cf. v. 1; Gl 2,4; cf. Mt 23,4): “Eles não foram enviados por nós” (v. 24). Em contraste, são louvados Barnabé e Paulo por seu espírito de sacrifício em prol do evangelho, “homens que arriscaram suas vidas pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo” (v. 26). Apela-se ao Espírito Santo, que ratifica a decisão dos responsáveis; em termos modernos, diriamos que sua decisão é carismática: “Decidimos, o Espírito Santo e nós” (v. 28).

Depois da despedida, Judas e Silas foram para Antioquia, reuniram a assembleia e entregaram a carta. A sua leitura causou alegria, por causa do estímulo que trazia (vv. 30-31).

Os antioquenos se sentem aliviados da confusão, reanimados com a carta oficial. Sua ação apostólica, a missão aos pagãos sem exigir a circuncisão foi substancialmente confirmada e restabeleceu-se a paz. As restrições de Tiago não pesam numa comunidade mista como a deles, mas eram importante para manter a comunhão numa época em que a Eucaristia ainda era celebrada junto à refeição comum (2,24.46; 1Cor 11,17-34). Ao comunicado se acrescenta a voz do Espírito que anima pela boca seus novos profetas que anunciam Jesus aos pagãos.

Comparando a narração de Lucas em At 15 com o relato do próprio Paulo em Gl 2, vemos umas diferenças: A assembleia do Concílio baixa e entrega a Paulo um decreto sobre as observâncias de pureza ritual impostas aos cristãos vindo da gentilidade (vv. 22s); mas tarde, porém, Tiago parece notificar este mesmo decreto ao apóstolo, parecendo supor que ele não o conheça (21,25). O próprio Paulo não fala deste decreto nem em Gl 2,6 (onde fala da assembleia em Jerusalém, do concílio), nem em 1Cor 8-10 e Rm 14 (onde trata de problemas análogos). O decreto de At 15,29 foi levado às igrejas da Síria e da Cilícia (15,23); no entanto, Lucas não diz que Paulo o tenha proclamado ao percorrer essas regiões (15,41), mas fala dele a propósito das cidades da Licaônia (16,4), e o decreto alcance importância universal.

Essas dificuldades explicar-se-iam se admitíssemos que Lucas juntou numa só duas controvérsias distintas e as soluções diferentes que lhes foram dadas (Paulo distingue melhor em Gl 2): uma controvérsia, na qual tomaram parte Pedro e Paulo, sobre a obrigação da Lei judaica para os gentios convertidos (cf. Gl 2,1-10); e outra, posterior, suscitada pelo incidente de Antioquia (Gl 2,11-14), e na qual Tiago, na ausência de Pedro e de Paulo, desempenhou papel preponderante, acerca das relações sociais entre os cristãos vindo do judaísmo e os povos provenientes da gentilidade: todo contato com um gentil acarretava para o judeu uma impureza legal (cf. 15,20).

 

Evangelho: Jo 15,12-17

Depois da alegoria da videira (vv. 1-8), Jesus continua falar a seus discípulos no discurso de despedida durante última ceia (caps. 13-17). Primeiro disse cumprir “mandamentos” (no plural) como expressão do amor (v. 10). Depois os reduz a um “mandamento” (no singular), que consiste em amar o próximo (v. 12).

Depois da alegoria da videira (vv. 1-8), Jesus continua falar a seus discípulos no discurso de despedida durante última ceia (caps. 13-17). O precedente imaginativo da metáfora da verdadeira videira (vv. 1-8) era o canto da vinha de Is 5,1-7 que colocou a ação no campo do amor, e o fruto esperado era a prática da justiça e o direito entre os homens. Em Is se tratava do amor conjugal (de Yhwh e Israel), aqui em Jo, do amor paterno, filial e os frutos são amor fraterno. Não é um amor simplesmente humano, porque recebe sua seiva de Jesus. Funda e engloba tudo o que abrange a justiça e o direito. Modelo e força é o amor de Jesus ao Pai e a seus “amigos” (v. 15). O amor filial de Jesus se traduz em cumprir o mandamento do Pai (cf. 6,38; 8,29), o amor do fiel cristão a Jesus se traduzirá em cumprir seu mandamento.

Este é o meu mandamento: amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei. Ninguém tem amor maior do que aquele que dá sua vida pelos amigos (vv. 12-13).

O mandamento de amar o próximo já existe na lei de Moisés (Lv 19,18), mas é um mandamento “novo” (13,34; 1Jo 2,7-11; 3,23; 4,19-21), porque foi Jesus quem o cumpriu perfeitamente com sua entrega na cruz. Amar “assim como” Jesus é a medida, não mais amar “como a si mesmo” (Lv 19,18; Mc 12,31p; Rm 13,9; Gl 5,14).

A morte de Jesus é definida como ato supremo do amor (a palavra grega usada aqui é agápe, nem éros nem filia). Amor é o contrário do egoísmo, é altruísta, é “querer o bem do outro” (S. Tomás de Aquino). Jesus ama “até o extremo” (13,1) e “dá sua vida pelas suas ovelhas” (10,11.14s). O salmista reza: “Tua lealdade vale mais do que a vida” (Sl 63,4). O amor vale mais do que esta vida, porque lhe dá sentido e a transcende.

Vós sois meus amigos, se fizerdes o que eu vos mando. Já não vos chamo servos, pois o servo não sabe o que faz o seu senhor. Eu vos chamo amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi de meu Pai (vv. 14-15).

Em Is 41,8, Israel recebeu o título de “servo”, Abraão de “amigo”. Servo de Deus pode ser título honorífico (cf. Nm 12,7; 2Sm 12,7; Is 42,1; At 3,13 etc.). Quem imita Jesus no seu amor radical, não é escravo, mas é livre, é amigo dele. Nas cortes romanas e helenistas havia um círculo de amigos (cf. 19,12) que conviviam com o rei, o animavam e aconselhavam (cf. Pilatos em Jo 19,12). Aqui os discípulos convivem em regime de amizade com o rei-messias e mestre Jesus embora não o aconselhem. Aqui o sinal de amizade é partilhar confidências (cf. Jó 29,4; Sl 55,15). Faz parte deste novo estilo de amor que Jesus não retenha nada para si, que comunica tudo aos seus discípulos. Eles são amigos e não servos, mas ele permanece o “Senhor e mestre” que lavou os pés dos discípulos para que estes também se sirvam (e amem) “uns aos outros” (cf. 13,13-15).

Não fostes vós que me escolhestes, mas fui eu que vos escolhi e vos designei para irdes e para que produzais fruto e o vosso fruto permaneça. O que então pedirdes ao Pai em meu nome, ele vo-lo concederá. Isto é o que vos ordeno: amai-vos uns aos outros (vv. 16-17).

A escolha é iniciativa soberana de Jesus (Mc 3,13p), como o é de Javé Deus no AT (cf. Nm 16,7; escolha do povo em Dt 7,7; de Davi em 2Sm 6,2 etc.). O amor é fecundo, o amor divino (agape) produz frutos que permanecem”.

Jesus promete atendimento a quem “pedir ao Pai em meu nome” (14,13s; 15,16; 16,24.26; cf. Mt 7,7-11; Lc 11,5-13). O nome representa a pessoa. Mas pedir em nome de Jesus significa também sintonizar-se com a vontade dele, assumir sua missão e pedir com reta intenção, de modo que ele possa assinar o pedido (cf. At 19,13-16; Tg 4,2s).

O site da CNBB comenta: Jesus não quer que nós sejamos seus servos, mas seus amigos. O servo trabalha em função do seu salário e não tem nenhum compromisso com o seu senhor além do vínculo do trabalho. O amigo é comprometido com o outro, acredita nos seus valores e luta com ele na conquista de um ideal comum. Assim, quando Jesus nos chama de amigos, ele quer dizer que está compromissado conosco na construção do ideal do Reino de Deus e quer que todos nós também sejamos seus amigos, comprometidos com ele na construção da civilização do amor.

Voltar