13 de junho de 2017 – Terça-feira, 10ª semana

Leitura: 2Cor 1,18-22

Continuamos na carta 2Cor na qual Paulo defende seu apostolado. A Nova Bíblia Pastoral (p. 1407) comenta: Talvez um primeiro motivo de desconfiança, com relação ao Apóstolo, seja o fato de ele ter prometido visitar Corínto e não ter cumprido a promessa. Na realidade, teve de modificar o projeto original, conforme 1Cor 16,5-6. Em lugar da visita pessoal, escreveu-lhes uma carta, para explicar os motivos.

Eu vos asseguro, pela fidelidade de Deus: O ensinamento que vos transmitimos não é “sim-e-não”. Pois o Filho de Deus, Jesus Cristo, que nós – a saber: eu, Silvano e Timóteo – pregamos entre vós, nunca foi “sim-e-não”, mas somente “sim”. Com efeito, é nele que todas as promessas de Deus têm o seu “sim” garantido. Por isso também, é por ele que dizemos “amém” a Deus, para a sua glória (vv. 18-20).

A palavra hebraica-aramaica Amém significa: “Isso é sólido, digno de confiança, é verdade, é certo” (cf. Sl 41,14). Sua raiz é a mesma das palavras “fé, verdade, fidelidade” e vem do ambiente nômade. Um nômade, como Abraão e os israelitas, precisa de um chão sólido, confiável para montar sua tenda, assim precisamos de uma base confiável para montar nosso projeto de vida (cf. Mt 7,24-27p).

A Bíblia do Peregrino (p. 2771) comenta: O “sim” de uma promessa é o seu cumprimento, e o “amem” é o reconhecimento disso. Paulo traduz em fórmulas originais e eficazes o atributo clássico de Deus “Fiel” (Dt 7,9; Is 49,7; 55,3).

A “fidelidade de Deus” é a solidez de Deus. Ele é o “rochedo” de Israel (Dt 32,4 etc.); o homem pode apoiar-se nele com toda a segurança. Tal solidez explica a constância de Deus em seus planos, a fidelidade a “todas as suas promessas” e principalmente no NT, a fidelidade de Deus ao seu desígnio de misericórdia e salvação (1Cor 1,9; 10,13; 1Ts 5,24; 2Ts 3,3). Deus não é arbitrário como os deuses pagãos (cf. Rm 1,25).

Em Jesus Cristo, Deus cumpre “todas as suas promessas” (na ressurreição, segundo At 23,6; 24,15; 26,6s), por isso ele é o “sim” puro e total; e Paulo o reconhece com seu “amém” (cf. Ap 3,14). É também exemplo de conduta para o apóstolo (cf. Mt 5,37 sobre o juramento). Mas os planos humanos podem sofrer mudanças justificadas; Paulo se dispõe a explicar os motivos. Seria, pois, contraditório que Paulo, para quem anunciar Cristo é a única razão de ser, desmentisse a sua mensagem por uma atitude de duplicidade.

Amém é um dos quatro termos aramaicos conservados em grego nas fórmulas litúrgicas do NT (cf. Hosana, Aleluia, Abbá). Ele afirma a fidelidade do Senhor e a fé do homem. A Tradução Ecumênica da Bíblia (p. 2234) comenta: Ao contrário dos rabinos, Jesus iniciava as suas afirmações, dizendo: Amém, eu vo-lo digo … Os sinóticos fornecem mais de cinquenta exemplos, o quarto evangelho o reduplica para reforçar uma afirmação e lhe dar um caráter mais solene; Amém, amém, eu vos digo … (Jo 1,51). Mas o mais das vezes, Amém serve de conclusão para a liturgia, e a liturgia eucarística fornece disso um bom exemplo (cf. Rm 16,27; 1Cor 14,16; Ap 5,14). O Apocalipse adotará a terminologia de Paulo, chamando Jesus de “o Amém” (Ap 3,14).

Silvano tinha dois nomes, um de origem hebraica, “Silas”, e outro de forma latina helenizado, “Silvano” (At 15,22-40; 16,19-29 etc.). Ele participava da evangelização de Corinto (At 18,5; 1Ts 1,1; 2Ts 1,1; cf. 1Pd 5,12). Timóteo é o colaborador mais fiel de Paulo (At 16,1-3 etc.; 1Ts 1,1; 3,2s; 1Cor 4,17; 16,10s; Fl 1,1; cf. Hb 13,23). Nas cartas 1-2Tm, Timóteo parece ser o chefe da igreja em Éfeso após a morte de Paulo.

É Deus que nos confirma, a nós e a vós, em nossa adesão a Cristo, como também é Deus que nos ungiu. Foi ele que nos marcou com o seu selo e nos adiantou como sinal o Espírito derramado em nossos corações (vv. 21-22).

Paulo usa termos da linguagem comercial: “confirmar” (garantir a validade), a “adesão” (manter-se fiel), “selo” (certificado de garantia; Ef 1,13; cf. Jr 32,10s), “sinal” (penhor) dado como entrada. O Espírito é a “unção” que faz de um ser humano um “cristão” ( i. é dedicado a “Cristo”, a palavra grega por “ungido” = messias-rei), é “sinal” do dom futuro e definitivo. Ungidos é o título que o salmista deu aos hebreus que desceram ao Egito: a unção os tornava intocáveis (Sl 105,15), um reino de sacerdotes (cf. Ex 19,6: Is 61,1.6; Sl 28,8s; Hab 3,13).

“Unção” e “selo” são ligados a uma afirmação trinitária: Cristo, Deus, Espírito. O AT já vinculava a esses símbolos a efusão do Espírito (cf. 1Sm 10,1.6; 16,13 etc.). Anunciada por Jl 3,1-2, ela agora está realizada. “Sinal”, aqui e em 5,5, é penhor (cf. Ef 1,14), alhures, primícias (Rm 8,32). O dom do Espírito é o penhor e um antegozo da glória celeste.

A Bíblia de Jerusalém (p. 2174) comenta: Este selo e está unção designam ou o dom do Espírito concedido a todos os fiéis (talvez com alusão aos ritos da iniciação cristã, cf. Ef 1,13; 4,30, 1Jo 2,20.27) ou a consagração ao ministério apostólico (“nós” opor-se-ia a “vós”, v. 21) por um dom especial do Espírito que tornou o apóstolo mensageiro fiel da fidelidade divina em Cristo (vv. 17-20).

Os termos podem fazer alusão aos sacramentos em particular ao batismo e ao rito atual da unção no sacramento da confirmação: o bispo, tendo mergulhado o polegar no óleo (crisma), marca o confirmando na fronte com o sinal da cruz, dizendo: “N., recebe por este sinal, o Espírito Santo, o dom de Deus.”

 

Evangelho: Mt 5,13-16

Estamos ouvindo nestas semanas o primeiro discurso em Mt, o “sermão da montanha” que Jesus dirige ao povo vindo de todas as partes de Israel. Aos seus leitores judeu-cristãos, Mt quer lembrar Moisés no monte Sinai. Jesus, porém, inicia sua mensagem não com mandamentos, mas com as bem-aventuranças para seus ouvintes pobres e aflitos (cf. vv. 1-12, evangelho de ontem)

Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se tornar insosso, com que salgaremos? Ele não servirá para mais nada, senão para ser jogado fora e ser pisado pelos homens (v. 13).

O sal é o tempero principal e era valorizado tanto que servia até de moeda. A nossa palavra “salário” vem do exército romano que remunerava seus soldados em sal. O sal dá sabor e a palavra “sabedoria” vem de saborear, experimentar.

O sal não só torna alimentos saborosos (Jó 6,6), mas por ter propriedade de conservá-los (Br 6,27), acaba significando o valor duradouro de um contrato, tal como uma “aliança de sal” (Nm 18,19), pacto perpétuo (2Cr 13,5). Mt interpreta a palavra de Jesus (Lc 14,34; Mc 9,50) afirmando que o cristão deve conservar e tornar saboroso o mundo dos homens em sua aliança com Deus: senão já não serve para nada, e os discípulos mereceriam ser jogados fora (cf. Lc 14,35).

Vós sois a luz do mundo. Não pode ficar escondida uma cidade construída sobre um monte (v. 14).

A Bíblia do Peregrino (p. 2326) comenta: O sal comunica seu sabor e conserva alimentos, mas pode se desvirtuar; a luz ilumina todos, mas pode ser escondida. Assim deve ser a comunidade cristã: ativamente, não por vaidade, mas para louvor do Pai. A cidade irradiando luz do alto é como a Jerusalém que, em meio às trevas, ilumina como farol os povos, na visão do Is 60,1-3; sua luz é somente reflexo do amanhecer do Senhor.

Jerusalém é uma cidade construída num monte (Sião). Is 60,1-3 prometeu a luz do Senhor sobre ela que atrairia as nações (cf. os reis magos em Mt 2). Em 49,6, o Servo de Deus foi estabelecido a ser “luz para as nações”, termo aplicado a Jesus em Lc 2,32 e a Paulo em At 26,17s. Em Jo 8,12, o próprio Jesus declara: “Eu sou a luz do mundo”. Os membros da comunidade de Qumrã se consideravam “filhos da luz”. No batismo, os cristãos renunciam às obras das trevas para viver como filhos da luz (Ef 5,8-14). O Concílio Vaticano II chamou uma das suas constituições principais “Lumen gentium” (“Luz dos povos” é Cristo; a igreja é iluminada por ele como a lua pelo sol; cf. LG 1).

A Bíblia de Jerusalém (p. 2006) anota a respeito da luz: No NT, o tema da luz desenvolve-se através de três linhas principais, mais ou menos distintas.

  1. Como o sol ilumina uma estrada, também é luz tudo o que ilumina o caminho para Deus: outrora, a lei, a sabedoria e a palavra de Deus (Ecl 2,13; Pr 4,18-19; 6,23; Sl 119,105); agora, o Cristo (Jo 1,9; 9,1-39; 12,35; 1Jo 2,8-11: cf. Mt 17,2; 2Cor 4,6), comparável a nuvem luminosa do Êxodo (Jo 8,12; cf. Ex 13,21s; Sb 18,3s); finalmente todo cristão, que manifesta Deus aos olhos do mundo (Mt 5,14-16; Lc 8,16; Rm 2,19; Fl 2,15; Ap 21,24).
  2. A luz é símbolo da vida, felicidade e alegria; as trevas, símbolo de morte, desgraças e lagrimas (Jó 30,26; Is 45,7; cf. Sl 17,15); às trevas do cativeiro se opõe, portanto a luz da libertação e da salvação messiânica (Is 8,22-9,1; Mt 4,16; Lc 1,79; Rm 13,11-12), atingindo até nações pagãs (Lc 2,32; At 13,47), através de Cristo luz (Jo – cf. os textos citados acima; Ef 5,14), para se consumar no reino dos céus (Mt 8,12; 22,13; 25,30; Ap 22,5; cf. 21,3-4).
  3. O dualismo luz-trevas vem caracterizar, por isso, os dois mundos opostos do bem e do mal (cf. os textos essênios de Qumrã). No NT, aparecem os dois reinos sob os respectivos domínios de Cristo e de Satanás (2Cor 6,14-15; Cl 1,12-13; At 26,18; 1Pd 2,9), um pelejando por vencer o outro (Lc 22,53; Jo 13,27-30). Os homens se dividem em filhos da luz e filhos das trevas (Lc 16,8; 1Ts 5,4; 1Jo 1,6-7; 2,9-10), e se fazem reconhecer por suas obras (Rm 13,12-14; Ef 5,8-11). Essa divisão (julgamento) entre os homens tornou-se manifesta com a vinda da luz, obrigando cada um a se definir a favor ou contra ele (Jo 3,19-21; 7,7; 9,39; 12,46; cf. Ef 5,12-13). A perspectiva é otimista: as trevas, um dia, terão de ceder lugar à luz (Jo 1,5; 1Jo 2,8; Rm 13,12).

Ninguém acende uma lâmpada, e a coloca debaixo de uma vasilha, mas sim, num candeeiro, onde brilha para todos que estão na casa (v. 15).

Na antiguidade, o alqueire (“vasilha”) era um pequeno móvel de 3 ou 4 pés. Aqui se trata apenas de esconder a lâmpada debaixo de um móvel (Mc 4,21p acrescenta: “ou debaixo de uma cama”), e não apagá-la, cobrindo-a com um alqueire moderno (i. é, com uma medida, uma vasilha que cabe hoje 20 litros).

No Oriente e outras regiões, a casa das pessoas humildes consta de uma peça só, não há divisão de quartos. Uma lâmpada num candeeiro “brilha para todos que estão na casa”.

Assim também brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos céus (v. 16).

“Para que vejam as boas obras”, aquelas de que o Sermão da Montanha apresenta alguns exemplos. Realizar as obras, fazer a vontade do Pai e não só falar “Senhor, Senhor” (7,21s) é importante para Mt que enfatiza a prática, o agir ético no seu evangelho (cf. vv. 15-27; 25,32-46 etc.). O texto parece contradizer Mt 6,1-18, onde os exercícios de piedade, esmola, oração e jejum devem ficar escondidos (6,4: “tua esmola fique no segredo”) por causa da ostentação dos hipócritas que fazem as estas coisas “a fim de serem vistos pelos homens” (6,2.5; cf. 6,16). Mas aqui se faz as boas obras para que Deus seja louvado (S. Inácio: “Tudo para maior glória de Deus”).

O site da CNBB comenta: Todos nós devemos testemunhar Jesus e os valores do Reino dos céus a fim de que o mundo não se corrompa, mas descubra os caminhos da santidade, da justiça e da graça. Com isso, é de suma importância que o anúncio da Palavra seja acompanhado pela coerência de vida, pela busca da santidade e pelo seguimento de Jesus a partir da vivência dos seus mandamentos. O Papa Paulo VI nos falava sobre isso na sua Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi, quando se referia à exigência da santidade em todo trabalho evangelizador. Todo trabalho evangelizador deve começar pela caridade, pelo serviço, ou seja, pela explicitação, através da vida, dos valores do Evangelho.

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