23 de Julho 2019, Terça-feira: “Eis minha mãe e meus irmãos. Pois todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (vv. 48-50).

16ª Semana do Tempo Comum

Leitura: Ex 14,21-15,1

Esta leitura de hoje representa o ápice da libertação da escravidão do Egito, uma experiência fundamental do povo de Deus. Os judeus a leem ou narram na sua celebração da páscoa (seder, haggadá). Os cristãos a leem como 3ª leitura na vigília pascal prefigurando a salvação pelas águas do batismo.

A passagem pelo mar “vermelho” (13,18; em hebraico, “dos caniços” ou “dos juncos”; cf. 2,3; 2Rs 9,26) assinala topograficamente a saída do povo: é a última batalha, não combativa, a última fronteira. O mar Vermelho divide a geografia (entre a África e a Ásia), divide a história e se converte em linha divisória da existência. A passagem pelo mar é como que nascimento do povo de Israel, sua liberdade e independência. Para os israelitas é como paradigma, para nós “passar” é salvar-se. O mar Vermelho é a fronteira do Egito; passando o mar, o povo de Israel deixa o território do Egito, e consequentemente, ganha outra condição: passa da escravidão à liberdade.

A Nova Bíblia Pastoral (p. 90) comenta: Uma tradição mais antiga fala de certo vento que baixa a maré e permite a passagem dos israelitas, mas não dos carros que são tragados pela subida das águas. Sobrepõe-se uma tradição mais nova, segundo a qual Moises abre caminho seco entre duas muralhas de água. Não se sabe o que de fato aconteceu. Mas a vitória será usada pela teologia exílica e pós-exílica como fundamento do poder de Javé (vv. 18.31, cf. Dt 1,30; 11,4; Js 24,7…). Todo esse poder, porém, só é de fato sagrado se estiver a serviço da libertação dos oprimidos e da construção de uma sociedade justa, solidaria e fraterna

Existem neste livro do Êxodo várias versões do mesmo fato da libertação: uma versão em forma de poesia, o canto heroico de Ex 15 (que é o salmo responsorial ontem e hoje); em nossa leitura, temos duas versões misturadas num único relato: uma versão mais realista e psicológica, e outra mais litúrgica, doutrinal e abstrata, atribuída à redação sacerdotal no exílio babilônico. Com essas duas, o último redator (Esdras?) Compôs o presente capítulo (no pós-exílio). Isso explica as repetições temáticas e as mudanças de tonalidade.

21Moisés estendeu a mão sobre o mar, e durante toda a noite o Senhor fez soprar sobre o mar um vento leste muito forte; e as águas se dividiram. 22Então, os filhos de Israel entraram pelo meio do mar a pé enxuto, enquanto as águas formavam como que uma muralha à direita e à esquerda. 23Os egípcios puseram-se a prossegui-los, e todos os cavalos do Faraó, carros e cavaleiros os seguiram mar adentro (vv. 21-24).

Na tradição mais velha, o faraó toma a iniciativa, o povo discute com Moisés (vv. 5-7.10-12, cf. leitura de ontem), depois entram em jogo os elementos (vento, mar, chão seco, noite) e a derrota egípcia é salvação para os israelitas. Na tradição posterior (sacerdotal), Deus toma a iniciativa (vv. 1-4.8-9) e Moisés é intermediário (ordens e anúncios, em seguida execução e cumprimento) que, como numa liturgia, “estende a mão” com a vara (v. 16) para “dividir o mar” que fica “como uma muralha”.

Na escuridão, o silêncio da noite e dois elementos cósmicos: o mar hostil, devorador, e o vento a serviço de Deus (Sl 104,4). “De pé enxuto”, lit. “sobre a terra seca”, como numa nova criação e no final do dilúvio, a água se retira e a terra seca aparece no meio dela (Gn 1,9; 8,1-5). A água hostil (cf. Gn 1,2; Sl 18,5s) se transforma em muralha protetora, em passagem segura para a luz do amanhecer que vem do leste. Direita e esquerda significam também sul e norte.

24Ora, de madrugada, o Senhor lançou um olhar, desde a coluna de fogo e da nuvem, sobre as tropas egípcias e as pôs em pânico. 25Bloqueou as rodas dos seus carros, de modo que só a muito custo podiam avançar. Disseram, então, os egípcios: “Fujamos de Israel! Pois o Senhor combate a favor deles, contra nós” (vv. 24-25).

Os egípcios penetravam pelo mesmo caminho. Onde os escravos fugitivos com sua bagagem leve passaram com facilidade, os “600 carros” (cf. v. 7) do exército atolaram. Agora é a vez dos egípcios de ter medo, entrar em pânico e fugir. O momento é a última vigília da noite, das 2 às 6h da manhã. A salvação costuma chegar pela manhã (Sl 17,15; 57). Quem combate, não é o povo dos hebreus que só assiste (cf. vv. 13s) é Javé, “o Senhor combate”, como guerreiro (cf. 15,3), em favor deles.

Menciona-se um elemento que faltava, o fogo, sinal da presença de Deus em Gn 15,17 e depois em Ex 19,18. Pela “coluna de fogo e da nuvem”, Javé separa os povos: ilumina o caminho do seu povo, enquanto o obscurece para os egípcios (13,21s; 14,19s). A coluna de nuvem e de fogo representa a presença e a direção de Deus, função posterior do templo, da lei e dos sacerdotes no pós-exílio (cf. Ex 40,34-38; Lv 9,24; Nm 11,24-30; Dt 4,11-14; Ne 9,12-14; Is 4,5; 30,19).

Poderíamos relacionar a “coluna de fogo e de nuvem” com a explosão vulcânica em Santorin (Thera), uma ilha grega onde surgiu um crátero enorme no mar e causou a maior erupção vulcânica dos últimos 10.000 anos. Um vento pode ter levado a nuvem vulcânica (piroclasto) até o Egito (800 km de distância) onde causou trevas, granizo e chuvas de pedra e fogo, poluindo o rio Nilo e provocando pragas e doenças (cf. comentário da leitura de sexta-feira passada). A coluna alta de fogo e nuvem de cinzas pode ter se elevado até a estratosfera, mas do Egito talvez não teria sido mais visível. Metade da ilha caiu no mar e, junto com a erupção, pode ter causado um enorme tsunami que chegou ao Egito com 2 m de altura (suficiente para acabar com os cavalos e cavaleiros). Em todo tsunami, antes de chegar a onda gigante (“como muralha”), as ondas pequenas se retiram e abrem o chão do mar, assim os hebreus fugitivos podiam ter passado rapidamente pelo mar raso dos juncos “de pé enxuto”.

A erupção em Santorin aconteceu entre 1600 e 1500 a.C., mas não se conhecem registros egípcios da erupção ao não ser as trevas, barulhos e chuvas torrenciais que devastaram grande parte do Egito e foram descritas na “Estela da tempestade” do faraó Amósis (1539–1528). A ausência de tais registros é por vezes atribuída à desordem geral no Egito em torno do Segundo Período Intermediário. Mas os efeitos da erupção junto com o tsunami por ela causada devem ter ficado na memória da região toda influenciando a descrição de elementos na tradição do êxodo (no tempo de Ramsés II, 1250 a.C.) como também o desaparecimento de Atlântida descrito por Platão (em Timaios e Critias). O relato platônico originalmente deriva dos relatos do legislador ateniense Sólon (638–558) que, durante sua viagem em Saís, no delta do Nilo, tomou conhecimento, por intermédio de sacerdotes egípcios, do desaparecimento de um grande império insular.

26O Senhor disse a Moisés: “Estende a mão sobre o mar, para que as águas se voltem contra os egípcios, seus carros e cavaleiros”. 27Moisés estendeu a mão sobre o mar e, ao romper da manhã, o mar voltou ao seu leito normal, enquanto os egípcios, em fuga, corriam ao encontro das águas, e o Senhor os mergulhou no meio das ondas. 28As águas voltaram e cobriram carros, cavaleiros e todo o exército do Faraó, que tinha entrado no mar em perseguição de Israel. Não escapou um só. 29Os filhos de Israel, ao contrário, tinham passado a pé enxuto pelo meio do mar, cujas águas lhes formavam uma muralha à direita e à esquerda (vv. 26-29).

Quando os egípcios vão atrás deles, as águas se fecham e os engolem (Sb 10,18s), mas não sem nova ordem litúrgica (“Estende a mão…”) e sua execução imediata. Os egípcios são engolidos pelo o refluxo do mar (maré alta, tsunami?). Na narrativa mais antiga, somente Javé é que intervém; talvez nem se falava de uma passagem do mar pelos israelitas, mas apenas da miraculosa destruição dos egípcios pelos elementos.

30Naquele dia, o Senhor livrou Israel da mão dos egípcios, e Israel viu os egípcios mortos nas praias do mar, 31e a mão poderosa do Senhor agir contra eles. O povo temeu o Senhor, e teve fé no Senhor e em Moisés, seu servo (vv. 30-31).

Do exército inimigo só restavam cadáveres (cf. Is 37,36). Morte dos opressores e vida com liberdade, assim é o final do juízo de separação. Os israelitas são testemunhas e por isso mudam de atitude. O medo o povo de antes se transforma em “respeito” reverencial (“temeu”, a mesma palavra hebraica) e a desconfiança (cf. vv. 10-12) se muda em fé “no seu servo Moisés” (em 4,16 e 7,1, Moisés é quase um deus pelo qual Javé fala e age; cf. Nm 12).

A recordação desta passagem aflora muitas vezes no AT, a tal ponto que esta libertação foi cantada como o milagre por excelência (Sl 77,17-20; 106,9). Isaías fala da volta do exílio babilônico como de um novo êxodo (Is 43,16-21). Nos registros do Antigo Egito, porém, não se encontra nada sobre esta fuga dos escravos hebreus, talvez por vergonha sobre a derrota (costumam-se registrar só as vitórias do faraó) ou por que achassem insignificante a fuga de alguns grupos de escravos. Pode ser que tivessem acontecido várias fugas de grupos distintos que se uniram depois num relato épico e único. Pelo menos um grupo atribuiu a libertação a seu deus Javé (os “Shasu-nômades de Yahu” mencionados em duas listas no Egito? O termo “hebreu” pode vir de hapiru com que os egípcios designavam grupos marginalizados de diversas etnias).

Não temos registros de Moisés fora da Bíblia. Mas estes grupos tinham seus líderes. O nome egípcio de Moisés indica alguém que pode ter tido conhecimento dos pontos fracos das fronteiras e do exército egípcio, assim os fugitivos não escolheram a rota mais curta seguindo pela praia, mas a mais longa (cf. 13,17s) por onde o exército não conseguiu mais seguir, mas atolou (afundou). No texto hebraico, o mar é o “mar dos juncos” (13,17s), só na tradução grega tornou-se o mar Vermelho.

Não é possível determinar o lugar e o modo deste acontecimento de Ex 14; mas aos olhos das testemunhas apareceu com uma intervenção espetacular de “Javé guerreiro” (Ex 15,3) e tornou-se um artigo fundamental da fé javista (Dt 11,4; Js 24,7; cf. Dt 1,30; 6,21-22; 26,7-8). Este milagre do mar foi colocado em paralelo com outro milagre da água, a passagem do Jordão (Js 3-4) na entrada da terra prometida. A tradição cristã considerou a passagem pelo mar como uma figura da salvação, e mais especialmente a salvação pelo batismo (1Cor 10,1) e torna sua leitura obrigatória na vigília pascal.

15,1Então, Moisés e os filhos de Israel cantaram ao Senhor este cântico (15,1).

“Este cântico” de Moisés é o salmo responsorial de hoje (as estrofes: 15,8-10.12.17) no estilo de um salmo de ação de graças. É o primeiro e o mais celebre dos “cânticos” que a liturgia cristã toma do AT. É repetido pelo cântico antigo da profetisa Miriâm, irmã de Moisés, em 15,21 que retém somente a destruição dos egípcios. Miriâm é o nome hebraico traduzido por “Maria” em grego (cf. a participação feminina na libertação nos caps. 1-2). No livro Alcorão, o fundador do islã, Maomé, confundiu esta irmã de Moisés (2,4-8; Nm 12) com Maria, a mãe de Jesus.

O hino trata em toda a sua ampliação o tema da salvação miraculosa através do poder e da solicitude de Javé para com seu povo. O canto da vitória, que Miriam entoa em v. 21, é ampliado até englobar o conjunto das maravilhas do êxodo e da conquista de Canaã e até a construção do templo de Jerusalém, “em vosso monte, no lugar que preparastes para a vossa habitação, no santuário construído pelas vossas próprias mãos” (15,17).

Evangelho: Mt 12,46-50

No evangelho de hoje, Jesus nos apresenta seus novos familiares. Mt copiou este relato do encontro com os familiares de Jesus da sua fonte Mc 3,31-35.

Enquanto Jesus estava falando às multidões, sua mãe e seus irmãos ficaram do lado de fora, procurando falar com ele. Alguém disse a Jesus: “Olha! Tua mãe e teus irmãos estão aí fora, e querem falar contigo” (vv. 46-47).

Mt não diz que Jesus estava numa casa (mas o diz em seguida em 13,1; cf. Mc 3,20.31). Do lado de “fora” deste círculo das multidões que estão com Jesus (desde v. 23), os familiares procuram Jesus, são “a mãe de Jesus e seus irmãos”. O termo “irmão” abrange, em linguagem bíblica, também os parentes (cf. Gn 13,8)

A expressão “irmãos e irmãs” de Jesus (cf. 13,55-56p) é interpretada de maneira diferente: para os católicos são apenas parentes; para os protestantes são outros filhos de Maria. A Tradução Ecumênica da Bíblia (TEB, p. 1882) anota: Na Bíblia, como ainda hoje no Oriente, a palavra irmãos pode designar tanto os filhos da mesma mãe, como parentes próximos (cf. Gn 13,8; 14,16; 29,15; Lv 10,4; 1Cr 23,22).

A própria Bíblia não decide a questão (não está escrito em nenhum trecho da Bíblia que Maria teve apenas um filho, nem está escrito que teve mais de um), mais é tradição da Igreja desde os primeiros séculos que Maria não teve outros filhos além de Jesus. A Igreja Católica considera como revelação divina não só a Bíblia, mas também a tradição da Igreja. O que reforça o dogma da Igreja Católica é a entrega da mãe no pé da cruz ao discípulo amado (Jo 19,26-27). Se existissem outros filhos de Maria, Jesus não precisava entregá-la aos cuidados de um discípulo.

Não se menciona o pai (cf. 13,55; Mc 6,3; 10,30). Então, José, cujo papel Mt destaca na infância (Mt 1-2), já deve ter morrido e Jesus adulto tornou-se chefe da família que quer agora romper o círculo dos seguidores e reclamar seu parente famoso.

Jesus perguntou àquele que tinha falado: “Quem é minha mãe, e quem são meus irmãos? ” E, estendendo a mão para os discípulos, Jesus disse: “Eis minha mãe e meus irmãos. Pois todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (vv. 48-50).

Jesus não despreza vínculos familiares (cf. 15,4-6), por isso, ele tem um “Pai, que está nos céus” (6,9; 23,9; Lc 2,41-52; Mc 14,36). O Filho de Deus está criando uma nova família, não através da carne, mas através do Espírito (cf. Jo 1,12-13; Rm 8,14-17).

Quem faz a “vontade do meu Pai”, fará parte desta família de Jesus. Quanto a Maria, ninguém como ela cumpriu a vontade do Pai e foi agradecida com o Espírito (cf. Lc 1,35-38). Jesus anuncia a vontade do Pai e a cumpre (26,42). A comunidade reza por ela na oração que Jesus ensinou (6,10). Será critério no julgamento (7,21-23).

O Papa Bento XVI (na Encíclica Deus Caritas Est) olha para a situação de Maria deixada de lado, durante os anos da vida pública de Jesus e percebe a sua grande humildade: aceita ser deixada de lado para que Jesus forme a sua nova família. Maria só se aproximará de Jesus no momento da cruz, quando os seus discípulos tiverem fugido (Jo 19,25-27). Em Pentecostes, todos irão se juntar ao redor dela à espera do Espírito Santo (cf. At 1,14). Stº Ambrósio comentando o texto de hoje diz assim: “Não se propõe aqui a recusa ofensiva dos parentes, mas ensina que os laços espirituais são mais sagrados do que os laços de sangue”.

O próprio Mt acrescentou que Jesus estava “estendendo a mão para os discípulos” (v. 49). Na tradição bíblica, este gesto significa diversas atitudes: carência (12, 13), hostilidade (26,51), bênção (Gn 48,14) ou o poder e o julgamento de Deus (frequente em Ez, Jr, Sf). Em Mt, Jesus estende a mão ao leproso (8,3) e a Pedro que afunda (14,31), ambas demonstrações do seu poder auxiliador. Aqui significa que os discípulos estão sob a proteção do seu Senhor que estará com eles até o fim do mundo (28,20).

Para os judeus, “irmãos” já eram os conterrâneos, para os cristãos são os membros da comunidade. Além disso, os discípulos são “meus irmãos” (cf. 28,10; 25,40; 23,8; Jo 20,17; Rm 8,29; Hb 2,11s). Como irmãos de Jesus, podemos invocar Maria como nossa mãe (cf. Jo 19.25-27).

 O site da CNBB comenta (citando Jo 15,15): Jesus não quer que nós sejamos seus servos, pois o amor que ele tem por nós não permite isso. O apóstolo São João nos diz no seu Evangelho que Jesus não chama os seus seguidores de servos, mas de amigos, porque lhes revelou tudo o que o Pai lhe deu a conhecer. Mas no Evangelho de hoje, Jesus vai mais além, ele nos mostra que quer que todos os que ele ama e o amam sejam membros da sua família, participem da sua vida divina. Para demonstrar o amor que temos por Jesus, não basta apenas afirmar o amor que se sente por ele, é preciso ir além, é preciso conhecer e realizar a vontade do Pai. Somente quem faz a vontade do Pai ama verdadeiramente a Jesus, torna-se membro da sua família e participa da sua vida.

 

Na primeira versão (javista) e mais realista, Moisés encoraja os israelitas fugitivos, assegurando-lhes que nada têm a temer nem a fazer (vv. 6.11-14). Então, “Javé fez o mar se retirar com um forte vento oriental, que soprou a noite inteira: o mar ficou seco” (v. 21). “De madrugada, Javé olhou da coluna de fogo e da nuvem, viu o acampamento dos egípcios e provocou uma confusão no acampamento” (v. 24). Os egípcios ali penetravam. O momento é a última vigília da noite, das 2 às 6h da manhã. A salvação chega pela manhã (Sl 17,15; 57). Menciona-se um elemento que faltava, o fogo, sinal da presença de Deus em Gn 15,17 e em Ex 19,18. Pela coluna de fogo e da nuvem, Javé separa os povos: ilumina o caminho do seu povo, enquanto o obscurece para os egípcios (13,21-22; 14,19-20). ”Então os egípcios disseram: ‘Vamos fugir de Israel, porque Javé combate a favor deles’ (v. 25b). E, de manhã, o mar voltou para o seu leito. Os egípcios, ao fugir, foram ao encontro do mar, e Javé atirou-os no meio do mar” (v. 27). São engolidos pelo seu refluxo (ou simplesmente atolaram com seus carros de guerra). Nesta narrativa atribuída ao javista, somente Javé é que intervém; não se fala de uma passagem do mar pelos israelitas, mas apenas da miraculosa destruição dos egípcios pelos elementos. Esta narrativa representa a tradição primitiva. O eloísta deve ter contribuído com “o anjo do Senhor, que ia adiante do exército de Israel, se retirou e passou para trás” (v. 19a) identificando-o com a coluna da nuvem e do fogo, e acrescentando os “600 carros de elite e todos os carros do faraó” (v. 7), assim Deus “emperrou as rodas dos carros, fazendo-os andar com dificuldade” (v. 25a). O javista concluiu: “Nesse dia, Javé salvou Israel das mãos dos egípcios, e Israel viu os cadáveres dos egípcios à beira-mar. Israel viu a mão forte com que Javé atuou contra o Egito. Então o povo temeu a Javé e acreditou nele e no seu servo Moisés” (v. 30; cf. Is 37,36). Morte dos opressores e vida com liberdade, assim é o final do juízo de separação. Os israelitas são testemunhas e por isso mudam de atitude. O medo de antes se transforma em “respeito reverencial” (a mesma palavra hebraica) e a desconfiança (cf. vv. 10-12) se muda em fé.

A segunda narrativa, aqui incluída posteriormente, é mais solene e litúrgica e destaca mais o papel do mediador Moisés; por tudo isso, é atribuída à tradição sacerdotal. “Moisés estendeu a mão sobre o mar”, seguindo uma ordem de Deus e usando o bastão (cf. v. 16); então o mar se fende, “as águas se dividiram em duas. Os filhos de Israel entraram pelo mar a pé enxuto, e as águas formavam duas muralhas, à direita e à esquerda” (vv. 21d-22). Na escuridão, o silêncio da noite e dois elementos cósmicos: o mar hostil, devorador, e o vento (já no relato javista) a serviço de Deus (Sl 104,4). “De pé enxuto”, lit. “sobre a terra seca”, como num novo Gênesis e no final do dilúvio, a água se retira e a terra seca aparece no meio dela (Gn 1,9; 8,1-5). A água hostil (cf. Gn 1,2; Sl 18,5s) se transforma em muralha protetora, em passagem segura para a luz do amanhecer que vem do leste. Direita e esquerda significam também sul e norte. “Na perseguição, os egípcios entraram atrás deles com todos os cavalos do Faraó, seus carros e cavaleiros, e foram até o meio do mar” (v. 23) Quando os egípcios vão atrás deles, as águas se fecham e os engolem (Sb 10,18s), mas não sem nova ordem litúrgica e sua execução imediata: “Javé disse a Moisés: ‘Estenda a mão sobre o mar, e as águas se voltarão contra os egípcios, seus carros e cavaleiros’. Moisés estendeu a mão sobre o mar (vv. 26-27a). As águas voltaram, cobrindo os carros e os cavaleiros de todo o exército do Faraó, que os haviam seguido no mar: nem um só deles escapou. Os filhos de Israel, porém, passaram pelo meio do mar a pé enxuto, enquanto as águas se erguiam em forma de muralhas, à direita e à esquerda” (vv. 28-29).

A recordação desta passagem aflora muitas vezes no AT, a tal ponto que esta libertação foi cantada como o milagre por excelência (Sl 77,17-20; 106,9). Isaías fala da volta do exílio babilônico como de um novo êxodo (Is 43,16-21). Nos registros do Antigo Egito, porém, não se encontra nada sobre esta fuga dos escravos hebreus, talvez por vergonha sobre a derrota (costuma-se registrar só as vitórias do faraó) ou por que achassem insignificante a fuga de alguns grupos de escravos. Pode ser que tivessem acontecido várias fugas de grupos distintos que se uniram depois num relato épico e único. Pelo menos um grupo atribuiu a libertação a seu deus Javé. O que mais se pode afirmar com certeza é que um homem de nome egípcio, Moisés deve ter tido conhecimento dos pontos fracos das fronteiras e do exército egípcio, por isso não escolheu a rota mais curta seguindo pela praia, mas a mais longa (cf. 13,17s) por onde o exército não conseguiu mais seguir, mas atolou (afundou).

Não é possível determinar o lugar e o modo deste acontecimento de Ex 14; mas aos olhos das testemunhas apareceu com uma intervenção espetacular de “Javé guerreiro” (Ex 15,3) e tornou-se um artigo fundamental da fé javista (Dt 11,4; Js 24,7; cf. Dt 1,30; 6,21-22; 26,7-8). Este milagre do mar foi colocado em paralelo com outro milagre da água, a passagem do Jordão (Js 3-4); a saída do Egito foi concebida de maneira secundária à imagem da entrada em Canaã e as duas apresentações misturavam-se no cap.14. A tradição cristã considerou este milagre como uma figura da salvação, e mais especialmente a salvação pelo batismo (1 Cor 10,1) e torna sua leitura obrigatória na vigília pascal.

Nessa ocasião, Moisés e os filhos de Israel entoaram este canto a Javé: “Vou cantar a Javé, pois sua vitória é sublime: ele atirou no mar carros e cavalos” (15,1).

Este cântico é repetido (na primeira pessoa) pelo cântico antigo da profetisa Miriâm, irmã de Moisés, em 15,21 que retém somente a destruição dos egípcios. Miriâm é o nome hebraico traduzido por “Maria” em grego (cf. a participação feminina nos caps. 1-2). No seu livro Alcorão, o fundador do islã, Maomé, confundiu esta irmã de Moisés (2,4-8; Nm 12) com Maria, a mãe de Jesus.

Este salmo de ação de graças (15,1-18; o salmo responsorial apresenta os vv. 8-10.12.17) é o primeiro e o mais celebre dos “cânticos” que a liturgia cristã toma do AT. Trata em toda a sua ampliação do tema da salvação miraculosa através do poder e da solicitude de Javé para com seu povo. O canto da vitória, que Miriam entoa em v. 21, é ampliado até englobar o conjunto das maravilhas do êxodo e da conquista de Canaã e até a construção do templo de Jerusalém, “em vosso monte, no lugar que preparastes para a vossa habitação, no santuário construído pelas vossas próprias mãos” (15,17).

Chegamos ao ápice da libertação da escravidão do Egito, uma experiência fundamental do povo de Deus: A passagem do “mar Vermelho” (em hebraico, dos caniços ou juncos; cf. 2,3; 2 Rs 9,26) assinala topograficamente a saída do povo: é a última batalha, não combativa, a última fronteira. O mar vermelho divide a geografia (entre a África e a Ásia), divide a história e se converte em linha divisória da existência. A passagem pelo mar é quase um nascimento do povo de Israel. Para os israelitas é como paradigma, para nós passar é salvar-se.

Existe neste livro uma versão poética, o canto heróico do cap. 15 (salmo responsorial de hoje e da vigília pascal); temos uma versão mais realista e psicológica, atribuída ao javista (cerca de 950 a.C) e outra mais litúrgica, doutrinal e abstrata, atribuída ao autor sacerdotal (cerca de 550 a.C.). Com essas duas e um toque de eloísta (cerca de 800 a.C.), diz a teoria documentaria, o último narrador compôs o presente capítulo. Isso explica as repetições temáticas e as mudanças de tonalidade. O milagre é narrado de duas maneiras que vamos apresentar segundo a teoria documentária:

Na primeira versão e mais realista, Moisés encoraja os israelitas fugitivos, assegurando-lhes que nada têm a temer nem a fazer (vv. 6.11-14). Então, “Javé fez o mar se retirar com um forte vento oriental, que soprou a noite inteira: o mar ficou seco” (v. 21). “De madrugada, Javé olhou da coluna de fogo e da nuvem, viu o acampamento dos egípcios e provocou uma confusão no acampamento” (v. 24). Os egípcios ali penetravam. O momento é a última vigília da noite, das 2 às 6h da manhã. A salvação chega pela manhã (Sl 17,15; 57). Menciona-se um elemento que faltava, o fogo, sinal da presença de Deus em Gn 15,17 e em Ex 19,18. Pela coluna de fogo e da nuvem, Javé separa os povos: ilumina o caminho do seu povo, enquanto o obscurece para os egípcios (13,21-22; 14,19-20). ”Então os egípcios disseram: ‘Vamos fugir de Israel, porque Javé combate a favor deles’” (v. 25b). “E, de manhã, o mar voltou para o seu leito. Os egípcios, ao fugir, foram ao encontro do mar, e Javé atirou-os no meio do mar” (v. 27). São engolidos pelo seu refluxo (ou pelo menos atolaram com seus carros de guerra). Nesta narrativa atribuída ao javista, somente Javé é que intervém; não se fala de uma passagem do mar pelos israelitas, mas apenas da miraculosa destruição dos egípcios. Esta narrativa representa a tradição primitiva. O eloísta deve ter contribuído com “o anjo do Senhor que ia adiante do exército de Israel se retirou e passou para trás” (v. 19a) identificando-o com a coluna da nuvem e do fogo e com os “600 carros de elite e todos os carros do faraó” (v. 7), assim Deus “emperrou as rodas dos carros, fazendo-os andar com dificuldade” (v. 25a). O javista concluiu: “Nesse dia Javé salvou Israel das mãos dos egípcios, e Israel viu os cadáveres dos egípcios à beira-mar. Israel viu a mão forte com que Javé atuou contra o Egito. Então o povo temeu a Javé e acreditou nele e no seu servo Moisés” (v. 30; cf. Is 37,36). Morte dos opressores e vida com liberdade, assim é o final do juízo de separação. Os israelitas são testemunhas e por isso mudam de atitude. O medo de antes se transforma em “respeito reverencial” (a mesma palavra hebraica) e a desconfiança (cf. vv. 10-12) se muda em fé.

 

A segunda narrativa, aqui incluída, é mais solene e litúrgica e destaca mais o papel do mediador Moisés, portanto, é atribuída à tradição sacerdotal: “Moisés estendeu a mão sobre o mar”, seguindo uma ordem de Deus e usando o bastão (cf. v. 16); então o mar se fende, “as águas se dividiram em duas. Os filhos de Israel entraram pelo mar a pé enxuto, e as águas formavam duas muralhas, à direita e à esquerda” (vv. 21d-22). Na escuridão, o silêncio da noite e dois elementos cósmicos: o mar hostil, devorador, e o vento a serviço de Deus (Sl 104,4). Como num novo Gênesis, como no final do dilúvio, a água se retira e a terra aparece no meio dela (Gn 1,9; 8,1-5). A água hostil se transforma em muralha protetora, em passagem segura para a luz do amanhecer que vem do leste. Direita e esquerda significam também sul e norte. “Na perseguição, os egípcios entraram atrás deles com todos os cavalos do Faraó, seus carros e cavaleiros, e foram até o meio do mar” (v. 23) Quando os egípcios vão atrás deles, as águas se fecham e os engolem (Sb 10,18s), mas não sem nova ordem litúrgica e sua execução imediata: “Javé disse a Moisés: ‘Estenda a mão sobre o mar, e as águas se voltarão contra os egípcios, seus carros e cavaleiros’. Moisés estendeu a mão sobre o mar” (vv. 26-27a). “As águas voltaram, cobrindo os carros e os cavaleiros de todo o exército do Faraó, que os haviam seguido no mar: nem um só deles escapou. Os filhos de Israel, porém, passaram pelo meio do mar a pé enxuto, enquanto as águas se erguiam em forma de muralhas, à direita e à esquerda” (vv. 28-29).

A recordação desta passagem aflora muitas vezes no AT, a tal ponto que esta libertação foi cantada como o milagre por excelência  (Sl 77,17-20; 106,9). Isaías fala da volta do exílio babilônico como de um novo êxodo (Is 43,16-21). Nos registros do Antigo Egito, porém, não se encontra nada sobre esta fuga dos escravos hebreus, talvez por vergonha sobre a derrota (costuma-se registrar as vitórias do faraó) ou por que achassem insignificante a fuga de alguns grupos de escravos. Pode ser que eram várias fugas de grupos distintos que se uniu depois num relato épico e único. Pelo menos um grupo atribuiu a libertação ao deus Javé. O que mais se pode afirmar com certeza, é que um homem de nome egípcio, Moisés, deve ter tido conhecimento das fraquezas do exército egípcio, por isso não escolheu a rota mais curta seguindo pela praia, mas a mais longa (cf. 13,17s), por onde o exército não conseguiu mais seguir, mas atolou (afundou).

“Nessa ocasião, Moisés e os filhos de Israel entoaram este canto a Javé: “Vou cantar a Javé, pois sua vitória é sublime: ele atirou no mar carros e cavalos” (15,1). Este cântico só repete na primeira pessoa o cântico bastante antigo da profetisa Miriâm, irmã de Moisés em 15,21, que retém somente a destruição dos egípcios. Miriâm é o nome hebraico traduzido por “Maria” em grego (cf. a participação feminina em cap. 1-2). Maomé confundiu no Alcorão esta irmã de Moisés (2,4-8; Nm 12) com Maria, a mãe de Jesus.

Não é possível determinar o lugar e o modo deste acontecimento de Ex 14; mas aos olhos das testemunhas, apareceu com uma intervenção espetacular de “Javé guerreiro” (Ex 15,3) e tornou-se um artigo fundamental da fé javista (Dt 11,4; Js 24,7; cf. Dt 1,30; 6,21-22; 26,7-8). Este milagre do mar foi colocado em paralelo com outro milagre da água, a passagem do Jordão (Js 3-4); a saída do Egito foi concebida de maneira secundária à imagem da entrada em Canaã e as duas apresentações misturavam-se no cap.14. A tradição cristã considerou este milagre como uma figura da salvação, e mais especialmente a salvação pelo batismo (1 Cor 10,1) é torna sua leitura obrigatória na vigília pascal.

Na ocasião da destruição do exército de Faraó, entoa-se um salmo de ação de graças (15,1-18; o salmo responsorial apresenta os vv. 8-10.12.17). É primeiro é o mais celebre dos “cânticos” que a liturgia crista toma do AT; trata em toda a sua ampliação do tema da salvação miraculosa que o poder e solicitude de Javé para com seu povo; o canto da vitória que Miriam canta em v. 21, é ampliado até englobar o conjunto das maravilhas do êxodo e da conquista de Canaã e até a construção do templo de Jerusalém, “em vosso monte, no lugar que preparastes para a vossa habitação, no santuário construído pelas vossas próprias mãos” (v. 17).

NBP 15,1-21: Até os tempos de Ezequias e Josias, Javé era visto como um Deus entre outros (v. 11,18,11; Dt 10,17), um Deus guerreiro (cf. v. 3), cujo culto e ação se davam na defesa armada em favor das famílias camponesas e de suas colheitas (ver nota a 14,1-14). Um antigo refrão (vv. 21 e 1), atribuído à profetisa Miriam (cf. Jz 4,4; 5,1.20-21; 1Sm 2), foi reelaborado no ambiente do Templo e do povo consagrado a Javé (vv. 17-18; cf. Dt 7,6; Sl 74,2; 78,54), dando origem ao cântico de Moises.

Evangelho: Mt 12,46-50

No evangelho de hoje, os familiares de Jesus o procuram. Mt copiou este (des)encontro com os familiares de Mc 3,31-35.

Enquanto Jesus estava falando às multidões, sua mãe e seus irmãos ficaram do lado de fora, procurando falar com ele. Alguém disse a Jesus: “Olha! Tua mãe e teus irmãos estão aí fora, e querem falar contigo” (vv. 46-47).

Mt não diz que Jesus estava numa casa (mas diz em seguida em 13,1; cf. Mc 3,20.31). Do lado de “fora” deste círculo das multidões (v. 23), os familiares procuram Jesus, são “a mãe de Jesus e seus irmãos” (v. 31).

O termo “irmão” abrange, em linguagem bíblica, também os parentes (cf. Gn 13,8). A expressão “irmãos e irmãs” de Jesus (cf. 13,55s; 3,31-35) é interpretada de maneira diferente: para os católicos são apenas parentes; para os protestantes são outros filhos de Maria. A Tradução Ecumênica da Bíblia (TEB, p. 1882) anota: Na Bíblia, como ainda hoje no Oriente, a palavra irmãos pode designar tanto os filhos da mesma mãe, como parentes próximos (cf. Gn 13,8; 14,16; 29,15; Lv 10,4; 1 Cr 23,22).

A própria Bíblia não decide a questão (não está escrito em nenhum trecho da Bíblia que Maria teve apenas um filho, nem está escrito que teve mais de um), mais é tradição da Igreja desde os primeiros séculos que Maria não teve outros filhos além de Jesus. A Igreja Católica considera como revelação divina não só a Bíblia, mas também a tradição da Igreja. O que reforça o dogma da Igreja Católica é a entrega da mãe no pé da cruz ao discípulo amado (Jo 19,26-27). Se existissem outros filhos de Maria, Jesus não precisava entregá-la aos cuidados de um discípulo.

Aqui não se menciona o pai (cf. 13,55; Mc 6,3; 10,30). Então, José, destacado por Mt na infância (Mt 1-2), já deve ter morrido e Jesus adulto tornou-se chefe da família que quer agora romper o círculo dos seguidores e reclamar seu parente famoso.

Jesus perguntou àquele que tinha falado: “Quem é minha mãe, e quem são meus irmãos?” E, estendendo a mão para os discípulos, Jesus disse: “Eis minha mãe e meus irmãos. Pois todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (vv. 48-50).

Jesus não despreza vínculos familiares (cf. 15,4-6), por isso, ele tem um “Pai que está nos céus” (6,9; 23,9; Lc 2,41-52; Mc 14,36). Mas ele está criando uma nova família, não através da carne, mas através do Espírito (cf. Jo 1,12-13; Rm 8,14-17). Quem faz a vontade do seu Pai, fará parte desta família de Jesus. Quanto a Maria, ninguém como ela cumpriu a vontade do Pai e foi agradecida com o Espírito (cf. Lc 1,35-38). Jesus anuncia a vontade do Pai e a cumpre (26,42). A comunidade reza por ela na oração que Jesus ensinou (6,10). Será critério no julgamento (7,21-23).

O Papa Bento XVI, na Encíclica Deus caritas est, olha para a situação de Maria deixada de lado, durante os anos da vida pública de Jesus e percebe a sua grande humildade: aceita ser deixada de lado para que Jesus forme a sua nova família. Maria só se aproximará de Jesus no momento da cruz, quando os seus discípulos tiverem fugido (Jo 19, 25-27). Em Pentecostes, todos irão se juntar ao redor d’ela à espera do Espírito Santo (cf. At 1, 14). Santo Ambrósio comentando o texto de hoje diz assim: “Não se propõe aqui a recusa ofensiva dos parentes, mas ensina que os laços espirituais são mais sagrados do que os laços de sangue”.

O próprio Mt acrescentou que Jesus estava “estendendo a mão para os discípulos” (v. 49). Na tradição bíblica, este gesto significa diversas atitudes: carência (12, 13), hostilidade (26,51), benção (Gn 48,14) ou o poder e o julgamento de Deus (frequente em Ez, Jr, Sf). Em Mt, Jesus estende a mão ao leproso (8,3) e a Pedro que afunda (14,31), ambas demonstrações do seu poder auxiliador. Aqui significa que os discípulos estão sob a proteção do seu Senhor que estará com eles até o fim do mundo (28,20).

Para os judeus, “irmãos” já eram os conterrâneos, para os cristãos são os membros da comunidade. Além disso, os discípulos são “meus irmãos” (cf. 28,10; 25,40; 23,8; Jo 20,17; Rm 8,29; Hb 2,11s). Como irmãos de Jesus, podemos invocar Maria como nossa mãe (cf. Jo 19.25-27).

O site da CNBB comenta (citando Jo 15,15): Jesus não quer que nós sejamos seus servos, pois o amor que ele tem por nós não permite isso. O apóstolo São João nos diz no seu Evangelho que Jesus não chama os seus seguidores de servos, mas de amigos, porque lhes revelou tudo o que o Pai lhe deu a conhecer. Mas no Evangelho de hoje, Jesus vai mais além, ele nos mostra que quer que todos os que ele ama e o amam sejam membros da sua família, participem da sua vida divina. Para demonstrar o amor que temos por Jesus, não basta apenas afirmar o amor que se sente por ele, é preciso ir além, é preciso conhecer e realizar a vontade do Pai. Somente quem faz a vontade do Pai ama verdadeiramente a Jesus, torna-se membro da sua família e participa da sua vida.

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