23 de Novembro de 2020, Segunda-feira: “Em verdade vos digo que essa pobre viúva ofertou mais do que todos” .

34ª Semana do Tempo Comum  

Leitura: Ap 14,1-3.4b-5

A descrição do adversário poderoso dos cristãos no cap. 13 (uma trindade diabólica: o dragão = o diabo; a besta-fera do mar = o imperador romano que exige adoração e persegue os cristãos da época; a besta-fera da terra = a propaganda falsa do império) leva à pergunta angustiante: Quem poderia enfrentar a opressão e a ameaça deste poderio? Aqui nosso vidente sabe encorajar: Cabe ao povo cristão não se submeter aos poderes tirânicos e resistir, mantendo a própria identidade, expressa na marca do Cordeiro. A liturgia, que nesse contexto se celebra, reforçará a certeza da vitória.

(Eu, João) tive esta visão: o Cordeiro estava de pé sobre o monte Sião. Com ele, os cento e quarenta e quatro mil que tinham a fronte marcada com o nome dele e o nome do seu Pai.

Em Dn 7,13s, um “filho do homem” foi apresentado em contrastando as bestas-feras (os reinos pagãos). João apresenta aqui um outro animal simbólico, não violento, mas pacífico: o “Cordeiro”, “imolado”, mas “estava em pé” (cf. 5,6), ou seja, Cristo ressuscitado que está junto de Deus Pai no seu trono e recebe igual adoração (cf. a visão do cap. 5; Jo 1,29.36; 1Cor 5,7; 1Pd 1,19). O “monte Sião”, onde a cidade de Jerusalém com seu Templo foi construída, é a capital do rei (Sl 48,2-3) e o monte da confluência universal (Is 2,1-5). No Ap, o monte Sião se situa em Jerusalém celeste e é o trono de Deus (cap. 21-22).

Aos seguidores numerosos da Besta, marcados como o número do nome dela (13,16s), João opõe os fiéis do Cordeiro, marcados com um sinal (cf. Ez 9,4) que é seu nome e o nome de seu Pai (3,12; 7,3s; 22,4) recebidos no batismo. É o “resto” que será salvo (11,1s; 12,17), porque é fiel através das perseguições, ao redor do qual será restaurado o Reino depois da vitória.

Seu número 144.000 é de totalidade: 12x12x1000 simboliza a plenitude do novo povo de Deus (Israel tinha 12 tribos, cf. 7,3-4).

Ouvi uma voz que vinha do céu; parecia o barulho de águas torrenciais e o estrondo de um forte trovão. O ruído que ouvi era como o som de músicos tocando harpa. Estavam diante do trono, diante dos quatro Seres vivos e dos Anciãos, e cantavam um cântico novo. Era um cântico que ninguém podia aprender; só os cento e quarenta e quatro mil marcados, que foram resgatados da terra (vv. 2-3).

Esta voz do céu é como um coral gigantesco. É interessante que o rumor ou estrondo das águas lhe soe como música de cordas. A cena repete a dos cap. 4-5, com os quatro Seres vivos e dos Anciãos, e cantavam um “cântico novo” (cf. 5,9; Sl 33,2s; cf. comentário de 4ª e 5ª feira passadas); Moisés tinha cantado a libertação do Egito (Ex 15,1-21; cf. Ap 15,3-4); o cântico novo acelera a nova ordem instaurada pelo Cordeiro imolado. Este cântico aqui “ninguém podia aprender”, só os 144.000 que são os “resgatados da terra”, porque já pertencem ao céu e, cantando, participam ativamente da sua liturgia (Sl 144,9).

Eles seguem o Cordeiro aonde quer que vá. Foram resgatados do meio dos homens, como primeira oferta a Deus a ao Cordeiro. Na sua boca nunca foi encontrada mentira. São íntegros! (vv. 4b-5).

Nossa liturgia omitiu o v. 4a: “Estes são os que não se contaminaram com mulheres: são virgens”. Não se trata de celibato (recomendação de não ter relações sexuais), mas não se contaminaram com a idolatria (v. 4a; cf. 2Cor 11,1-4 para o sentido de “virgem”). Ou então guardaram continência preparando-se para a batalha (1Sm 21,6).

Eles “acompanham” ou “seguem o Cordeiro aonde quer que vá” (cf. Jo 12,26). Esta afirmação de uma perfeita solidariedade com o Cristo talvez esclareça o tema da virgindade: esta, enquanto condição ideal, acaba de ser apontada como característica do povo cristão (cf. Mt 25,1-13). Aqui, porém, deve-se compreender virgindade num sentido amplo e metafórico: é a integridade e a fidelidade da Igreja, que se preserva de toda contaminação com a idolatria do mundo. Talvez haja aqui também uma advertência mais concreta contra as práticas da prostituição sagrada (cf. Lv 19,29; Dt 23,18; 1Rs 14,24; 15,12; 22,47; 2Rs 23,7; Os 4,14). Desde Oseias, a prostituição ou fornicação é imagem de idolatria (Os 1,2 etc.; cf. Ez 16; 23), aqui significa o culto da Besta (17,1; etc.).

A “mentira” seria em concreto a idolatria (Jr 3,23; 13,25), a pertença ao “falso profeta” (16,13; 19,20; 20,10). Os cristãos fieis são “primícias” (primeira oferta) escolhidas (Tg 1,18), vocabulário sacrificial. As primeiras ofertas representam toda a messe (Dt 26,2), os primogênitos representam toda a família (Nm 3,12; etc.). As vítimas oferecidas ao Deus verdadeiro deviam ser íntegras, sem defeito (Ex 15,5; 1Pd 1,19), são a comunidade que Sf 3,13 anunciou.

Assim como Israel seguia a Javé no tempo do êxodo, o novo povo dos resgatados segue o Cordeiro até ao deserto (cf. Jr 2,2-3), onde se realizarão novos esponsais (Os 2,16-25). Os cento e quarenta e quatro mil foram resgatados (5,9), “são íntegros” e fiéis (v.5), rejeitaram a idolatria e podem ser convidados às núpcias do Cordeiro (cf. 19,9; 21,2; 2Cor 11,2; Mt 25,1-13).

 

Evangelho: Lc 21,1-4

Este relato sobre a observação de Jesus, Lc copiou de Mc 12,41-44, já no mesmo contexto. Colocada aqui, a breve cena, quase parábola em ação, redobra seu significado. Depois de purificar o templo para que seja casa de oração (19,45s) e depois de afirmar sua autoridade transcendente (20,13.41-44), Jesus denunciou a cobiça dos doutores da lei (20,45-47p) “que devoram as casas das viúvas” (20,47; é o versículo anterior ao evangelho de hoje).

Jesus ergueu os olhos e viu pessoas ricas depositando ofertas no tesouro do Templo. Viu também uma pobre viúva que depositou duas pequenas moedas (vv. 1-2).

Havia no átrio do templo cofres para os impostos do culto e as contribuições voluntárias. As viúvas pertencem à categoria dos empobrecidos porque falta o provedor e não havia previdência social na época, precisam de ajuda (Ex 22,21s; Dt 10,18; Sl 68,6; Is 1,17; Jr 22,3; Lm 1,1). Lc dá atenção às mulheres e as viúvas (2,37; 7,12; 18,3; At 9,39-41; cf. 1Tm 5,3-16). Jesus “ergueu os olhos” porque estava ensinando, na posição tradicional de sentado (cf. 2,46; 4,20; 5,3; Mt 5,1s etc.). Ele vê como as ofertas são entregues a um sacerdote que pergunta o valor e a finalidade, confirma a autenticidade da moeda para depois colocá-la no cofre respectivo.

Diante disto, ele disse: “Em verdade vos digo que essa pobre viúva ofertou mais do que todos. Pois todos eles depositaram, como oferta feita a Deus, aquilo que lhes sobrava. Mas a viúva, na sua pobreza, ofertou tudo quanto tinha para viver” (vv. 3-4).

A Bíblia do Peregrino (p. 2525) comenta: Não importa o detalhe inverossímil do relato. Essa viúva é como aquela da história de Elias (1Rs 17), que repartiu com o profeta a última comida sua e do filho. No reino do espírito, a medida não é a quantidade. Dando tudo ao Senhor, confia no Deus que se ocupa das viúvas (Sl 68,6; Pr 15,25).

A viúva confia na previdência de Deus (cf. 12,22-31). Para Lc, é mais um exemplo da exortação sobre ricos e pobres (cf. 2,7.24; 3,11; 6,20-26; 9,58; 12,13-34; 14,33; 16,1-9.13-15.19-31; 18,18-30; At 2,42-46; cf. 1Cor 11,17-34; 2 Cor 8-9; Tg 2,1-9, etc.).

O site da CNBB comenta: Muitas vezes somos injustos com as pessoas porque fazemos do elemento quantitativo a principal fonte dos nossos juízos e das nossas decisões em relação a elas. Assumindo os critérios do mundo, o número cada vez mais torna-se o principal critério para a nossa avaliação. Jesus nos mostra que diante de Deus, devemos pensar de forma diferente. Não é o quanto foi dado que manifesta a generosidade da pessoa, mas o como, o porquê e o significado da quantia que são realmente importantes, pois nos revela o relacionamento da pessoa com Deus e o seu envolvimento com ele.

 

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