28 de Novembro de 2020, Sábado: Portanto, ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do Homem (vv. 34-36).

34ª Semana do Tempo Comum  

Leitura: Ap 22,1-7

No final do seu livro, João mostra que a meta da história, para além do tempo, é a plena realização da Aliança de Deus com a humanidade, numa vida inteiramente imortal numa nova criação, na cidade “nova Jerusalém” (cf. 21,1-2, leitura de ontem). É a realização plena da “presença de Deus entre os homens” (21,3).

A partir de 21,9, “um dos anjos das sete taças”, mostra agora ao vidente a cidade maravilhosa em detalhes, construída com pedras preciosas e dimensões enormes (12.000 estádios em todos os lados, ou seja, um cubo de 2400 km). Um anjo do mesmo grupo (17,1) mostrou antes a “prostituta”, a grande cidade do pecado e da perseguição, Babilônia (18,1; mas significando Roma em 17,9) que foi destruída. A nova Jerusalém que desceu do céu, porém, é “a esposa, a mulher do Cordeiro” (21,9).

A Nova Bíblia Pastoral (p. 1527) comenta: Sua forma é de um quadrado, o modelo de perfeição segundo os esquemas da época. Suas medidas e preciosidades indicam que ele reflete o brilho de Deus. Nela, a presença divina se mostra imediata. Por isso, não é necessário nenhum templo, nem outro tipo qualquer de intermediário entre Deus e a humanidade. Suas portas se abrem para todos. Nela não existe lugar para a mentira e a injustiça. A vida nessa cidade mostra que o paraíso do Gênesis (cap. 2) voltou a ser realidade: a total comunhão com Deus e entre os seres humanos é a esperança maior que alimenta a fidelidade do povo das comunidades.

Na leitura de hoje (vv. 1-5), podemos reconhecer o louvor a Deus em Sl 36,10: “Porque em ti está a fonte viva e à tua luz vemos a luz”. Água e luz são símbolos da vida e do batismo.

(A mim, João, o anjo do Senhor) mostrou-me um rio de água viva, o qual brilhava como cristal. O rio brotava do trono de Deus e do Cordeiro. No meio da praça, de cada lado do rio, estão plantadas árvores da vida; elas dão frutos doze vezes por ano; em cada mês elas dão fruto; suas folhas servem para curar as nações. Já não haverá maldição alguma (vv. 1-3a).

A descrição da cidade desde 21,9 se inspira em Ez 40-48 e, aqui em particular, a imagem do rio em Ez 47,1-12, sem descartar Jl 4,18 nem Zc 14,8. “O rio brotava do trono de Deus e do Cordeiro”. Segundo Ez 47,1, o rio jorrava do Templo; na nova Jerusalém, “não vi nenhum templo nela, pois o seu templo é o Senhor, o Deus todo-poderoso e o Cordeiro” (cf. 21,22). A imagem aqui empregada acentua, portanto, que a “vida viva” vem diretamente de Deus e do Cordeiro (cf. Jo 19,34 alusão à Eva, cf. Gn 2,21s?: água e sangue saem do corpo de Cristo, o novo templo, Jo 2,19-22). A promessas de 21,6; 22,17 se cumprem (cf. 7,17). As águas vivas e vivificantes simbolizam o Espírito (cf. Jo 4; 7,37-39). Nesta passagem, João entrevê a Trindade.

“No meio da praça, de cada lado do rio”, lit.: no meio da praça e do rio, de uma parte e da outra”. A ambiguidade da frase permite diversas interpretações desta descrição inspirada na imagem do Jardim do Éden: seja várias árvores de vida nas margens do rio (cf. Ez 47,12), seja apenas uma árvore de vida no meio de um rio que, segundo Gn 2,9-10 se divide em vários braços. São necessárias folhas medicinais nesse paraíso? “Já não haverá maldição alguma”; pode-se também traduzir: Não haverá mais anátema (condenação, excomunhão). É a anulação da sentença que interditava o acesso ao paraíso (cf. Gn 3,22-24).

A Tradução Ecumênica da Bíblia (p. 2428) comenta a “árvore da vida” (cf. 2,7; 22,14.19): Expulso do paraíso, o homem foi afastado da árvore da vida (Gn 3,22.24). No judaísmo, espera-se do Messias que ele reintroduza os judeus no jardim do Éden. Cf. p. ex. Test. Levi 18,10-11: “Ele (o Messias sumo sacerdote) abrirá as portas do paraíso, e dará aos santos de comer d árvore da vida”.

Na cidade estará o trono de Deus e do Cordeiro e seus servos poderão prestar-lhe culto. Verão a sua face e o seu nome estará sobre suas frontes. Não haverá mais noite: não se precisará mais da luz da lâmpada, nem da luz do sol, porque o Senhor Deus vai brilhar sobre eles e eles reinarão para toda a eternidade (vv. 3b-5).

Os vv. 3-5 estão no futuro, promessa firme do reino (“trono”) de Deus e da visão sem fim (cf. 1Cor 13,12; 1Jo 3,2) dos servos de Deus e do Cordeiro que poderão servir a Deus sem impedimento e sem perseguição. Eles não precisam esconder sua face diante de Deus quando vier o dia da ira (cf. Ex 3,6; 33,2-23; Lv 16,2; 1Rs 19,13; Is 6,2.5 etc.; exceção: Ex 24,11; 33,11; Nm 12,18; Dt 34,10; cf. Is 25,7-9), mas “verão seu rosto”: o grande desejo negado a Moisés (Ex 33,20), esperado pelo orante (Sl 11,7; 17,15), prometido numa bem-aventurança (Mt 5,8) e em 1Jo 3,2. A marca (selo) na sua fronte era antes sinal de proteção (7,2-8; 9,4) agora é sinal de propriedade, eles pertencem a Deus (3,12; 14,1).

“Não haverá noite” (já 21,25b), porque após os mil anos começou o “dia único” (Zc 14,7). “Deus vai brilhar sobre eles” (cf. 21,23; Is 60,19 e a benção de Aarão em Nm 6,25; cf. Sl 80,4; 118,27). Todos os cidadãos “reinarão” junto com o Senhor não só por mil anos, mas “para toda a eternidade”. Reinarão sobre quem? Nesta cidade celeste não há mais súditos, mas todos são “sacerdotes e reis” (1,6; 5,10; 21,6), não há mais concorrência nem opressão, nem exploração nem vingança, mas paz e harmonia perfeita.

Então o anjo disse-me: “Estas palavras são dignas de fé e verdadeiras, pois o Senhor, o Deus que inspira os profetas, enviou o seu Anjo, para mostrar aos seus servos o que deve acontecer muito em breve. Eis que eu venho em breve. Feliz aquele que observa as palavras da profecia deste livro” (vv. 6-7).

A conclusão do livro (vv. 6-22) é um epílogo em forma de diálogo entre o anjo (ou Jesus, claramente em vv. 10-15.16-17.20) e o vidente (João, vv. 18-19.21), comentando as visões contidas no livro e o uso que deve se fazer dele. O livro caracteriza-se como “profecia” e diferente de outros apocalipses (cf. Dn 8,26; 12,4.9) não deve ser guardado em segredo (v. 10), mas lido, ouvido e observado pela assembleia (v. 7; cf. 1,3 com a bem-aventurança quase idêntica).

As palavras deste livro são “dignas de fé e verdadeiras” (cf. Dn 8,26), porque têm origem divina, “pois o Senhor, Deus dos espíritos (lit.) dos profetas, enviou seu anjo” (cf. 1,1). Como em 1,1 (cf. 1,19; 4,1), o conteúdo do livro é resumido: “o que deve acontecer muito em breve”. Quer dizer: os cristãos precisam se preparar diante das perseguições terríveis por parte do imperador romano (Domiciano, a besta do cap. 13) que exige ser adorado como Senhor e Deus. Mas os cristãos devem saber que o Cristo não os deixa sós como órfãos (cf. Jo 14,18): “Eis que eu venho em breve” (cf. vv. 12.20; cf. o auxílio prometido nas perseguições em Mc 13,11; Mt 10,19s; Lc 12,11s; 21,12-15). Não se deve pensar apenas na parusia (vinda do Senhor no fim dos tempos), mas na sua presença consoladora entre os cristãos no dia-a-dia e nas aflições (cf. Mt 18,20. 28,20).

A Nova Bíblia Pastoral (p. 1527) comenta: O livro se encerra recordando seus temas principais: Jesus virá em breve, e as pessoas serão julgadas e recompensadas pelas obras que tiveram praticado. O povo das comunidades se alimenta de tudo o que foi comunicado no conjunto de visões recebidas por João. Por fim, reunido em assembleia, esse povo recebe a proclamação da mensagem e reafirma suas opções e decisões, na esperança da vinda do Senhor Jesus.

 

Evangelho: Lc 21,34-36

No evangelho de hoje lemos a conclusão do discurso escatológico/apocalíptico em Lc 21,34-36 que difere bastante do seu modelo em Mc 13,33-37 cujo conteúdo já foi aproveitado em Lc 12,38.40 e 19,12. O texto de hoje se refere a parusia (volta gloriosa de Cristo, cf. v. 27). Embora preceda a preparação do cenário cósmico (vv. 25s), pode-se dizer que “aquele dia” chegará “de repente” (Sf 1,15).

Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem insensíveis por causa da gula, da embriaguez e das preocupações da vida, e esse dia não caia de repente sobre vós; pois esse dia cairá como uma armadilha sobre todos os habitantes de toda a terra. Portanto, ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do Homem (vv. 34-36).

Jesus lembra outra vez (cf. 8,14) que as preocupações da vida, como a riqueza e a busca do poder, podem distrair daquilo que é realmente essencial. A oração poderá ser poderosa aliada nessa vigilância permanente: “Ficai atentos e orai a todo momento” (v. 36)

Lc manteve somente o motivo de vigiar, “ficar atentos”, mas tem semelhanças com advertências de Paulo (1Ts 5,13.7-10; Rm 13,13). Excessos como gula, embriaguez, mas também preocupações justas de sustento da vida do dia-dia, podem tornar o coração insensível (8,14; 17,26-30; cf. Mt 25,42-45 omissão a respeito dos necessitados). Nunca se deve esquecer da nossa responsabilidade, ou seja, de que responderemos um dia ao tribunal de Deus (cf. Rm 14,10-12; 2Cor 5,10).

Em vez de expectativa imediata ou fazer cálculos sobre o fim, Lc destaca o momento de surpresa, porque “aquele dia” (cf. Lc 10,12; 17,31; Mc 13,32p) “cairá como uma armadilha” (v. 35) para os despreparados e insensíveis (cf. 1Tm 6,9; 3,7; 2Tm 2,26; Ecl 9,12; Is 24,17). Aqui não se trata de sinais, ao contrário dos vv. 11 e 25. Pode-se comparar a 1Ts 5,3.

Não só os judeus, mas “todos os habitantes de toda terra” serão atingidos (Jr 25,29). Ninguém pense que já esteja salvo; o julgamento sobre a cidade de Nínive (Lc11,29,s) e a catástrofe de Jerusalém (586 a.C. e 70 d.C.) foram sinais e advertência.

“Portanto, ficai atentos e orai a todo tempo” (cf. Lc 18,1; 24,53; Rm 1,9s; 1Cor 1,4; Ef 5,20; Fl 1,3s; Cl 1,3; 4,12; 1Ts 1,2; 2Ts 1,3; 2,13; Fm 4 etc.)

“Afim de terdes força”, mas esta palavra corresponde menos ao uso de Lc; melhor tradução: “para serdes julgados dignos” (20,35; At 5,41).

“Para escapar de tudo” (Mc 13,30, diferente Lc 21,32); trata de se resistir a provocação terrível ao seu julgamento, “e ficar em pé diante do Filho do Homem”, para comparecer ao julgamento ou para pôr-se ao serviço. Ao Filho do Homem será entregue o reino de Deus e o juízo final (v. 27; cf. Dn 7,9-14; Jo 5,27). Este último v. pode significar a aprovação diante do juízo de Deus (2Cor 5,10; cf. Sl 1,5). Não é por acaso que a última palavra deste discurso é “o Filho do Homem.” O caminho deste discurso começa no templo junto com a multidão, passa pelos adversários no sinédrio para o sofrimento e a morte. Esta, porém, leva à glória do Filho do Homem. Quem tem a palavra final é o Filho do Homem.

O site da CNBB comenta: A nossa vida é marcada por preocupações constantes que são exigências da agitada vida moderna. Essas preocupações muitas vezes acabam por fazer de si mesmas o centro da nossa vida. Na verdade, a gente deixa de viver a vida que a gente quer para viver a vida que é exigida de nós. Assim, não temos tempo para a oração, para a contemplação, para o encontro com Deus e o estabelecimento de comunhão com ele. O resultado de tudo isso é que deixamos de viver na sua presença e nos fechamos num mundo que cada vez mais nos escraviza e nos impede de viver a verdadeira vida, a vida dos filhos e filhas de Deus em perfeita comunhão e relação com o Pai.

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