7 de Abril de 2019, Domingo: Jesus foi para o monte das Oliveiras. De madrugada, voltou de novo ao templo. Todo o povo se reuniu em volta dele. Sentando-se, começou a ensiná-los (vv. 1-2).

1ª leitura:Is 43,16-21

Nas primeiras leituras dos domingos da Quaresma percorremos a história da salvação no Antigo Testamento (AT). Depois da aliança com Abraão (Gn 15), a vocação de Moisés (Ex 3-4) e a chegada na terra prometida nos domingo passados, ouvimos hoje uma profecia do Segundo Isaías (Deutero-Isaías: caps. 40-55) que atuava no exílio babilônico.

Por causa dos pecados dos reis e demais lideranças, o povo judeu perdeu suas terras e Jerusalém foi destruída pelos babilônios que levaram boa parte do povo ao exílio. O profeta, porém, dá nova esperança. Deus perdoa seu povo e dá um novo começo. Como tirou antigamente os hebreus da escravidão do Egito, libertará agora os cativos do exílio, será um novo êxodo (a palavra grega significa “saída”).

É uma oráculo de salvação, com uma interessante concentração de tempos: presente de libertação (vv. 14-15, omitidos na nossa liturgia); passado remoto e glorioso (vv. 16-17); futuro próximo, que supera todo passado (vv. 18-21).

Nos vv. precedentes, é notável a acumulação de títulos do Senhor (Santo de Israel, Rei, Criador), talvez polemizando com os numerosos títulos de Marduc, o rei dos deuses na Babilônia. A ênfase na teologia de Javé (traduzido por Senhor) como protetor e criador reaviva a esperança de libertação (cf. 41,14; 43,1). É importante deixar claro, para os exilados desanimados, quem é que tem o poder (cf. 42,21).

Isto diz o Senhor, que abriu uma passagem no mar e um caminho entre águas impetuosas; que pôs a perder carros e cavalos, tropas e homens corajosos; pois estão todos mortos e não ressuscitarão, foram abafados como mecha de pano e apagaram-se: (vv. 16-17)

Os vv. 16-17 recordam poeticamente os acontecimentos do êxodo: a travessia do povo de Deus pelo mar Vermelho e o afogamento do exército egípcio (cf. Ex 13-14).

“Homens corajosos”, lit. “poder”; o termo figurado no v. precedente na sua forma adjetiva: “as águas poderosas (impetuosas)”. Deus enfrenta o poder tanto das águas como dos homens

“Não relembreis coisas passadas, não olheis para fatos antigos (v. 18).

A Bíblia do Peregrino (p.1785) comenta: É lei para Israel a memória das ações salvadoras do Senhor, e o esquecimento é delito e fonte de culpas (Sl 78). Mas a memória não deve ser fuga nostálgica, repouso inerte na lembrança, ter saudade do colo materno – em fórmula moderna. A lembrança é válida quando prepara e abre o futuro. O profeta, paradoxalmente, parece substituir a lei da lembrança pelo princípio da esperança. Mas o resultado é que o futuro é descrito com imagens do passado.

Eis que eu farei coisas novas, e que já estão surgindo: acaso não as reconheceis? Pois abrirei uma estrada no deserto e farei correr rios na terra seca. Hão de glorificar-me os animais selvagens, os dragões e os avestruzes, porque fiz brotar água no deserto e rios na terra seca para dar de beber a meu povo, a meus escolhidos. Este povo, eu o criei para mim e ele cantará meus louvores” (vv. 19-21).

As maravilhas do passado, a travessia do mar e a destruição do exército egípcio, serão ofuscados pelas maravilhas maiores que Deus vai operar por ocasião de um novo êxodo. A nova era abre passagem com impulso incontido, como o broto partido da semente.

“Abrirei uma estrada no deserto e farei correr rios na terra seca” O texto masorético (texto hebraico vocalizado no séc. IX d.C.) traz “rios”, como em 41,18 e 43,20, mas o texto mais antigo de Qumran (séc. I) tem “veredas” (cf.42,16; 43,16). A estrada e os rios lembram a avenida de procissão na cidade de Babilônia situada no rio. A “estrada” pelo deserto já foi mencionada em 40,3-5 e significa a volta do exílio como numa avenida e lembra o caminho dos israelitas “pelo deserto” na época de Moisés, rumo a terra prometida. João Batista retomará este anúncio em Mc 1,3p.

“Hão de glorificar-me os animais selvagens”, cf. o desfecho da tentação e Jesus: “Ele vivia entre os animais selvagens” (Mc 1,13), recordando a situação do paraíso que foi perdido (por Adão e Eva, cf. Gn 2-3) e será recuperado por Jesus (como Reino de Deus, cf. Mc 1,15).

“Este povo, eu o criei para mim e ele cantará meus louvores”, não só os animais glorificarão Deus, mas o seu povo, que ele criou (cf. vv. 1-7), seus “escolhidos”, lembrando a fórmula da aliança: “Eu serei seu Deus e eles serão meu povo” (Jr 7,23; Ex 19,5s; Dt 7,6; 26,17-19) que outro profeta Ezequiel, também no exilio, repetirá: “Então habitareis na terra que dei a vossos pais: sereis o meu povo e eu serei vosso Deus” (Ez 36,28; cf. 11,20; 37,23.27). Jeremias chama isso uma “aliança nova” (Jr 31,31-33).

Deus não abandona seu povo que se perdeu na infidelidade à aliança (adorar outros deuses era visto como adultério), mas perdoa e renova a aliança (cf. evangelho de hoje).

 

2ª Leitura: Fl 3,8-14

No cap. 2 desta carta escrita na prisão (1,7.13.17), Paulo apresentou o esvaziamento do Filho de Deus que se fez homem, servo obediente até a morte, e por isso foi exaltado (cf. o hino em 2,5-11), e o esvaziamento da comunidade (2,12-18).Na leitura de hoje, Paulo comenta agora o seu próprio esvaziamento, alertando a comunidade contra os judaizantes que se gloriavam da sua pertença ao povo eleito e, provavelmente, exigiam a circuncisão (sinal desta pertença) também dos cristãos que não vieram do povo judeu, como os gregos em Filipos. No concílio apostólico em Jerusalém, ficou decidido que bastava a fé e o batismo para os pagãos se tornarem cristãos (At 15).

Diante desses pregadores judaizantes que confiam na própria carne e lhe tentam desfazer a pregação, Paulo não poupa palavras (chamando-os de cães, maus operários e mutilados, cf. v. 2) e apresenta suas credenciais como judeu autêntico. Concentra as maiores informações sobre seu passado, que por sinal ele jamais nega: ele foi circuncidado, é da raça de Israel, quanto a Lei, fariseu e perseguia com zelo a Igreja, portanto, “quanto à justiça que há na Lei, irrepreensível” (vv. 5-6). Mas conclui: “O que era para mim lucro eu o tive como perda, por amor de Cristo” (v. 7).

Na verdade, considero tudo como perda diante da vantagem suprema que consiste em conhecer a Cristo Jesus, meu Senhor. Por causa dele eu perdi tudo. Considero tudo como lixo, para ganhar Cristo e ser encontrado unido a ele, não com minha justiça provindo da Lei, mas com a justiça por meio da fé em Cristo, a justiça que vem de Deus, na base da fé (vv. 8-9).

O encontro com Cristo (sua vocação ou conversão em Damasco) inverteu os valores de Saulo-Paulo (At 9,4-5p; Gl 1,15).Os méritos mencionados e outra vantagens que poderiam mencionar são “perda” comparados com o “lucro” (ganho) de Cristo (cf. Mt 13,44-46; 16,26). Lembramo-nos as reflexões de textos sapienciais sobre o valor comparativo da sabedoria (Pr 8; Jó 28; Sb 7).

Com a conversão de Saulo-Paulo em Damasco, todos os privilégios de nascimento e educação, todos os esforços religiosos e morais desmoronaram. Doravante Paulo os considera não só desprezíveis, mas nocivos (“lixo”, merda), favorecendo orgulho espiritual que termina pela rejeição da graça de Cristo. “A confiança na carne” (vv. 3-4) não é somente atenuada pela fé, mas deve ser eliminada.

“A vantagem suprema que consiste em conhecer a Cristo”; o termo “conhecer” tem um sentido bíblico muito forte: não descoberta intelectual, mas vinculo vital íntimo (cf. Gn 4,1; Lc 1,34), que será explicado nos vv. 10-11.

O v. 9 com a oposição das duas justiças (da lei, da fé) é umasíntese brevíssima de uma doutrina central de Paulo. A Tradução Ecumênica da Bíblia (p.2285) comenta: A recordação do passado judeu do apostolo enseja uma definição notável das duas justiças: uma que vem da lei, a outra que é um dom de Deus pela fé em Cristo (lit. “a fé de Cristo”; cf. Gl 2,20…). Esta visão do tema foi largamente explorada em Rm e Gl.

Esta consiste em conhecer a Cristo, experimentar a força da sua ressurreição, ficar em comunhão com os seus sofrimentos, tornando-me semelhante a ele na sua morte, para ver se alcanço a ressurreição dentre os mortos (vv. 10-11).

A Bíblia do Peregrino (p.2822) comenta: Frase culminante, das que se destacam em todo o corpo paulino: conhecimento íntimo da pessoa de Cristo, experiência pessoal da eficácia da sua ressurreição, comunhão com sua paixão e esperança segura de ressuscitar. Muitos paralelos poderiam servir de molduras a essas frases; indiquemos ao menos Rm 8.

“Comunhão com os seus sofrimentos, tornando-me semelhante a ele na sua morte”; lit. tornados da mesma forma que sua morte (cf. 2,6 traduzido “ser igual”). A Tradução Ecumênica da Bíblia (p.2285) comenta: Os vv. 10-11 aplicam ao cristão o que o hino dissera de Cristo (ver 2,6-11). “Conhecer Cristo, ganhar Cristo, ser achado em Cristo” é ser introduzido no conhecimento do passado, cuja presença permanece ativa. A ressurreição de Cristo permanece atual, e o cristão dela participa, do mesmo modo que participa do seu sofrimento e de sua morte (cf. 2Cor 4,10) pelo despojamento (3,7-8), a luta apostólica (1,30) e eventualmente o martírio (2,17).

“Para ver se alcanço a ressurreição dentro os mortos”; o apóstolo não exprime uma dúvida, já que a esperança é fundada no dom real de Deus. Mas a espera parece tornar a certeza menos absoluta e iniciar a luta. A Bíblia de Jerusalém (p.2208s) comenta: Paulo não pode estar falando aqui da ressurreição (geral) que se imporá a todos os homens, bons ou maus, e não salvará estes últimos de uma morte eterna (Jo 5,29). Pensa antes na verdadeira “ressurreição”, a dos justos, que os faz sair, “de entre os mortos” para irem viver com Cristo (Lc 20, 35).

Não que já tenha recebido tudo isso, ou que já seja perfeito. Mas corro para alcançá-lo, visto que já fui alcançado por Cristo Jesus. Irmãos, eu não julgo já tê-lo alcançado. Uma coisa, porém, eu faço: esquecendo o que fica para trás, eu me lanço para o que está na frente. Corro direto para a meta, rumo ao prêmio, que, do alto, Deus me chama a receber em Cristo Jesus (vv. 12-14).

A Tradução Ecumênica da Bíblia (p.2285) comenta: Paulo está consciente de ter sido objeto de uma graça, mas sabe que não deve tirar pretexto disso para recusar todo o esforço. Se, no v. 15, Paulo diz “nós os perfeitos”, talvez seja com uma ponta de ironia, já perceptível aqui (cf. 1Cor3,6). Se não atingiu a meta, os filipenses tampouco; ele os convida a progredia como ele próprio.

“Alcançá-lo”; o complemento deste verbo, três vezes subentendido, está incluído nas palavras precedentes: Cristo e a sua ressurreição. Paulo arremete para alcançar, por que responde a um “chamado” (v. 14) e ele mesmo foi “alcançado” (v. 12), por Cristo no caminho a Damasco.

A graça de Deus atua e completa os valores humanos (da carne). Para corresponder a graça de Deus, o homem deve manter o próprio esforço, buscando o prêmio como atleta de olimpíadas. É sempre cara a Paulo a imagem da vida cristã como corrida em um campeonato (2,16; 1Cor9,24). Para ele, a prática da fé é um programa que vai se realizando ao longo da vida, como uma prova de atletismo (2,16), desde o chamado, que é a largada, até a premiação (1Tm 6,12). Cristo alcançou Paulo no caminho de Damasco, agora compete a Paulo correr para alcançar a Cristo (1Cor 9,24). Enquanto na Galileia, Jesus comparava o reino de Deus com metáforas agrícolas, Paulo gosta de usar metáforas esportivas ou militares nas cidades greco-romanas.

Evangelho: Jo 8,1-11

É hoje opinião corrente que este relato sobre a adúltera perdoada é inserção posterior. A linguagem em parte não é de João; o texto falta nos manuscritos antigos; alguns manuscritos o colocam depois de Lc 21,38. Contudo, é canônico, ou seja, faz parte do NT inspirado, conserva a recordação de um episódio de Jesus e é uma joia literária e religiosa. S. Jerônimo o acolheu na sua tradução em latim (Vulgata), assim se espalhou no ocidente.

Jesus foi para o monte das Oliveiras. De madrugada, voltou de novo ao templo. Todo o povo se reuniu em volta dele. Sentando-se, começou a ensiná-los (vv. 1-2).

A cena se desenrola publicamente, no templo, onde Jesus costuma ensinar (18,20). A cena e o estilo combinam melhor com os evangelhos sinóticos (cf. Mc 11,11s.19s.27; 14,49; Lc 19,47-20,1; 21,37): o “monte das Oliveiras” (só aqui em Jo; cf. 18,1), a volta de Jesus ao templo no outro dia, onde ensina sentado (Mt 5,1s etc.; em Jo, Jesus fica mais em pé, cf. 7,37) com o povo “em volta dele”, os detalhes do diálogo sem o dualismo joanino, o perdão à mulher pecadora pela palavra de Jesus (cf. Lc 7,36-50).

Entretanto, os mestres da Lei e os fariseus trouxeram uma mulher surpreendida em adultério. Colocando-a no meio deles, disseram a Jesus: “Mestre, esta mulher foi surpreendida em flagrante adultério. Moisés na Lei mandou apedrejar tais mulheres. Que dizes tu?” Perguntavam isso para experimentar Jesus e para terem motivo de o acusar (vv. 3-6a).

O conjunto “mestres da lei e fariseus” (ou letrados do partido dos fariseus) é sinótico (Jo não costuma mencionar os mestres da lei, mas diz logo “os judeus”). Eles apresentam ao “mestre” um caso legal prático, provavelmente com intenção capciosa (como a moeda de César, Mc 12,13-17p; cf. Lc 6,7; Jo 6,6). Não lhe pedem uma sentença forense (o mestre não é juiz), mas um parecer sobre a aplicação da lei mosaica (não de uma observância qualquer) a um caso particular. Isso pressupõe que os interlocutores viram Jesus distanciar-se da lei ao perdoar pecados. A pergunta pode equivaler: nós a surpreendemos em flagrante adultério; devemos levá-la ao tribunal competente ou a executamos sem mais? (cf.Gn 38; Dt 17,7).

A Lei de Moisés decreta pena de morte para adúlteros (Lv 20,10: homem e mulher; Dt 22,22: apedrejar ambos), pena de morte por lapidação para a prometida ou desposada, infiel ao homem a que legitimamente pertence, embora ainda não conviva com ele (Dt 22,21; cf. Mt 1,19). Ez 16,38-40 menciona a lapidação como pena normal das adúlteras. No plano simbólico, muitos textos do AT apresentam Javé Deus como esposo que perdoa e reconcilia consigo a mulher infiel: Samaria (Os 2) ou Jerusalém (Is 1,21-26; 49; 54; Ez 16).

No tempo de Jesus, os romanos se reservavam o direito de condenar à morte (cf. 18,31). Os fariseus queriam linchar a pecadora (cf. At 7,58: Estevão)? Parece que não há saída da pergunta armadilha: Se Jesus concordasse com a lei de Moisés neste sentido, estaria contrariando sua própria misericórdia para com os pecadores (cf. Lc 15,1s) e se colocando ainda contra Roma. Se ele não concordasse com a aplicação da Lei, estaria contra a vontade de Deus no Antigo Testamento (cf. Mc 12,13.15).

Mas Jesus, inclinando-se, começou a escrever com o dedo no chão. Como persistissem em interrogá-lo, Jesus ergueu-se e disse: “Quem dentre vós não tiver pecado, seja o primeiro a atirar-lhe uma pedra.” E tornando a inclinar-se, continuou a escrever no chão. E eles, ouvindo o que Jesus falou, foram saindo um a um, a começar pelos mais velhos (vv. 6b-9a).

Jesus, em lugar de dar logo uma resposta verbal, escreve no chão, depois responde e continua a escrever. O que escreveu? O narrador não diz, mas os comentaristas encontraram amplo campo para conjecturas: algum texto da legislação penal (costume romano de escrever a sentença e depois pronunciá-la), os nomes dos que “se afastam do Senhor, estarão escritos na terra” (Jr 17,13), os pecados das pessoas presentes e da humanidade, ou simplesmente rabiscos. De fato, este gesto é um recurso narrativo, como que tomando tempo para refletir (v. 6) e na segunda vez (v. 8), como que esperando que os “impecáveis” executassem a sentença.

Mas podemos lembrar que Deus escreveu com seu dedo os dez mandamentos na pedra (Ex 31,18). Jesus escreve com seu dedo no pó da terra. A Lei ao pé da letra não basta. Paulo escreveu: “A letra mata, o Espirito comunica a vida” (2Cor 3,6).

A resposta de Jesus (v. 7: “Quem estiver sem pecado…”) não se refere à situação jurídica (houve inquérito?) nem às leis do AT (cf. Dt 13,10; 17,7: as testemunhas deviam ser os primeiros a atirar pedras, depois o povo) nem à situação política (privilégio dos romanos de condenar à morte). Jesus questiona a situação dos que o interrogam: Eles têm direito de julgar em nome do AT ou são pecadores também (cf. Mt 5,27s)? São eles realmente pessoas melhores (cf. Lc 13,1-5)? Este argumento talvez não convencesse fariseus, mas reflete a missão cristã anunciando o juízo de Deus sobre todas as pessoas (Rm 1,18; 3,9-18).

Com a atitude serena e soberana de Jesus se desprende uma força que desmascara (“colocaste nossos segredos ante a luz da tua face”, Sl 90,8), uma indignação que os faz “retroceder confusos”, “voltar atrás envergonhados” (Sl 70,3-4; 129,5). Há outro “adultério”, mais grave, a infidelidade dos dirigentes a seu Deus, denunciada pelos profetas (p. ex. Ez 16; Os 2).

Jesus continua a escrever para sua palavra surtar efeito no tempo (cf. o autoconhecimento do oráculo grego de Délfi: “Conheça-te a ti mesmo”). Os que saem primeiro são os “mais velhos”, ou seja, os anciãos do sinédrio (cf. o fariseu Nicodemos (cf. 3,1s.4) ou simplesmente os mais sábios com mais experiência de vida.

E Jesus ficou sozinho com a mulher que estava lá, no meio do povo. Então Jesus se levantou e disse: “Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?” Ela respondeu: “Ninguém, Senhor.” Então Jesus lhe disse: “Eu também não te condeno. Podes ir, e de agora em diante não peques mais” (vv. 9b-11).

Ficaram só Jesus e a pecadora “no meio” (o texto grego não diz: “do povo”, v. 9b). Stº. Agostinho comentou: “Restaram só dois, a miserável e o misericordioso.” Resta ainda esclarecer a posição requerida de Jesus a respeito desta pecadora flagrada. A cena não é apenas uma controvérsia com os escribas, mas um problema pastoral que só se resolve pela palavra de Jesus (vv. 7b.11).

Agora Jesus toma iniciativa, porque a solução do caso não pode ser: porque todos são pecadores, todos são isentos? (cf.Mt 7,1-5), mas: todos são pecadores e necessitam de conversão e perdão; nova vida só é possível na base do perdão (cf. Lc 15; Mt 18 e a tradição batismal em 1Cor 6,9-11; cf. “de agora em diante” em relação à vida anterior de pecado em Rm 6,19.21; 8,1; 1Cor 7,14; 2Cor 5,16; 6,2; Ef 5,8; 1Pd 2,10.15). Mas a graça divina exclui o pecado (Rm 6,1), por isso a palavra final: “Não peques mais”.

Na vida de Davi há um caso judicial notável (2Sm 14): o rei tem que sentenciar se deve condenar o homicida ou perdoar o réu (seu próprio filho culpado, Absalão). A lei foi feita para o homem (e a mulher), e Jesus não veio para julgar (condenar) e sim para salvar (3,17; 12,47). A salvação dessa mulher está no perdão e na emenda (Ez 16,63).

O site da CNBB comenta: Quando falamos em pecado, sempre nos referimos aos pecados que os outros cometeram, jamais aos nossos, porque os outros precisam ser condenados pelos seus erros e nós somos diferentes, precisamos ser compreendidos. Quando fazemos isso, geralmente escondemos dos outros a face amorosa e misericordiosa de Deus, porque esta face é só para nós, e lhes mostramos um Deus que pune e é vingativo, que quer o castigo de todos, e esta face não é para nós. Com isso, nos tornamos um obstáculo para a conversão dos outros e, em consequência disso, Deus não agirá com misericórdia e amor conosco.

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