02 de maio de 2016 – Páscoa 6ª semana 2ª feira

Leitura: At 16,11-15

“Vem à Macedônia e ajuda-nos” foi o pedido de um macedônio numa visão noturno ao apóstolo Paulo. Hoje ouvimos da chegada de Paulo, Silas e Timóteo em Filipos, cidade do primeiro distrito da Província da Macedônia.

Embarcamos em Trôade e navegamos diretamente para a ilha de Samotrácia. No dia seguinte, ancoramos em Neápolis, de onde passamos para Filipos, que é uma das principais cidades da Macedônia, e que tem direitos de colônia romana. Passamos alguns dias nessa cidade (vv. 11-12).

Por mar e terra o apóstolo e seus novos companheiros chegam a Filipos. A cidade recebeu o nome de Filipe, rei macedônio e pai de Alexandre Magno. Foi transformada em colônia romana em 31 a.C. e era uma cidade essencialmente latina. Sua administração copiava a de Roma. Paulo e Silas já tinham a cidadania romana (cf. v. 37s; 22,25-29).

Como “colônia romana”, Filipos gozava de privilégios. Mas seu privilégio maior agora é ser a primeira cidade européia a receber os mensageiros do evangelho. Como o relato na primeira pessoa plural (“nós”) começou em v. 10, pode ser que nosso informante seja Timóteo. Uns exegetas supõem que a autoria da obra de Lc (o evangelho e os Atos) ocorreu em Filipos (cf. o reinício do relato de nós em 20,5s).

No sábado, saímos além da porta da cidade para um lugar junto ao rio, onde nos parecia haver oração. Sentados, começamos a falar com as mulheres que estavam aí reunidas (v. 13).

Conforme seu costume, Paulo costuma procurar primeiro uma sinagoga dos judeus para anunciá-los o evangelho antes de se dirigir aos pagãos. Em Filipos, os judeus não tinham sinagoga; por isso foi provável que fizesse suas reuniões perto do rio (para as abluções do ritos de pureza).

A palavra grega que traduzimos por oração pode designar também um lugar de oração, seja uma sinagoga, seja um lugar ao ar livre. O fato de ser sábado faz pensar num rito judaico; mas o fato de se reunirem somente mulheres depõe contra isso. Eram pagãs simpatizantes do judaísmo? O clima de oração partilhada favorece a comunicação da mensagem. A ressurreição de Cristo foi comunicado também primeiramente às mulheres (Lc 24,1-11p).

Uma delas chamava-se Lídia; era comerciante de púrpura, da cidade de Tiatira. Lídia acreditava em Deus e escutava com atenção. O Senhor abriu o seu coração para que aceitasse as palavras de Paulo (v. 14).

Em vez de falar da reação do conjunto, o narrador se fixa em uma, Lídia, a primeira mulher cristã na Europa, originária de Tiatira, cidade da Lídia (Ásia Menor). Dedicava-se ao lucrativo comércio de luxuosos tecidos tingidos em púrpura. Ela “acreditava em Deus”, não nos diversos deuses greco-romanos, portanto era adepta da religião judaica. “Escutava com atenção” e “o Senhor” (Deus, Jesus) a abre por dentro (o coração) para que aceite e se entregue às palavras do apóstolo.

 

Após ter sido batizada, assim como toda a sua família, ela convidou-nos: “Se vós me considerais uma fiel do Senhor, permanecei em minha casa.” E forçou-nos a aceitar (v. 15).

A conversão de Lídia acarreta a de toda a sua família (cf. 10,44, 16,31.34; 18,8;). O batismo com “toda a sua casa” (incluindo também servos e empregados) é normal nessa sociedade (10; 16,33; 18,8; 1 Cor 1,16), mas não é normal que a mulher seja a chefe da casa (cf. Sl 113,9). O contexto nos lembra do nosso costume de batizar crianças, porque os judeus circuncidavam os seus meninos, mas o Concílio de Jerusalém autorizou o batismo no lugar da circuncisão para fazer parte do povo de Deus (da Igreja). É acaso que o batismo “com todos da sua casa” apareça justamente neste capítulo (também em vv. 32-34) após o do Concílio?

Os missionários aceitam a hospitalidade generosa oferecida, seguindo o conselho de Jesus (Lc 10,3-10) e o exemplo do profeta (2 Rs 4). Mas era contra a linha de conduta ordinária de Paulo que fazia questão de não viver à custa da comunidade (cf. 20,33-35; 1 Ts 3,8; 1 Cor 9). Também mais tarde os filipenses fá-lo-ão aceitar auxílios que jamais teria recebido de outros (cf. Fl 4,10-18). É o melhor reconhecimento à caridade de Lídia e dos outros cristãos de Filipos que se torna a comunidade preferida de Paulo.

 

 

Evangelho: Jo 15,26-16,4a

No seu discurso de despedida na última ceia, Jesus falou também sobre aspectos negativos da vida cristã no futuro, o ódio do e as perseguições que seus discípulos deveriam enfrentar (cf. evangelho de ontem, vv. 18-21 e os vv. 22-25 omitidos pela liturgia).

Quando vier o Defensor que eu vos mandarei da parte do Pai, o Espírito da Verdade, que procede do Pai, ele dará testemunho de mim. E vós também dareis testemunho, porque estais comigo desde o começo (15,26-27).

O Espírito (paráclito, “defensor”, cf. 14,16s.26; 16,7-15) é o grande acompanhante do futuro depois da partida de Jesus. Por isso, sua menção não interrompe o curso do pensamento anterior, mas de outra parte, antecipa a seção de 16,6-15 e esses versículos poderiam ser colocados depois de 16,5 (ou 16,41).

O Pai é a fonte do Espírito, o Filho o envia (14,16.26; 16,7; 19,30; 20,22). O objeto do testemunho é a pessoa de Jesus e sua obra. O espírito da verdade testemunha a “verdade” de Jesus, como Jesus testemunha a verdade do Pai (14,6; 18,37). Como esta verdade é também amor (13,34s; 15,9-13; 1 Jo 4,8.16), o Espírito só pode estar onde se pratica (testemunha) o amor. O Espírito atesta por si, e por meio dos discípulos inspirando-os (cf. Mt 10,20). Os discípulos que “estão comigo desde o começo” (cf. 1 Jo 1,1-3) hão de ser testemunhas históricas (Is 8,16-18), porque acompanharam Jesus em seu ministério, e testemunhas inspiradas da sua missão transcendente (cf. o interesse da redação no testemunho do discípulo amado em 19,35; 21,24). Do testemunho falarão explicita ou implicitamente os Atos (1,8; 5,32).

A Bíblia de Jerusalém (pag. 2024) comenta: “Depois da partida de Cristo, é o Espírito que o substitui junto dos fiéis (14,16.17; 16,7; cf. 1,33). Ele é o “defensor“ (em grego paráclito), advogado que intercede junto do Pai (cf. 1 Jo 2,1), ou que pleita diante dos tribunais humanos (15,26.27; cf. Lc 12,11-12; Mt 10,19-20p; At 5,32); ele é o Espírito de verdade (cf. 8,32), que conduz à plenitude da verdade (16,13), fazendo compreender a personalidade misteriosa de Cristo: como Cristo cumpriu as Escrituras (5,39), qual o sentido de suas palavras (2,19), de seus atos, de seus “sinais” (14,16; 16,13; 1 Jo 2,20s. 27; Rm 8,16), tudo que os discípulos não haviam compreendido antes (2,22; 12,16; 13,7; 20,9). Assim, o Espírito dará testemunho de Cristo (15,26; 1 Jo 5,6-7) e confundirá a incredulidade do mundo (16,8-11; cf. Lc 24,49; Rm 5,5)”.

O Credo professado nos Concílios de Niceia (325) e Constantinopla (381) afirma-se no texto grego que o Espírito “procede do Pai” (v. 26), mas a Igreja latina (Roma) acrescentou “e do Filho” (filióque). É uma diferença de doutrina (para os ortodoxos apenas “pelo Filho”), mas a separação da Igreja Ortodoxa e da Igreja Católica Romana aconteceu em 1054 mais por motivos políticos (imperador em Constantinopla ou no Ocidente) e culturais (grega ou latina) do que doutrinais. A Bíblia de Jerusalém (pag. 2028) diz sobre o v. 26: Trata-se da “missão” do Espírito ao mundo, não da “processão” do Pai, no seio da Trindade.

Eu vos disse estas coisas para que a vossa fé não seja abalada. Expulsar-vos-ão das sinagogas, e virá a hora em que aquele que vos matar julgará estar prestando culto a Deus.  Agirão assim, porque não conheceram o Pai, nem a mim. Eu vos digo isto, para que vos lembreis de que eu o disse, quando chegar a hora (16,1-4a).

“Eu vos disse estas coisas para que a vossa fé não seja abalada” (abalar: No sentido literal da palavra: pedra que faz tropeçar (Mt 16,22) e “Lembreis de que eu o disse, quando chegar a hora”. “Estas coisas” referem-se ao conjunto do discurso de despedida que quer prevenir os discípulos para o futuro com coisas negativas como traição, cruz, perseguição que não devem desconcertar, pois Jesus as anuncia de antemão (cf. 13,19; 14,29; 16,4). Ao cumprir-se o anunciado, seja motivo de fé e perseverança.

“Chegar a hora”, esta expressão foi até agora relacionada com o sofrimento de Jesus, que é ao mesmo tempo sua glorificação (cf. 2,4; 7,30; 8,20; 12,23.27; 13,1; 16,32; 17,1). Aqui se refere à perseguição dos discípulos (cf. vv. 21.25.32).

Volta-se ao tema da perseguição por causa de Jesus. Duas perspectivas sobrepõem-se: a próxima, da paixão e morte de Jesus; a futura, da difusão do evangelho pela Igreja. À segunda se refere o “expulsar da sinagoga” (9,22), que era um fato consumado quando se escreveu este evangelho. Quando a “matar”, é possível que o autor esteja pensando em Estêvão e Tiago (At 7; 12,2).

É terrível a frase “aquele que vos matar julgará estar prestando culto a Deus”, apresentando a perseguição como uma espécie de homicídio ritual, como “obra agradável a Deus”. Podemos pensar em textos polêmicos, ex. Sl 149,9: “executar a sentença prescrita é uma honra”, ou o zelo fanático dos Macabeus contra seus compatriotas (“circuncidaram à força”, 1 Mc 2,46) e outras práticas da história religiosa que não escutaram ou não compreenderam essa denúncia de Jesus (ex. conversões à força, cruzadas, inquisição, etc.). Para não abalar sua fé, os discípulos têm que saber que os perseguidores não fazem a vontade de Deus “porque não conheceram o Pai, nem a mim.”

O site da CNBB comenta: Estamos na penúltima semana do tempo da Páscoa e a Igreja vem, através da liturgia da palavra da sexta semana do tempo pascal, nos preparar para as festas que se aproximam, ou seja, a festa da Ascensão de Jesus, que iremos celebrar no próximo domingo, e a festa de Pentecostes, que iremos celebrar no domingo seguinte. Por isso, vemos no Evangelho de hoje Jesus prometendo o Espírito Santo a seus discípulos e, ao mesmo tempo, falando a eles como será a vida sem a sua presença, ou seja, o testemunho que deverão dar do Evangelho e a conseqüente perseguição que virá com este testemunho. Mas as suas palavras são antes de tudo um estímulo para que os apóstolos sejam fiéis nos momentos difíceis.

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