03 de Junho 2019, Segunda-feira: Disse-vos estas coisas para que tenhais paz em mim. No mundo, tereis tribulações. Mas, tende coragem! Eu venci o mundo!” (v. 33).

7ª Semana da Páscoa 

Leitura: At 19,1-8

A leitura de hoje nos apresenta Paulo na sua terceira viagem missionária. Ele partiu de novo de Antioquia e passou pelo território da Galácia e Frígia (cf. 18,23). O texto ocidental traz: “Quando, de acordo com seus projetos, Paulo queria partir para Jerusalém, o Espírito lhe disse que voltasse para a Ásia. Depois de ter, por isso, atravessado…”

Enquanto Apolo estava em Corinto, Paulo atravessou as regiões montanhosas e chegou a Éfeso (v. 1a).

Éfeso (situada no oeste da atual Turquia) era então, com Alexandria do Egito, uma das maiores e mais belas cidades do império: centro religioso, político e comercial, com população de diferentes origens. No caminho da missão evangelizadora de Paulo, será a quarta comunidade importante depois de Jerusalém, Antioquia e Corinto. Já no final da viagem anterior, Paulo chegou a Éfeso e deixou seu casal colaborador Priscila e Áquila. O casal instruiu Apolo (cf. 1Cor 3,6), um judeu-cristão de Alexandria que era versado nas Escrituras e falava com entusiasmo de Jesus, mas, segundo 18,25 “só conheceu o batismo de João”. Depois foi a Corinto, onde ajudou muito, mas surgiram divisões lá (cf. 18,24-27; 1Cor 1,12; 3,4-11.22; cf. 1Cor 16,12; Tt 3,13). Apolo não pertence ao grupo de Paulo e permanece autônomo.

Aí encontrou alguns discípulos e perguntou-lhes: “Vós recebestes o Espírito Santo quando abraçastes a fé?” Eles responderam: “Nem sequer ouvimos dizer que existe o Espírito Santo!” (vv. 1b-2).

Aqui temos outro encontro com membros do movimento espiritual do Batista. Estes “discípulos” não são cristãos ainda, são discípulos de João Batista (cf. Lc 5,33p; 7,18; 11,1 etc.) cujo batismo era apenas de conversão e não transmitia o Espírito (cf. 1,5). Eles deviam ignorar não a sua existência – se é que tinham um conhecimento, embora mínimo, do Antigo Testamento – mas a sua efusão, em realização das promessas messiânicas (cf. 2,17-18.33; Jl 3,1-5).

Então Paulo perguntou: “Que batismo vós recebestes?” Eles responderam: “O batismo de João.” Paulo disse-lhes: “João administrava um batismo de conversão, dizendo ao povo que acreditasse naquele que viria depois dele, isto é, em Jesus” (vv. 3-4).

No movimento de João Batista nunca se batizava invocando o nome do Batista (como se invoca o nome de Jesus, cf. 2,38 etc.), era um “batismo de conversão” (cf. 1,5). O Batista podia ser invocado como rival da Igreja, mas também podia ser entendido como preparação (precursor) para a Igreja (Lc 3,5-7; Jo 1,19-34; 3,22-36). Assim acontece em Éfeso: já morto, com seu convite ao arrependimento e a esperar o julgamento, com seu testemunho explícito sobre Jesus, o Batista continua conduzindo discípulos para o verdadeiro Messias.

Tendo ouvido isso, eles foram batizados no nome do Senhor Jesus. Paulo impôs-lhes as mãos e sobre eles desceu o Espírito Santo. Começaram então a falar em línguas e a profetizar. Ao todo, eram uns doze homens (vv. 5-7).

A diferença externa entre os dois batismos era pequena, de modo que os pagãos podiam confundi-los: ambos os grupos se separaram da sinagoga e praticavam um batismo. A diferença essencial consiste no dom do Espírito (Jo 7,39; 14,15ss; 15,26s) e suas manifestações (falar em línguas e profetizar, cf. 2,4.18; 10,44-46). Agora são testemunhas, são evangelizadores de fato, falam segundo Deus, comunicam palavras novas e gestos de amor e solidariedade. Aqui, como em 8,14-17, a vinda do Espírito está ligada à imposição das mãos que simboliza também a ligação com a Igreja apostólica.

Paulo foi então à sinagoga e, durante três meses, falava com toda convicção, discutindo e procurando convencer os ouvintes sobre o Reino de Deus (v. 8).

A narrativa, interrompida pelas notícias sobre Apolo e sobre os joanistas, recomeça: 18,23 e 19,1 continuam em 19,8. Paulo permanecerá dois anos em Éfeso, anunciando o evangelho a judeus e também a gregos (v. 10; cf. 20,31).

Hoje, não existe mais o movimento de João Batista. Existem outras igrejas (Batistas, Assembleias, Pentecostais etc.) que não praticam e questionam o batismo de crianças (apesar de At 16,15.31-34). Mas dentro da Igreja Católica há de admitir que muitos se declaram “discípulos” (“católicos”), mas falta muito para completar sua iniciação crista.

A Conferência do CELAM em Aparecida 2007 declarou: A paróquia precisa ser o lugar onde se assegure a iniciação cristã e terá como tarefas irrenunciáveis: iniciar na vida cristã os adultos batizados e não suficientemente evangelizados; educar na fé as crianças batizadas em um processo que as leve a completar sua iniciação cristã; iniciar os não batizados que, havendo escutado o querigma, querem abraçar a fé. Nessa tarefa, o estudo e a assimilação do Ritual de iniciação Cristã de Adultos é referência necessária e apoio seguro (DAp 293).

 

Evangelho: Jo 16,29-33

Os discípulos nem sempre entenderam bem o discurso de despedida na última ceia, porque era em muitos pontos enigmático e figurativo.

Os discípulos disseram a Jesus: “Eis, agora falas claramente e não usas mais figuras. Agora sabemos que conheces tudo e que não precisas que alguém te interrogue. Por isto cremos que vieste da parte de Deus” (vv. 29-30).

O autor pode querer expressar que os cristãos fiéis conseguem decifrar a linguagem enigmática de Jesus e entendê-la (v. 25). Mas isso pode ser precipitado. Os discípulos acham que o momento escatológico de falar às claras já tem chegado (cf. v. 25), mas só repetem a primeira parte da frase anterior de Jesus: “Eu saí do Pai e vim ao mundo; de novo deixo o mundo e vou ao Pai” (v. 28). Os discípulos ainda não entendem a partida de Jesus, o sentido da sua morte.

Trata-se de um mal-entendido dos discípulos. Eles se detêm no sentido mais estreito no contexto limitado, comparam as “parábolas” (linguagem figurada, cf. 10,6; 15,1-8; 16,21.25) com a linguagem própria e imaginam ter entendido tudo. Como eles, o fiel (incluindo o teólogo) pode iludir-se, pensando que entende o bastante. Mas a revelação não anula o mistério: nesta vida, a pessoa sempre fica apontando para o inatingível.

Jesus respondeu: “Credes agora? Eis que vem a hora – e já chegou – em que vos dispersareis, cada um para seu lado, e me deixareis só. Mas eu não estou só; o Pai está comigo” (vv. 31-32).

Jesus os corrige, assinalando o futuro próximo. No nível da narração, os apóstolos não entenderam o mais elementar e próximo, a paixão.  Jesus tem que corrigir a fé incompleta dos apóstolos, como já fez com Pedro em 13,36-38. Mas também os leitores devem entender que crer não é uma operação puramente intelectual, mas visa à conduta. Não se trata apenas de entender o conteúdo, mas de aprová-lo através da sua vida, também em situação de perseguição e pressão. A dispersão dos apóstolos responde à profecia (Zc 13,7, citada pelos sinóticos).

“Chegar a hora”, esta expressão foi relacionada com o sofrimento de Jesus, que é ao mesmo tempo sua glorificação (cf. 2,4; 7,30; 8,20; 12,23.27; 13,1; 17,1). Aqui se refere à angustia e perseguição dos discípulos (cf. 16,2). “Vem a hora – e já chegou” expressa uma escatologia presente (cf. 5,25).

“Eu estou contigo”, esta expressão clássica de Deus confortando o ser humano tem valor supremo quando se diz que o Pai “está comigo” (cf. sua validade para o apóstolo em 2Tm 4,16-18). Em Mc 15,34 e Mt 27,46, Jesus morre aparentemente abandonado, gritando o Sl 22,2; em Lc 23,46 já com mais confiança no “Pai” e citando Sl 31,6; mas em Jo, se entrega sem grito e tranquilo após ter consumado sua obra (19,30). O Pai não o deixa só (cf. 8,29).

Disse-vos estas coisas para que tenhais paz em mim. No mundo, tereis tribulações. Mas, tende coragem! Eu venci o mundo!” (v. 33).

As “tribulações” no mundo (cf. 15,18-16,4a.20) que tiram a paz e dão medo são em primeiro nível (narração), a prisão e morte de Jesus que fazem os discípulos se dispersar. Em segundo nível, a tribulação é a separação dolorosa da sinagoga da qual os cristãos se sentem excluídos e perseguidos (cf. v. 2; 9,22; 12,42). Mas como o texto sempre há de explicar coisas judaicas, este processo também já está no passado. Em terceiro nível (redação eclesial), as tribulações são os conflitos internos da comunidade (p. ex. nas cartas 1-3Jo). Também neste nível, é preciso manter a fé e permanecer no amor.

O discurso termina com um grito antecipado de vitória: pode-se dar por realizado: “Eu sou tua vitória” (Sl 35,3). Com seu sacrifício por amor, Jesus vence o mundo e Satanás. Seus discípulos (os leitores) são chamados a participar da luta e da vitória. Os leitores já sabem da vitória de Jesus (vv. 8-11) e esperam em pouco tempo sua manifestação definitiva (vv. 16-23a). Sentir o ânimo que Jesus infunde já é ganhar uma batalha. “Fé e Coragem” diz o povo, e “Paz em Jesus”.

A primeira grande parte do discurso terminou com o anúncio da paz e da vitória sobre o (príncipe do) mundo (14,27-31). Agora o discurso inteiro está terminado, mas antes de sair da sala da ceia (cf. 14,31; 18,1), Jesus vai dirigir-se a seu Pai numa oração (cap. 17, cf. os evangelhos dos próximos dias).

 O site da CNBB comenta: Muitas vezes proclamamos com orgulho a nossa fé e procuramos vivê-la da melhor forma possível através da prática da caridade e da participação na vida comunitária. Mas seria um grande engano acreditarmos que estamos prontos para vencer todos os desafios que poderão ser propostos para a nossa fé. Os discípulos acreditaram em Jesus, no entanto fraquejaram diante da cruz. Nós devemos ter consciência que Jesus venceu o mundo, mas nós não o vencemos, e nem poderemos vencê-lo. A vitória sobre o mundo é obra de Jesus, temos que acreditar nisso e participar da sua obra para que, com ele, também nós sejamos vencedores.

Voltar