07 de Fevereiro de 2019, Quinta-feira: Então os doze partiram e pregaram que todos se convertessem. Expulsavam muitos demônios e curavam numerosos doentes, ungindo-os com óleo (vv. 12-13).

Leitura: Hb 12,18-19.21-24

Nesta leitura, o autor anônimo expõe a oposição entre a antiga e a nova aliança (já em 8,6-13; cf. Jr 31,31-34; 2Cor 3), entre a experiência do povo antigo no monte Sinai e a experiência nova dos cristãos.

Vós não vos aproximastes de uma realidade palpável: “fogo ardente e escuridão, trevas e tempestade, som da trombeta e voz poderosa”, que os ouvintes suplicaram não continuasse. Eles ficaram tão espantados com esse espetáculo, que Moisés disse: “Estou apavorado e com medo” (vv. 18-21).

O fogo é elemento clássico da divindade (vv. 18.29; Gn 15,17-18; Dt 4,24; Is 30,27.33; Sl 18,9; Sf 1,18; 2,2) e se junta aqui com as trevas (cf. Ex 20,21; Jl 2,2; f 1,15; Sl 1,8,10). O autor insiste na natureza terrestre dos fenômenos, “realidade palpável” no Sinai (Ex 19,16-19; 20,18-21; Dt 4,11). Nas religiões temos o fenômeno do sagrado, que se caracteriza por dois aspectos: o fascinante e o terrificante. No Sinai, era mais terrificante; até Moisés teve medo (Dt 9,19).

Mas vós vos aproximastes do monte Sião e da cidade do Deus vivo, a Jerusalém celeste; da reunião festiva de milhões de anjos; da assembleia dos primogênitos, cujos nomes estão escritos nos céus; de Deus, o Juiz de todos; dos espíritos dos justos, que chegaram à perfeição; de Jesus, mediador da nova aliança, e da aspersão do sangue mais eloquente que o de Abel (vv. 22-24).

Na iniciação cristã, porém, tudo é serene, celeste e espiritual (cf. Ef 2,6), mesmo passando pela cruz (aspecto terrificante). A “aproximação” de Deus (4,16; 10,22) não se realiza mais numa teofania ameaçadora como no monte Sinai (vv. 18-21), mas numa cidade construída por Deus (v. 22), aquela à qual os ancestrais aspiravam (Abraão e Sara em 11,11.16), a “Jerusalém celeste” (Ap 21,2.10-27). A cidade de Davi era sua prefiguração (Sl 48,9; 87,1.5; Is 28,16; 54,11) e o “monte Sião” onde foi construído o templo prefigura o santuário celeste (cf. 8,2; 9,11.24; Ap 14,1), lugar da “reunião festiva de milhões de anjos” (Dn 7,10) e da “assembleia dos primogênitos” (cf. Nm 3,12-13; Tg 1,18), “cujos nomes estão escritos nos céus “ (v. 23). Os livros do céu, onde estão escritos os nomes dos eleitos, são uma imagem clássica no gênero apocalíptico (cf. Dn 12,1; Ap 3,5; 13,8; 17,8; 20,12.15; 21,27).

Jesus é o “mediador da nova aliança” (cf. 7,22; 9,15; Lc 22,20; 2Cor 3,6), e da “aspersão do sangue” (cf. 9,19-20; Ex 24,8), “mais eloquente que o de Abel” (v. 24; cf. 11,4; Gn 4,10). Daí a advertência seguinte (omitida pela liturgia de hoje): “Atenção: não rejeiteis aquele que vos fala” (v. 25). O sangue da nova aliança (cf. 1Cor 11,25p) fala com maior autoridade que o de Abel e o do Sinai (Ex 24,1-8), quem profana este sangue e rejeita a palavra de Jesus arca com uma responsabilidade mais grave (cf. 10,28s).

O Deus do AT se apresenta em aspectos fascinantes e também terrificantes, o Deus do NT é o Deus do amor da graça. Se ele nos considera “amigos” e “filhos”, quanto mais é a responsabilidade nossa (cf. Rm 5,5-9; 8,14-17; Jo 1,17; 1Jo 4,8.16-18,15,12-15).

Evangelho: Mc 6,7-13

Vocação (chamado) e missão (envio) são dois momentos complementares (cf. Is 6; Jr 1,5-8.17; Ef 2-3; At 13,2-3). Assim o envio no evangelho de hoje é complemento da escolha dos doze (3,13-19).

Jesus chamou os doze, e começou a enviá-los dois a dois, dando-lhes poder sobre os espíritos impuros (v. 7).

Jesus chamou os doze e começou a “enviá-los”, daí o nome “apóstolos” que significa “enviados, missionários” (Mc usa este termo só em 6,30). Eles saem “dois a dois”, não só pela ajuda mútua (cf. Ecl 4,9-12: “melhor dois juntos que alguém sozinho”), mas também como testemunhas (cf. Dt 17,6; 19,15; Mt 18,16; 2Cor 13; 1Tm 5,19; Hb 10,28) do anúncio e também do julgamento (em caso de rejeição, v. 11). Vão ampliar e prolongar a atividade de Jesus, ou seja, pregar, curar e expulsar demônios (cf. 3,14-15).

Recomendou-lhes que não levassem nada para o caminho, a não ser um cajado; nem pão, nem sacola, nem dinheiro na cintura. Mandou que andassem de sandálias e que não levassem duas túnicas (vv. 8-9).

Os enviados (apóstolos) podem levar um “cajado”, bastão de andarilho (cf. Gn 32,11; nos textos paralelos, nem o cajado nem as sandálias, cf. Mt 10,10; Lc 9,3; 10,4), mas duas túnicas eram consideradas luxo. O estilo desses missionários é muito simples e radical, mas mantém sua validade hoje também. É preciso simplicidade, desapego, coerência material com a mensagem espiritual da fé (confiança em Deus). Vários santos se inspiraram nestas palavras (S. Francisco). Uma atualização interessante deste evangelho é o “Pacto das catacumbas” de vários bispos no final do Vaticano II, entre eles D. Helder Câmara.

E Jesus disse ainda: “Quando entrardes numa casa, ficai ali até vossa partida. Se em algum lugar não vos receberem, nem quiserem vos escutar, quando sairdes, sacudi a poeira dos pés, como testemunho contra eles!” (vv. 10-11).

Não devem levar dinheiro nem provisões de reserva, porque viverão da diária e da hospitalidade generosa das comunidades. Não devem abusar nem explorar casas, nem devem desprezar a hospitalidade (cf. Gn 18): “Quando entrardes numa casa, ficai ali até vossa partida” (v. 10). Faz sentido se pensar numa fundação de comunidade (cf. At 9,43; 12,12; 16,14-15.40; 18,1-3).

Mc passa da casa logo para o lugar, “se em algum lugar não vos receberem… sacudi a poeira dos pés como testemunho contra eles” (v. 11). Trata-se de uma ação simbólica que toma o pó como sinal (2Rs 5,17): nado do território ignorante e culpado se apegue aos apóstolos (At 13,51). A boa notícia (evangelho) se torna juízo e condenação para quem a rejeita.

Então os doze partiram e pregaram que todos se convertessem. Expulsavam muitos demônios e curavam numerosos doentes, ungindo-os com óleo (vv. 12-13).

Os apóstolos repetem a atividade inicial de Jesus no primeiro capítulo: pregam a conversão (cf. 1,14-15), expulsam demônios (cf. 1,21-27) e curam doentes (cf. 1,29-42) “ungindo-os com óleo” (v. 13).  A unção pode ser remédio terapêutico (cf. Lc 10,34; Is 1,6) e passa a ser símbolo (sacramento) de cura (Tg 5,14). O óleo simboliza a força (cf. a energia do petróleo) que falta aos doentes.

O site da CNBB resume: Quem é verdadeiramente discípulo de Jesus não deve pensar em si próprio, mas deve viver em função das outras pessoas, preocupar-se com os seus problemas e necessidades, ir ao encontro de todos para levar o Evangelho, a motivação para a conversão e a esperança de uma vida melhor. Nós fomos enviados por Jesus para realizar essa missão. Não devemos levar nada que seja para nós, além do que seja estritamente necessário, pois não devemos nos preocupar com o nosso bem estar, mas sim com o dos nossos irmãos e irmãs. Somente com este espírito é que podemos participar da obra evangelizadora de Cristo.

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