11 de Janeiro de 2019, Sexta-feira: Jesus estendeu a mão, tocou nele, e disse: “Eu quero, fica purificado.” E, imediatamente, a lepra o deixou (v. 13).

Leitura: 1Jo 5,5-13

Chegamos ao final da primeira carta de João. Mais tarde se acrescentou ainda um complemento (anexo vv. 14-21; leitura de amanhã) e as duas breves caras de 2Jo e 3Jo.

Depois da linha do crer, amar, cumprir (vv. 1-3) e da linha do amor (ao Pai, ao Filho de Deus, aos filhos de Deus, vv. 1-2), lemos agora o processo: o mundo se vence com fé (vv. 4-5), a fé se apóia no testemunho (vv. 6-11), o testemunho promete vida (vv. 11-13).

Quem é o vencedor do mundo, senão aquele que crê que Jesus é o Filho de Deus? (v. 5).

Já em v. 4, a fé foi declarada “a vitória que venceu o mundo” (cf. Jo 16,33). A fé é confiança e adesão a Deus que é maior do que mundo e maior do que o Maligno no mundo (cf. 2,14; 4,4; Mt 4,1-11; 12,31; 14,30; 16,33; 2Tm 3,12; Rm 8,37; Ap 2,7-11.14.26; 3,5.12.21; 12,11; 21,7).

Este é o que veio pela água e pelo sangue: Jesus Cristo. (Não veio somente com a água, mas com a água e o sangue). E o Espírito é que dá testemunho, porque o Espírito é a Verdade. Assim, são três que dão testemunho: o Espírito, a água e o sangue; e os três são unânimes (vv. 6-8).

Qual fé vence o mundo (cf. 4,1: “não acreditais em qualquer espírito, mas examinai”)? O autor da carta especifica a fé certa recordando o batismo de Jesus e sua morte na cruz (do seu lado aberto pela lança do soldado “saiu sangue e água”, Jo 19,34), escrevendo contra uma heresia (doutrina errada), que dissociava um Cristo glorioso e espiritual (que se revelou na água do rio Jordão e no Espírito) do homem Jesus, histórico, nascido na carne e sofrido no sangue da cruz (cf. 4,1-6; 2,18-22). Esta heresia chegou a afirmar que Cristo não sofreu, mas só estava parecendo para as pessoas (hoje, os muçulmanos acreditam assim, talvez seu profeta Maomé tenha conhecido o cristianismo através desta seita herética).

A fé que vence o mundo (a realidade sem Deus; os falsos profetas e os anticristos, cf. 4,1-6) não é uma espiritualidade desencarnada. É a fé em Deus que se encarnou em Jesus Cristo (Jo 1,14; cf. 1Cor 12,3). No batismo de Jesus, Deus declarou este homem “Filho de Deus” (Jo 1,32-34; cf. Mc 1,11p). O Espírito dá testemunho disso (em forma de pomba na hora do batismo, mas durante toda atividade de Jesus, porque “permaneceu” sobre ele (cf. Jo 1,33). Na cruz, Jesus entregou o seu Espírito, morreu de fato (não só pela aparência, mas confirmado pela lança do soldado) e do seu lado saiu “sangue e água” (Jo 19,30.34). Na sua ressurreição, mostrou suas chagas e deu o Espírito Santo aos apóstolos (evangelho de hoje), este mesmo Espírito que Jesus prometeu na última ceia chamando-o paráclito (defensor, advogado, consolador) ou “Espírito da Verdade”, porque dará continuidade com sua presença e obra (Jo 14,16s.26; 15,26; 16,7-15). “O Espirito é verdade”, como também o Pai é a verdade que Jesus releva e testemunha (Jo 8,32; 18,37). O próprio Jesus também é a verdade (Jo14,6; cf. 4,23), enquanto Pilatos (representante do mundo) não tem nem ideia da verdade (Jo 18,38). A verdade é divina e dá vida, a mentira é diabólica e tira a vida (cf. 4,1-6; Jo 8,44; Gn 3,1-5).

Não só o Espírito, o Pai também “dá testemunho” em favor de Jesus (vv. 9-10; Jo 5,32.37).  Enquanto o v. 6 fala do passado, o v. 7 apresenta um testemunho permanente na vida da igreja: o batismo (água) e a eucaristia (sangue), sobre ambos o Espírito é invocado na epiklese (oração de invocação) do sacramento. A Bíblia latina (Vulgata) a partir do século IV acrescenta entre os v. 7 e v. 8 o seguinte: “Três são os que dão testemunho no céu, o Pai, a Palavra e o Espírito, e os três estão de acordo;” certamente um reflexo do dogma da Trindade debatido neste século. As três testemunhas (segundo o princípio de Dt 19,15; Nm 35,30) dão um único testemunho, o de que Deus nos revela sua vida divina e a comunica (v. 11), na palavra e nos sacramentos.

Se aceitamos o testemunho dos homens, o testemunho de Deus é maior. Este é o testemunho de Deus, pois ele deu testemunho a respeito de seu Filho. Aquele que crê no Filho de Deus tem este testemunho dentro de si. Aquele que não crê em Deus faz dele um mentiroso, porque não crê no testemunho que Deus deu a respeito de seu Filho. E o testemunho é este: Deus nos deu a vida eterna, e esta vida está em seu Filho. Quem tem o Filho, tem a vida; quem não tem o Filho, não tem a vida (vv. 9-12).

Cabe ao homem aceitar testemunho tal solene e fidedigno: o testemunho de Deus Pai (cf. Jo 5,32.36; 8,14-18; 10,37) a favor de seu Filho é também em nosso favor, porque afirma que no Filho temos a “vida eterna” (cf. 1,2; 2,25; 3,14s; 5,11.13.20; Jo 6,40.47.54; 17,2s; cf. 1Jo 2,17).

Eu vos escrevo estas coisas a vós que acreditastes no nome do Filho de Deus, para que saibais que possuís a vida eterna (v. 13).

O v. 13 recapitula o motivo fundamental da carta: restituir aos cristãos, perturbados pelos hereges, a plena consciência das riquezas da sua fé. Os. vv. 11-13 se parecem com o primeiro final do evangelho (Jo 20,31; o cap. 21 é acréscimo). De fato, a carta terminou aqui, antes de se ter acrescentado outro final (vv. 14-21; leitura de amanhã).

 

Evangelho Lc 5,12-16

No evangelho de ontem, Jesus declarou de ser o messias da libertação de quem falou a profecia de Is 61,1. Hoje Jesus atua como tal quando um leproso aproximou dele.

Aconteceu que Jesus estava numa cidade, e havia aí um homem leproso (v. 12a).

A lepra era a doença mais temida e não havia cura. Hoje a mesma doença se chama “hanseníase” segundo o médico Hansen que descobriu sua causa e sua cura. Hanseníase é uma infecção de nervos transmitida pela respiração afetando a pele e os membros do corpo.

Na época de Jesus, um leproso sofria o mesmo preconceito do que hoje um soropositivo de HIV (vírus que causa a aids), ou seja, a doença era considerada como castigo de Deus (cf. Nm 12,10-15). Os sacerdotes examinavam e, se a doença foi confirmada, o declararam impuro e excluído do culto e de qualquer convívio (cf. Lv 13). Os leprosos tinham que viver fora dos povoados e alertar as pessoas que se porventura aproximassem deles. Devido à gravidade da doença, um leproso era considerado como praticamente morto (cf. Sl 88).

Em todo Antigo Testamento (AT), só duas curas de lepra são apresentadas: Miriam (em grego: Maria) foi curada pela intercessão do seu irmão Moisés (Nm 12,10-15; outro irmão, Aarão foi poupado da lepra por ser sumo sacerdote, impensável ele ser cometido por essa impureza). Outro leproso foi curado pelo profeta Eliseu, era o estrangeiro Naamã da Síria (2Rs 5,1-15; Jesus falou dele em Lc 4,27).

Vendo Jesus, o homem caiu a seus pés, e pediu: “Senhor, se queres, tu tens o poder de me purificar” (v. 12b).

Como a cura era considerada quase impossível e só a Moises e Eliseu foi dado este poder excepcional (cf. 2Rs 5,7: só Deus pode curar os leprosos), o leproso que se aproximou e “caiu aos pés” de Jesus, fez uma verdadeira profissão de fé: “Senhor, se queres, tens o poder de me purificar” (v. 12).

Jesus estendeu a mão, tocou nele, e disse: “Eu quero, fica purificado.” E, imediatamente, a lepra o deixou (v. 13).

Comparando a ação de Jesus com as curas mais complicadas de 2Rs 5 e Nm 12,10-15, pode-se afirmar, que Jesus é mais do que Moises e Eliseu, porque simplesmente “estendeu a mão, tocou nele e disse: Eu quero, fica purificado” (v. 13). Moisés e Eliseu não tocaram na pessoa doente para não se contaminarem nem ficarem impuros com este gesto. Mas a palavra de Jesus cura e seu gesto purifica (cf. At 10,14s).

E Jesus recomendou-lhe: “Não digas nada a ninguém. Vai mostrar-te ao sacerdote e oferece pela purificação o prescrito por Moisés como prova de tua cura” (v. 14).

Jesus cura com o poder de Deus e ainda cumpre as leis. Por isso envia o curado para os sacerdotes, porque estes deverão constatar a cura e reintegrar o excluído na comunidade do povo de Deus (cf. Lv 14,1-32). A ordem de não divulgar a cura se deve ao evangelista mais velho, Mc de quem Lc copiou (cf. Mc 1,40-45p). Para Mc, a identidade do messias é um segredo que se revela só aos poucos e será compreendido plenamente na cruz e ressurreição.

Não obstante, sua fama ia crescendo, e numerosas multidões acorriam para ouvi-lo e serem curadas de suas enfermidades. Ele, porém, se retirava para lugares solitários e se entregava à oração (v. 15-16).

Lc copiou esta cura fielmente do Evangelho mais antigo de Mc 1,40-45, inclusive com o segredo do messias que proíbe de divulgar suas curas (v. 14; Mc 1,44). Mas em Mc 1,45, o próprio curado não conseguiu ficar calado e começou divulgar a notícia. Lc diz isso apenas indiretamente, porque “a fama (de Jesus) ia crescendo” (cf. 4,14.37 etc.). Como fez em outras ocasiões, Lc acrescenta a “oração” de Jesus, (v. 16; cf. 3,21; 6,12; 9,18.28-29; 10,21; 11,1; 22,32.40-46; 23,34.46). Nós também podemos rezar, invocar com fé o poder de Jesus que purifica, liberta, cura, restaura e ressuscita  (cf. o pobre Lazaro em Lc 16,19-31 e Jo 11,1-44).

O site da CNBB resume: Uma das características fundamentais do evangelho de São Lucas é a apresentação da dimensão orante de Cristo. Muitas vezes, vemos que Jesus se afasta da multidão e procura lugares solitários com a finalidade de entregar-se à oração. Mas a oração de Jesus não é uma fuga da realidade ou um afastamento dos sofrimentos das pessoas. O encontro amoroso de Jesus com o Pai está sempre relacionado com o encontro amoroso que ele tem com as outras pessoas, principalmente com os que sofrem, como nos mostra o evangelho de hoje, que antes do seu encontro com Deus, ele se encontra com o leproso e o cura para que, cumprindo as exigências da lei, ele possa ser reintegrado na sociedade.

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