17 de dezembro de 2017 – Advento 3º Domingo Ano B

1ª Leitura: Is 61,1-2a.10-11

O 3º Domingo do Advento é de alegria (cor litúrgica opcional: rósea). A 1ª leitura expressa isso no v. 10: “Exulto de alegria no Senhor e minh’alma regozija-se em meu Deus”, ao qual corresponde o salmo responsorial tirado do canto de Maria (Magnificat): “A minha alma engrandece o Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador” (Lc 1,46s).

O profeta (ou grupo profético), chamado Terceiro Isaías (caps. 56-66), escreve em Jerusalém no pós-exílio, depois da reconstrução do templo (concluído em 515 a.C.) e antes da reconstrução das muralhas (445 a.C.; cf. 60,10). Diante da exploração econômica e escravidão, o profeta anuncia a esperança e certeza da intervenção do Senhor para inverter a realidade. Atualiza a promessas do Segundo Isaías (caps. 40-55), mantendo um universalismo na contramão das reformas nacionalistas de Esdras e Neemias. Proclama uma cidade aberta e a romaria das nações (cap. 60, cf. Is 2,1-5)

A Bíblia de Jerusalém (p. 1462) comenta: O profeta, muito provavelmente autor dos caps. 60 e 62, anuncia que recebeu de Deus uma mensagem de consolação (vv. 1-3): reconstruir-se-á (v. 4); os estrangeiros assegurarão as necessidades materiais de Israel, transformado em povo de sacerdotes e cumulado de glória (vv. 5-7); Deus toma a palavra para estabelecer uma aliança eterna (vv. 8-9). Os vv. 10-11 são uma ação de graças do profeta que fala em nome de Sião. Este poema repercute os cânticos do Servo (cf. 42,1; 42,7; 49,9, e também 50,4-11, onde quem fala é o Servo, como aqui).

Na sinagoga de Nazaré, Jesus lê os vv. 1-2a e aplica a si mesmo como messias (Lc 4,16-21). Nossa liturgia de hoje omite os vv. 2b-9 e finaliza com a ação de graças (vv. 10-11)

O Espírito do Senhor Deus está sobre mim, porque o Senhor me ungiu; enviou-me para dar a boa-nova aos humildes, curar as feridas da alma, pregar a redenção para os cativos e a liberdade para os que estão presos; para proclamar o tempo da graça do Senhor (vv. 1-2a).

Depois do cap. 60 sobre a glória de Jerusalém (cap. 60, cf. 1ª leitura da Epifania), o cap. 61 põe-se em cena em primeiro lugar o arauto de Deus. Quem é aquele ungido pelo Espirito e enviado para dar a boa-nova aos humildes? “Ungido”, em hebraico é o “messias”, em grego, o “Cristo”).

No Antigo Testamento (AT) foram ungidos os reis, recebendo o Espírito de Deus para julgar e governar com justiça (1Sm 10,1; 16,3; 1Rs 1,39; 19,15s; 2Rs 9,6; 11,12; cf. Sl 2,7); também os sacerdotes foram ungidos na sua consagração (Ex 30,30; 40,12-15; Lv 7,36; 10,7; Nm 3,3). Caso único é a unção de profeta (Eliseu: 1Rs 19,16).

No Primeiro Isaías “o Espirito do Senhor repousará” sobre um descendente de Davi (rei-messias) para julgar e trazer a paz pela sua palavra (11,1-9). O Segundo Isaías não fala mais de um rei descendente de Davi (decepção sobre a dinastia que se corrompeu?), mas chama o rei persa Ciro de “ungido” (45,1) por ser instrumento de Javé Deus, porque deixará os exilados voltar a sua pátria. O Segundo Isaías apresenta um “servo” com o Espírito do Senhor para promover o direito entre as nações sem violência (em Is 53 sofrerá e morrerá pela culpa do povo); também o povo eleito (Israel-Jacó) é chamado servo em 41,8; 43,10.20; 44,1.2; 45,4. Em 40,9, um arauto anuncia a “Boa Nova” (grego: Evangelho) do fim da servidão no exílio. Para o Terceiro Isaías, a volta do exílio já realidade, esta promessa se cumpriu, mas a opressão continua na própria terra. Então o Senhor Deus envia um ungido (o próprio profeta, o messias?) para mudar a situação.

“Espírito” ou sopro/vento (em hebraico rúah), associado ao nome do Senhor (Yhwh), significa sopro vital ou força criadora (cf. Gn 1,2; Sl 104,30). A Tradução Ecumênica da Bíblia (p. 697s) comenta: As semelhanças verbais entre 42,1.7 e 61,1 convidam a aproximar este último texto dos que apresentam o Servo e os servos do Senhor. Observa-se, contudo, que, em 42, o Servo tinha missão para Israel e para as nações. Aqui, o enviado de Deus (e que não é denominado servo) tem de ocupar-se primeiramente com os enlutados de Sião … A libertação dos oprimidos é apresentada como o “ano sabático” ou como o “ano jubilar”, em que acontecia a libertação dos escravos, seja ao cabo de quarenta e nove anos (Lv 25,10; Ez 46,17).

“O tempo (lit. ano) da graça do Senhor” fazia parte das antigas leis do povo de Israel com o objetivo de perdoar as dívidas e garantir a sobrevivência da clã e da tribo, especialmente das pessoas empobrecidas (cf. Dt 15,2). Daí a tradição cristã dos anos jubilares (cada 50 anos, depois cada 25 para cada geração poder participar).

Exulto de alegria no Senhor e minh’alma regozija-se em meu Deus; ele me vestiu com as vestes da salvação, envolveu-me com o manto da justiça e adornou-me como um noivo com sua coroa, ou uma noiva com suas joias. Assim como a terra faz brotar a planta e o jardim faz germinar a semente, assim o Senhor Deus fará germinar a justiça e a sua glória diante de todas as nações (vv. 10-11).

Depois de se dirigir aos habitantes de Jerusalém na segunda pessoa do plural, prometendo-lhes uma reviravolta espetacular da sua situação, anunciando-lhes a reconstrução das ruinas, prosperidade e alegria eterna (vv. 2b-9 omitidos), o profeta responde em nome da comunidade com um hino de louvor (vv. 10-11). Os verbos hebraicos podem ser lidos tanto no feminino (tradução e comentário aramaico, que ouve aqui falar Jerusalém, cf. “Sião” no v. 3), como no masculino (voz do profeta). A alegria se expressa semelhante nos cânticos de Ana (1Sm 2,1) e de Maria (Lc 1,46s).

A tradução da nossa liturgia simplificou: “Como um noivo com sua coroa”. Outros traduzem: “que se adorna (yakin, conj.) com seu diadema”; lit. “se comporta como sacerdote (yekahen, hebr.) (com) turbante esplendido”: a mesma palavra de v. 3 designa um turbante de cerimônia, seja para homens (Ez 24,17,23), seja para mulheres (Is 3,20), seja para sacerdotes (Ex 39,28; Ez 44,18). Jerusalém como (vestes de) noiva, cf. Ap 19,7s; 21,2.

“O Senhor Deus germinar a justiça e a sua glória”, cf. 45,8.

2ª Leitura: 1Ts 5,16-24

A 2ª leitura de hoje é tirada bem do final desta carta, a mais antiga de Paulo e de todo Novo Testamento (NT). A Nova Bíblia Pastoral (p. 1449) comenta o conjunto dos vv. 12-22: Diversas recomendações. Primeira palavra: consideração e amor para com as lideranças da comunidade na difícil tarefa de animação. Em seguida: viver em paz e ordem, trabalhando com as próprias mãos (4,11). Depois, lembrando o que dizia Jesus: não pagar o mal com o mal (Mt 5,38-42; Rm 12,17). E mais: que o cristão seja sempre alegre, e que a oração seja atitude constante na vida pessoal e comunitária. Conclui com três alertas: não apagar o Espírito, não desprezar as profecias, examinar tudo e ficar com o que é bom.

 (Irmãos:) Estai sempre alegres! Rezai sem cessar. Dai graças em todas as circunstâncias, porque esta é a vosso respeito a vontade de Deus em Jesus Cristo (vv. 16-18).

A introdução costumeira “Irmãos” está nos vv. 12 e 14, reforçando o apela da exortação. As primeiras palavras da leitura de hoje correspondem ao tema da alegria e deram o nome ao 3º Domingo do Advento: Gaudete, tradução latim de “Alegrai-vos”.

A Bíblia do Peregrino (p. 2841) comenta o conjunto dos vv.: Alegria: em contexto escatológico, Is 25,9; 65,13; 66,10; Sf 3,14; em contexto cultual, Sl 118,24; Jl 2,23. Se tomamos o verbo no sentido cultual de “festejar”, poderíamos colocar na mesma esfera o orar, o dar graças, o profetizar.

O breve conselho para rezar “sem cessar” exerceu grande influência na espiritualidade cristã (cf. 1,2; 2,13; 4,2; 2Ts 1,11; 1Tm 2,8; 5,5; 2Tm 1,3, etc.): a “Liturgia da horas” rezado pelos padres e religiosos (hoje também por leigos); o rosário (150 Ave Marias em vez de 150 salmos; um terço, 50). Na espiritualidade ortodoxa, o livro “Relatos de um peregrino russo” busca em forma de narração “como orar sem cessar?”, explicando a tradição milenar do “Terço bizantino” (chamado também “oração do coração” ou “oração do nome de Jesus”).

Não apagueis o espírito! Não desprezeis as profecias, mas examinai tudo e guardai o que for bom. Afastai-vos de toda espécie de maldade! (vv. 19-22).

O Espírito é dom de Deus, infundido à comunidade (4,8; At 2,16s.33.38) e derramado no coração de todo cristão (Rm 5,5). É uma característica do tempo messiânico (Ez 36,27; 37,14). O discernimento do que ele inspira é um dom do próprio Espírito (1Cor 12,10; 14,29; 1Jo 4,1; cf. 2Ts 2,2; 1Cor 12,1ss). Reconhecer e praticar o bem como evitar o mal é princípio de toda moral.

“Não desprezeis as profecias”; não se trata das profecias do Antigo Testamento (AT), mas das intervenções e exortações dos profetas cristãos nas comunidades (cf. 1Cor 12,10.29; 13,2; 14,3; At 11,27; 13,1; 15,32; 21,9s; Ap 1,3; 2,7; 10,11; 19,10; 22,7-10.18s). Na hierarquia dos carismas, estes profetas vem normalmente em segundo lugar, depois dos apóstolos (1Cor 12,28s; Ef 4,11; cf. Rm 12,6; 1Cor 12,10; Lc 11,49; Mt 23,34).

A Tradução Ecumênica da Bíblia (p. 2312) comenta: Nas igrejas gregas, as manifestações espirituais – profetizar, falar línguas desconhecidas etc. -, tinham-se espalhado com um profusão e consequências que chamaram a atenção de Paulo (cf. 1Cor 12-14). Aqui já se encontra um esboço das regras que Paulo dará à Igreja de Corinto, em vista de uma atitude verdadeiramente positiva da comunidade cristã antes das manifestações do Espírito. É preciso respeitar esses dons, mas eles não são a totalidade do cristianismo. É preciso muito mais praticar o “discernimento dos espíritos” para distinguir o bom do inútil.

“Examinai tudo e guardai o que for bom”. A Bíblia de Jerusalém (p. 2222) comenta: Princípio importante para a moral paulina (cf. Rm 8,6ss; 12,1-3; Cl 3,8). O “discernimento” é o ato central da vida moral. Sua perspectiva, condições e conteúdo são apresentados resumidamente em Fl 1,9-11; é ato uno, complexo e comunitário, exercido numa situação concreta e no encontro com o outro, visando à edificação dos irmãos.

Que o próprio Deus da paz vos santifique totalmente, e que tudo aquilo que sois – espírito, alma, corpo – seja conservado sem mancha alguma para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo! Aquele que vos chamou é fiel; ele mesmo realizará isso.

Começa a saudação final com o voto da paz e santidade A Nova Bíblia Pastoral (p. 1449) comenta: A saudação final invoca o compromisso cristão para a santidade. Lembra a integridade do ser humano: espírito, alma e corpo. Trilogia que significa a pessoa concreta e plena do Espirito de Deus.

A cultura grega dividiu o ser humano em “corpo, alma e espirito”; aqui serve para afirmar a extensão total da consagração. A Tradução Ecumênica da Bíblia (p. 2312) comenta: Esta divisão da pessoa humana em três elementos seria a da filosofia grega. Ela não é habitual em Paulo, e este v., assim compreendido, seria um texto completamente isolado no NT. Para evitar tal dificuldade, outros compreenderam o primeiro termo da enumeração, vosso espírito, como equivalente de “vós mesmos”; então eles traduzem: “que toda a vossa pessoa, alma e corpo” … recuperando assim o conceito que o judaísmo e Paulo tinham da pessoa humana. Nós traduzimos a frase de modo a pôr em evidência uma simples enumeração de termos que, um com o outro, podem designar, em Paulo, o homem todo inteiro, quer se trate de “pneuma”, de “psykhe” ou de “sôma”. Destarte, não é necessário recorrer a uma explicação tomada de antropologia grega de três elementos, que aliás nunca se exprime com esses três termos.

A Bíblia de Jerusalém (p. 2222) comenta: Esta divisão tripartida do homem (espírito, alma, corpo) só aparece aqui, nas cartas de Paulo. Aliás, Paulo não tem uma “antropologia” sistemática e perfeitamente coerente. Além do corpo (Rm 7,24+) e da alma (1Cor 15,44+), vemos aparecer aqui o espirito, que pode ser o princípio divino, a vida nova em Cristo (Rm 5,5+), ou a parte mais elevada do ser humano aberta à influência do Espírito (Rm 1,9 +). A ênfase é colocada na totalidade dos efeitos da ação santificadora de Deus (3,13;4,3+), efeito da sua finalidade. – Paulo considera o homem em sua situação histórica e existencial: o homem é criatura de Deus, e se compreende como um dos termos de uma relação, da qual o outro termo é Deus. Cristo revela e comunica o verdadeiro sentido da existência humana, compreendida como a nova criatura, a homem novo, ou o ser em Cristo ou com Cristo. A existência humana é determinada ou pela “carne” (Rm 7,14s) , ou pelo “Espírito” (cf. 2Cor 5,16; Gl 5,19s).

“Aquele que vos chamou é fiel; ele mesmo realizará isso”. Ser santo é difícil (cf. Lv 19,2; Mt 5,48), conservar-se em toda parte “sem mancha alguma para a vinda de nosso Senhor Jesus” é difícil. Temos que confiar na graça de Deus mais do que na lei e nas obras (nossos próprios esforços). Ele nos chamou e completará sua obra (Rm 8,26-30). “É fiel” (cf. Dt 7,9; 1Rs 8,26; Is 49,7). “O Senhor me completará seus favores … não abandones a obra de tuas mãos” (Sl 138,8). Depois de falar sobre os bispos, padres, diáconos e fiéis leigos, o Concílio Vaticano II fala da vocação universal à santidade (LG 39-42).

Evangelho: Jo 1,6-8.19-28

No evangelho continuamos com a pessoa de João Batista. No domingo passado ouvimos no evangelho de Mc, como ele preparou o caminho do Senhor no deserto (Mc 1,1-8). Como Mc é o evangelho mais curto, nossa liturgia acrescenta trechos do quarto evangelho no Ano B. Mc é o evangelho mais velho (escrito por volta de 70 d.C.), Jo o mais novo (entre 90 e 100 d.C.).

Igual a Mc, o evangelho de João não narra nada sobre a infância de Jesus (só Mt 1-2 e Lc 1-2), porém, inicia com um prólogo poético (1,1-18): um hino sobre a preexistência e encarnação do Verbo (cf. evangelho dos dias 25 de 31 de dezembro), no qual apenas menciona “João” nos vv. 6-8.15. Depois, igual a Marcos, Jo começa sua narração com as palavras de João Batista (vv. 19-28; cf. Mc 1,1-8).

Surgiu um homem enviado por Deus; Seu nome era João. Ele veio como testemunha, para dar testemunho da luz, para que todos chegassem à fé por meio dele. Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz: (vv. 6-8).

No hino do prólogo sobre o Verbo de Deus, os vv. 6-7 são uma parêntese sobre a missão de João Batista. É um “homem enviado por Deus”, não é chamado profeta, mas testemunha.

Historicamente João é o precursor de Jesus. Será personagem importante na primeira parte do evangelho. Como uma sentinela que aguarda a aurora para gritar que é dia (Sl 130,s; Jr 31,6), assim João anuncia, como “testemunha”, a chegada da luz. O símbolo da luz domina esse evangelho, junto com a da vida (cf. vv. 4-5; 3,19-21; 8,12; cap. 9; 11,9s; 12,35s.46).

Outra parêntese no hino é o v. 15 (omitido pela nossa liturgia): “Dele, João dá testemunho, clamando: ‘Este é aquele de quem eu disse: O que vem depois de mim passou à minha frente, porque ele existia antes de mim’”. Neste, Jo transforma a frase tradicional do Batista nos evangelhos sinóticos (Mt 3,11; Mc 1,7; Lc etc.) sobre “aquele que vem depois de mim” numa afirmação da pré-existência porque “ele existia antes de mim”. Um personagem não apresentado (“aquele”) e uma citação ainda não aparecida mostram esse versículo é inserção de engate. A identificação virá em 1,30. Afirma a precedência cronológica e autoridade do Logos (cf. 3,27-36). Ou seja, o testemunho do Batista (“antes de mim”) coincide com o ensinamento do evangelista, este, porém, remontou ao “princípio” de criação (v. 1).

Este foi o testemunho de João, quando os judeus enviaram de Jerusalém sacerdotes e levitas para perguntar: “Quem és tu?” (v. 19).

O Batista era muito popular. Ainda no tempo da redação do evangelho (cerca de 90 d.C.) havia grupos que consideravam João o messias (cf. At 19,1-7). Contra essa concorrência espiritual, o evangelista não o chama de “profeta” (Mt 11,9; Lc 7,26; Mc 11,32), mas de “testemunha” (cf. vv. 6-8.15.32.34). Diante de oficiais autorizados, seu testemunho é qualificado. Aqui “os judeus” enviam da capital de Jerusalém “sacerdotes e levitas” (cf. Lc 10,30-32), responsáveis pelos rituais no templo. O interrogatório procede por exclusão até a afirmação.

Em Jo, o termo “os judeus” designa às vezes os membros deste povo (3,25; 4,9.22 etc.), mas na maioria dos casos são representantes do mundo que é incompreensível e hostil, particularmente as autoridades constituídas (2,18; 5,10-18; 7,1.13; 9,22; 18,12; 19,38; 20,19) que na época da redação do evangelho excomungavam os cristãos da sinagoga (no sínodo judaico de Jâmnia em 90 d.C.; cf. 9,22). Contra o antissemitismo (que culminou no genocídio pelos alemães nazistas no séc. 20), o Concílio Vaticano II declarou que o sofrimento de Jesus “não pode ser imputado indistintamente a todos os judeus que viviam então nem aos de hoje … como se isso decorresse das Sagradas Escrituras” (NA 4; cf. CIC 597). Os verdadeiros culpados da morte de Jesus, porém, são os pecadores de então e de hoje, nós inclusive (1Cor 15,3; cf. CIC 598)!

João confessou e não negou. Confessou: “Eu não sou o Messias” (v. 20).

João não é o messias esperado como descendente legítimo de Davi (Jr 23,5; 33,15; Zc 6,12 etc.). Ele é levita, filho de um sacerdote (Zacarias) e uma descendente de Aarão (Isabel, cf. Lc 1,5).

Eles perguntaram: “Quem és, então? És tu Elias?” João respondeu: “Não sou” (v. 21a).

A segunda pergunta rebaixa: Elias devia voltar como precursor do messias para uma última exortação penitencial às vésperas da chegada do messias e do juízo final (cf. Ml 3,23; Eclo 48,10-11; Mt 11,14; 17,10; Lc 1,17). Mas João vivia e se vestia igual a Elias (Mt 3,4; Mc 1,6; 2Rs 1,8), não porque era a mesma pessoa (os adeptos do espiritismo consideram João uma reencarnação de Elias, mas Elias não desencarnou, foi arrebatado, cf. 2Rs 2,11s), mas assumiu o papel de Elias anunciar a vinda do messias.

Eles perguntaram: “És o Profeta?” Ele respondeu: “Não” (v. 21b).

A terceira pergunta se refere ao “Profeta”, sucessor de Moisés (“um profeta como eu”, Dt 18,15) que renovaria os prodígios do êxodo (cf. Jo 3,14; 6,14.30-31.58; 7,40.52; 13,1; At 3,22-23; 7,20-44; Hb 3,1-11; cf. ainda Mc 8,28).

Perguntaram então: “Quem és, afinal? Temos que levar uma resposta para aqueles que nos enviaram. O que dizes de ti mesmo?” João declarou: “Eu sou a voz que grita no deserto: Aplainai o caminho do Senhor – conforme disse o profeta Isaías” (vv. 22-23).

A quarta pergunta pede uma identificação pessoal. Como nos outros evangelistas, João (aqui o próprio Batista) cita o profeta do desterro: Is 40,3 diz o caminho de Javé (“Senhor”) na volta do exílio, mas Jo pensa no Messias cujo caminho o Batista prepara. O quarto evangelho não apresenta João Batista como grande pregador da conversão dos pecados, mas apenas como testemunha qualificada.

Ora, os que tinham sido enviados pertenciam aos fariseus e perguntaram: “Por que então andas batizando, se não és o Messias, nem Elias, nem o Profeta?” (vv. 24-25).

Aqui o v. 24 pode ser traduzido também: “A delegação incluía fariseus.” A pergunta dos fariseus supõe que batizar é uma ação transcendente que se deve justificar.

Os “sacerdotes e levitas” (v. 19) pertenciam ao partido dos “saduceus”, mas depois da destruição do templo em 70 d.C. não havia mais serviço para eles. Sobraram apenas os “fariseus” (que comandavam as sinagogas) como liderança do judaísmo e, portanto, como adversários dos cristãos (que batizavam, em vez de praticar a circuncisão e outros sacrifícios da Lei). Assim nos evangelhos, os fariseus foram descritos negativamente (cf. Mt 23), embora Jesus durante sua vida na terra tivesse mais afinidade com os fariseus do que com os saduceus (cf. Mc 12,18; At 23,6-10).

João respondeu: “Eu batizo com água; mas no meio de vós está aquele que vós não conheceis, e que vem depois de mim. Eu não mereço desamarrar a correia de suas sandálias” (v. 26-27).

Em todos os evangelhos, o Batista responde que batiza só com água e não é digno de desamarrar as sandálias daquele quem vem depois dele (vv. 26-27; cf. Mc 1,7-8p). Mas no quarto evangelho acrescenta: “No meio de vós está aquele que vós não conheceis”. Num outro contexto, Jesus está entre os pobres necessitados e não é reconhecido (juízo final de Mt 25,31-46; cf. o canto “Seu nome é Jesus Cristo e passa fome … Entre nós está e não o conhecemos”)

Isso aconteceu em Betânia além do Jordão, onde João estava batizando (v. 28).

A cena acontece em Betânia na margem esquerda do Jordão, cuja localização é incerta. Outra aldeia do mesmo nome está perto de Jerusalém. Lá Jesus realizará seu maior sinal (milagre), ressuscitando Lázaro (Jo 11). Paulo relacionou o batismo com a ressurreição (Rm 6,3-11). Os profetas Elias e Eliseu também ressuscitaram mortos (1Rs 17; 2Rs 4). João Batista, porém, não fez nenhum milagre nem transmitiu o Espírito, no entanto Jesus o declarou “o maior entre os nascidos de uma mulher” (Mt 11,11; Lc 7,28).

O site do CNBB comenta: Sempre que vemos uma pessoa fazendo o bem, corremos o risco de buscar saber se é legitimo a pessoa fazer aquele bem quando, na verdade, deveríamos usufruir daquele bem e procurar descobrir o amor de Deus que se torna manifesto em tudo o que de bom acontece nas nossas vidas. É esse o caso do evangelho de hoje. Os fariseus não querem usufruir do bem que Deus lhes concede por meio de João Batista, mas enviam sacerdotes e levitas para averiguar se o que João está fazendo é certo ou errado e se ele tinha autoridade para fazer o bem.

 

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