18 de abril de 2017 – Terça-feira, Páscoa 1ª semana

Leitura: At 2,36-41

Ouvimos a conclusão da pregação de Pedro no dia de Pentecostes e sua reação no público dos peregrinos.

(No dia de Pentecostes, Pedro disse aos judeus:) “Que todo o povo de Israel reconheça com plena certeza: Deus constituiu Senhor e Cristo a este Jesus que vós crucificastes” (v. 36).

Pedro conclui sua destemida pregação com uma frase que tem um impacto muito profundo (quase cai como uma bomba): “Deus constituiu Senhor e Cristo a este Jesus que vós crucificastes” (v. 36). Imagine que mataram o próprio Deus, não só um homem da Galileia. Com a palavra “Senhor” traduziu-se o nome santo de Deus Yhwh (Javé), é “o Nome que é sobre todo o nome… Jesus Cristo é o Senhor” (Fl 2,9-11; cf. Is 45,23; Jo 20,18; Rm 10,9; 1Cor 12,3; Cl 2,6; Ap 19,16). Jesus não era um impostor, um falso profeta como as autoridades acharam e o condenaram (cf. Dt 13; Mc 14,64-65), mas o Filho de Deus, o Messias (Cristo, o Rei ungido).

Quando ouviram isso, eles ficaram com o coração aflito, e perguntaram a Pedro e aos outros apóstolos: “Irmãos, o que devemos fazer?” (v. 37).

Os judeus peregrinos “ficaram com o coração aflito” e dirigem a Pedro e “aos outros apóstolos” (Lc gosta de incluir mais apóstolos e discípulas, cf. Lc 8,10; 24,9s) a mesma pergunta que povo já fazia a João Batista: “O que devemos fazer?” (Lc 3,10.12.14), usando o tratamento familiar “irmãos” (cf. v. 29). Diante da ressurreição, se deram conta da injustiça cometida na condenação e na morte de Jesus. Muitos ficaram profundamente arrependidos.

Pedro respondeu: “Convertei-vos e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para o perdão dos vossos pecados. E vós recebereis o dom do Espírito Santo. Pois a promessa é para vós e vossos filhos, e para todos aqueles que estão longe, todos aqueles que o Senhor nosso Deus chamar para si” (vv. 38-39).

Como João Batista e Jesus (Mt 3,1; 4,17p), Pedro chama “Convertei-vos” (cf. 3,19; 8,22; 17,30; 26,20) e oferece o batismo como remédio “para o perdão dos vossos pecados” (cf. Lc 3,3; Mt 26,28). Mas o batismo não é igual ao do Batista (cf. Lc 3,16; At 1,5; 19,1-6), agora é “em nome de Jesus Cristo” (cf. v. 21 e Lc 24,47; At 4,18; 5,28.40; 8,16; 10,48; 19,5) quer dizer professando a fé que Jesus é o Messias, o Cristo, o Senhor, cf. Rm 10,9-13) e ainda receberão o “dom” do Espírito Santo (cf. 10,45; também 8,20; 11,17). Como Pedro fala, arrependimento (conversão) e batismo são a condição para receber o Espírito. Esta é a regra comum entre os cristãos; só em casos especiais, batismo e recebimento do Espírito podem estar não conjugados (8,16; 10,44; 19,2-6).

Na profecia de Joel da qual Pedro citava (cf. vv. 6-21), a promessa de receber o Espírito era somente para os ouvintes judeus (Jo 3,5b; “no Monte Sião haverá salvação”). Agora, o alcance se amplia imensamente: “Pois a promessa é para vós e para vossos filhos, e para todos aqueles que estão longe, todos aqueles que o Senhor chamou para si” (v. 39). Os dons da páscoa chegam às futuras gerações e aos outros povos (pagãos), até nós e chegarão aos nossos filhos e netos que virão depois. Cristo ultrapassa os tempos e os lugares. Como Jesus chamou os apóstolos entre os judeus, agora chama pela Igreja os pagãos, “aqueles que estão longe” (cf. 22,21; Eclo 24,32; Mc 8,3; Ef 2,17). Os apóstolos serão as testemunhas de Jesus “até os confins da terra” (1,8). A iniciativa é de Deus: a promessa é para “todos”, mas só para “todos aqueles” que o “Deus, nosso Senhor” (cf. Lc 1,68) chama.

Com muitas outras palavras, Pedro lhes dava testemunho, e os exortava, dizendo: “Salvai-vos dessa gente corrompida!” Os que aceitaram as palavras de Pedro receberam o batismo. Naquele dia, mais ou menos três mil pessoas, se uniram a eles (vv. 40-41).

Uma noticia sumária (cf. Lc 3,18) entende o discurso de Pedro em Pentecostes como “testemunho” (cf. 8,25; 10,42; 18,5; 20,21.23s; 23,11; 28,23). A exortação resumida pede repetidamente aos ouvintes de se “salvar” (cf. v. 21 citando Jl 3,5a) “dessa gente corrompida” (cf. Dt 32,5; Sl 78,8; Fl 2,15), desta geração que acabou crucificar seu messias.

“Aceitar a palavra” dos missionários (cf. Lc 8,13; At 11,1; 17,11) é condição para receber o batismo. Não se diz que todos os ouvintes foram batizados, mas fala de um grande número, “mais ou menos três mil almas (pessoas)” que se juntaram ao núcleo inicial da comunidade de das 120 pessoas (1,15). Dificilmente é de imaginar que todos estes 3000 fossem batizados num rio. Em Jerusalém só tem riachos. Os At já indicam o batismo posterior fora dos rios e de crianças também (cf. o batismo da família do carcereiro em 16,29-33).

Evangelho: Jo 20,11-18

O evangelho de hoje apresenta a continuação do evangelho do Domingo da Páscoa (Jo 20,1-10).

Maria estava do lado de fora do túmulo, chorando (v. 11a).

Maria Madalena correu tanto para dar a notícia do túmulo vazio aos apóstolos. Ela estava acompanhada por outras mulheres (v. 2: “nós não sabemos onde o colocaram”; cf. Lc 24,10p). Agora ela está de novo no túmulo (v. 11). Muitos exegetas acham que a corrida de Pedro e do discípulo amado (vv. 3-10) foi inserida por uma redação posterior (inspirando-se em Lc 24,12) e no relato mais antigo, Madalena ainda não tinha saído do túmulo.

Quem é Maria Madalena? Seu nome indica o lugar de origem (Magdala na beira do lago de Genesaré) e não o nome do marido ou filho ou pai como era o costume (cf. 19,25; Mc 15,40). Deve ter sido sem marido, mas não está comprovada que ela é a pecadora de Lc 7,36-50 (esta tradição surgiu só pela proximidade de Lc 8,2). Sua importância consiste em ser a primeira testemunha da ressurreição. Todos os quatro evangelistas relacionam seu nome com o túmulo vazio e dois deles (Mt e Jo) contam um encontro dela com o Ressuscitado (cf. Mt 28,9-10).

Enquanto chorava, inclinou-se e olhou para dentro do túmulo. Viu, então, dois anjos vestidos de branco, sentados onde tinha sido posto o corpo de Jesus, um à cabeceira e outro aos pés (vv. 11b-12).

Em Jo 20,1 “ainda estava escuro”, quando ela veio ao túmulo, mas também na mente dela. Ela pensava que alguém (funcionário ou ladrão) tivesse retirado o corpo (vv. 2.13.15; mas as faixas de linha e o sudário enrolado à parte indicam que ninguém levou o corpo; cf. v. 7). “Enquanto chorava,… olhou para dentro do túmulo. Viu então dois anjos vestidos de branco, sentados onde tinha sido postos o corpo de Jesus, um à cabeceira e outro aos pés” (vv.11-12). A posição destes dois anjos (cf. Lc 24,4) marca o lugar vazio onde estava o corpo, mas pode aludir também aos dois querubins no propiciatório da arca da aliança no templo salomônico (Ex 25,17-22: “um dos querubins numa extremidade e outro na outra… Ali virei a ti… do meio dos dois querubins falarei contigo”). Agora, o novo templo é o corpo de Jesus (cf. Jo 2,21s).

Os anjos perguntaram: “Mulher, por que choras?” Ela respondeu: “Levaram o meu Senhor e não sei onde o colocaram” (v. 13).

Os dois anjos perguntam: “Mulher, porque choras?” Ela respondeu: “Levaram o meu Senhor e não sei onde o colocaram” (v. 13). A cena toda parece inspirar-se no livro Cântico dos Cânticos 3,1-4: “… pela noite, procurei o amado da minha alma… Vou levantar-me… Procurei e não o encontrei!… Encontraram-me os guardas: ‘Viste o amado da minha alma?’ Passando por eles, contudo, encontrei o amado da minha alma. Agarrei-o e não vou soltá-lo”. Este paralelo bíblico e a sugestão de Maria ser a pecadora deram início ao mal-entendido repetido de um relacionamento carnal com Jesus (último exemplo: Dan Brown, O Código da Vinci).

Tendo dito isto, Maria voltou-se para trás e viu Jesus, de pé. Mas não sabia que era Jesus.  Jesus perguntou-lhe: “Mulher, por que choras? A quem procuras?” Pensando que era o jardineiro, Maria disse: “Senhor, se foste tu que o levaste, dize-me onde o colocaste, e eu o irei buscar”. Então Jesus disse: “Maria!” Ela voltou-se e exclamou, em hebraico: “Rabuni” que quer dizer: Mestre (vv. 14-16).

Depois “Maria voltou-se atrás e viu Jesus, de pé. Mas não sabia que era Jesus” (v. 14). Jesus está “de pé”, quer dizer ressuscitado, não morto (cf. a visão de Estêvão em At 7,56). O ressuscitado não voltou para vida terrestre, seu corpo é modificado (transfigurado, glorificado) e pode parecer diferente (cf. 21,4; Lc 24,15-16). Maria achava que “era o jardineiro”; isto é mais uma alusão ao “jardim” do paraíso (18,1; 19,41; cf. Gn 2,15): Jesus jardineiro é o “novo Adão”, que recupera o paraíso (cf. 1Cor 15,21-22; Rm 5,12-20), cf. “Eis o homem” (Jo 19,5; a palavra hebraica Adão significa “homem, ser humano”); quando estava adormecido, do lado aberto dele nasceu a nova Eva, ou seja, a Igreja com seus sacramentos de “sangue e água” (19,34).

Jesus repete a pergunta do anjo (cf. Mt 28,9s) acrescentando: “A quem procuras?” (cf. 1,38; 18,4) e Maria responde de maneira semelhante (acrescentando: “dize-me onde o colocaste e eu o irei buscar”, v. 15). Só quando ele chama “Maria” pelo nome, ela o reconhece e exclamou “Rabuni” (meu mestre, v. 16). É o amor que revela e faz conhecer a verdade (cf. v. 8), também a ovelha conhece a voz do pastor (10,6).

Jesus disse: “Não me segures. Ainda não subi para junto do Pai. Mas vai dizer aos meus irmãos: subo para junto do meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus” (v. 17).

Maria queria segurar Jesus (cf. Ct 3,4; Mt 28,9: “abraçaram os pés”), mas Jesus está no caminho ao Pai (cf. 13,1) e ninguém o segura mais nesta vida da terra. Mas ele envia Madalena para anunciar a Boa Notícia (Evangelho) aos apóstolos. Em Jo, antes da paixão não chamava os discípulos de irmãos (cf. Mc 3,34s; Hb 2,11s). Agora diz: “Vá dizer a meus irmãos: que subo para junto do meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus”! (v. 17; cf. Mt 28,10). Depois da paixão nós estamos mais próximos de Deus. É o que acontece com o nosso batismo: Somos “filhos” de Deus (cf. 1,12-13 17,21-23; Rm 8,15; Gl 3,26s).

Então Maria Madalena foi anunciar aos discípulos: “Eu vi o Senhor!”, e contou o que Jesus lhe tinha dito (v. 18).

St.º Agostinho chama Madalena a “apóstola dos apóstolos” porque ela foi enviada por Jesus e levou a Boa Nova a eles: “Eu vi o Senhor” (v. 18; cf. v. 25). Em 1Cor 9,1, Paulo funda seu título de apóstolo em ter visto o Senhor). Só Lc restringe depois este título aos doze que acompanharam Jesus desde a Galileia (cf. At 1,21, exceto At 14,4.14).

Nesta mulher se cumpriu primeiro o que Jesus lhes havia dito na última ceia: “A vossa tristeza se converterá em alegria” (16,20). Jo não nos conta, se os apóstolos tinham acreditado nela ou acharam isso “desvario” (Lc 24,11). Fato é que Jesus confiou mais nas mulheres do que os homens da época que não aceitaram mulheres como testemunhas. Um reconhecimento maior das mulheres e do seu ministério convém também na Igreja atual.

O site da CNBB comenta: Maria Madalena queria somente estar com Jesus, ainda que ele estivesse morto. Queria estar com ele, mesmo que tivesse que ir buscá-lo, onde quer que o tivessem colocado. Chorava porque não havia encontrado Jesus. Estaria disposta a qualquer sacrifício para realizar o seu intento. Porém, se as pessoas correspondem ao amor de Deus, tanto mais Deus corresponde ao amor dos homens. Maria Madalena recebeu a grande recompensa pelo seu amor: fez a grande experiência do encontro pessoal com o ressuscitado, e anunciou a todos esta experiência.

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