19 de julho de 2016 – 16ª semana 3ª feira

Evangelho: Mt 12,46-50

No evangelho de hoje, ouvimos dos verdadeiros familiares de Jesus. Mt copiou este (des)encontro de Mc 3,31-35.

Enquanto Jesus estava falando às multidões, sua mãe e seus irmãos ficaram do lado de fora, procurando falar com ele. Alguém disse a Jesus: “Olha! Tua mãe e teus irmãos estão aí fora, e querem falar contigo” (vv. 46-47).

Mt não diz que Jesus estava numa casa (mas o diz em seguida em 13,1; cf. Mc 3,20.31). Do lado de “fora” deste círculo das multidões que estão com Jesus (desde v. 23), os familiares procuram Jesus, são “a mãe de Jesus e seus irmãos”. O termo “irmão” abrange, em linguagem bíblica, também os parentes (cf. Gn 13,8)

A expressão “irmãos e irmãs” de Jesus (cf. 13,55-56p) é interpretada de maneira diferente: para os católicos são apenas parentes; para os protestantes são outros filhos de Maria. A Tradução Ecumênica da Bíblia (TEB, p.1882) anota: Na Bíblia, como ainda hoje no Oriente, a palavra irmãos pode designar tanto os filhos da mesma mãe, como parentes próximos (cf. Gn 13,8; 14,16; 29,15; Lv 10,4; 1Cr 23,22).

A própria Bíblia não decide a questão (não está escrito em nenhum trecho da Bíblia que Maria teve apenas um filho, nem está escrito que teve mais de um), mais é tradição da Igreja desde os primeiros séculos que Maria não teve outros filhos além de Jesus. A Igreja Católica considera como revelação divina não só a Bíblia, mas também a tradição da Igreja. O que reforça o dogma da Igreja Católica é a entrega da mãe no pé da cruz ao discípulo amado (Jo 19,26-27). Se existissem outros filhos de Maria, Jesus não precisava entregá-la aos cuidados de um discípulo.

Não se menciona o pai (cf. 13,55; Mc 6,3; 10,30). Então, José, cujo papel Mt destaca na infância (Mt 1-2), já deve ter morrido e Jesus adulto tornou-se chefe da família que quer agora romper o círculo dos seguidores e reclamar seu parente famoso.

Jesus perguntou àquele que tinha falado: “Quem é minha mãe, e quem são meus irmãos?” E, estendendo a mão para os discípulos, Jesus disse: “Eis minha mãe e meus irmãos. Pois todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (vv. 48-50).

Jesus não despreza vínculos familiares (cf. 15,4-6), por isso, ele tem um “Pai, que está nos céus” (6,9; 23,9; Lc 2,41-52; Mc 14,36). O Filho de Deus está criando uma nova família, não através da carne, mas através do Espírito (cf. Jo 1,12-13; Rm 8,14-17).

Quem faz a “vontade do meu Pai”, fará parte desta família de Jesus. Quanto a Maria, ninguém como ela cumpriu a vontade do Pai e foi agradecida com o Espírito (cf. Lc 1,35-38). Jesus anuncia a vontade do Pai e a cumpre (26,42). A comunidade reza por ela na oração que Jesus ensinou (6,10). Será critério no julgamento (7,21-23).

O Papa Bento XVI (na Encíclica Deus Caritas Est) olha para a situação de Maria deixada de lado, durante os anos da vida pública de Jesus e percebe a sua grande humildade: aceita ser deixada de lado para que Jesus forme a sua nova família. Maria só se aproximará de Jesus no momento da cruz, quando os seus discípulos tiverem fugido (Jo 19,25-27). Em Pentecostes, todos irão se juntar ao redor dela à espera do Espírito Santo (cf. At 1,14). Stº Ambrósio comentando o texto de hoje diz assim: “Não se propõe aqui a recusa ofensiva dos parentes, mas ensina que os laços espirituais são mais sagrados do que os laços de sangue”.

O próprio Mt acrescentou que Jesus estava “estendendo a mão para os discípulos” (v. 49). Na tradição bíblica, este gesto significa diversas atitudes: carência (12, 13), hostilidade (26,51), bênção (Gn 48,14) ou o poder e o julgamento de Deus (frequente em Ez, Jr, Sf). Em Mt, Jesus estende a mão ao leproso (8,3) e a Pedro que afunda (14,31), ambas demonstrações do seu poder auxiliador. Aqui significa que os discípulos estão sob a proteção do seu Senhor que estará com eles até o fim do mundo (28,20).

Para os judeus, “irmãos” já eram os conterrâneos, para os cristãos são os membros da comunidade. Além disso, os discípulos são “meus irmãos” (cf. 28,10; 25,40; 23,8; Jo 20,17; Rm 8,29; Hb 2,11s). Como irmãos de Jesus, podemos invocar Maria como nossa mãe (cf. Jo 19.25-27).

 O site da CNBB comenta (citando Jo 15,15): Jesus não quer que nós sejamos seus servos, pois o amor que ele tem por nós não permite isso. O apóstolo São João nos diz no seu Evangelho que Jesus não chama os seus seguidores de servos, mas de amigos, porque lhes revelou tudo o que o Pai lhe deu a conhecer. Mas no Evangelho de hoje, Jesus vai mais além, ele nos mostra que quer que todos os que ele ama e o amam sejam membros da sua família, participem da sua vida divina. Para demonstrar o amor que temos por Jesus, não basta apenas afirmar o amor que se sente por ele, é preciso ir além, é preciso conhecer e realizar a vontade do Pai. Somente quem faz a vontade do Pai ama verdadeiramente a Jesus, torna-se membro da sua família e participa da sua vida.


Na primeira versão (javista) e mais realista, Moisés encoraja os israelitas fugitivos, assegurando-lhes que nada têm a temer nem a fazer (vv. 6.11-14). Então, “Javé fez o mar se retirar com um forte vento oriental, que soprou a noite inteira: o mar ficou seco” (v. 21). “De madrugada, Javé olhou da coluna de fogo e da nuvem, viu o acampamento dos egípcios e provocou uma confusão no acampamento” (v. 24). Os egípcios ali penetravam. O momento é a última vigília da noite, das 2 às 6h da manhã. A salvação chega pela manhã (Sl 17,15; 57). Menciona-se um elemento que faltava, o fogo, sinal da presença de Deus em Gn 15,17 e em Ex 19,18. Pela coluna de fogo e da nuvem, Javé separa os povos: ilumina o caminho do seu povo, enquanto o obscurece para os egípcios (13,21-22; 14,19-20). ”Então os egípcios disseram: ‘Vamos fugir de Israel, porque Javé combate a favor deles’ (v. 25b). E, de manhã, o mar voltou para o seu leito. Os egípcios, ao fugir, foram ao encontro do mar, e Javé atirou-os no meio do mar” (v. 27). São engolidos pelo seu refluxo (ou simplesmente atolaram com seus carros de guerra). Nesta narrativa atribuída ao javista, somente Javé é que intervém; não se fala de uma passagem do mar pelos israelitas, mas apenas da miraculosa destruição dos egípcios pelos elementos. Esta narrativa representa a tradição primitiva. O eloísta deve ter contribuído com “o anjo do Senhor, que ia adiante do exército de Israel, se retirou e passou para trás” (v. 19a) identificando-o com a coluna da nuvem e do fogo, e acrescentando os “600 carros de elite e todos os carros do faraó” (v. 7), assim Deus “emperrou as rodas dos carros, fazendo-os andar com dificuldade” (v. 25a). O javista concluiu: “Nesse dia, Javé salvou Israel das mãos dos egípcios, e Israel viu os cadáveres dos egípcios à beira-mar. Israel viu a mão forte com que Javé atuou contra o Egito. Então o povo temeu a Javé e acreditou nele e no seu servo Moisés” (v. 30; cf. Is 37,36). Morte dos opressores e vida com liberdade, assim é o final do juízo de separação. Os israelitas são testemunhas e por isso mudam de atitude. O medo de antes se transforma em “respeito reverencial” (a mesma palavra hebraica) e a desconfiança (cf. vv. 10-12) se muda em fé.

A segunda narrativa, aqui incluída posteriormente, é mais solene e litúrgica e destaca mais o papel do mediador Moisés; por tudo isso, é atribuída à tradição sacerdotal. “Moisés estendeu a mão sobre o mar”, seguindo uma ordem de Deus e usando o bastão (cf. v. 16); então o mar se fende, “as águas se dividiram em duas. Os filhos de Israel entraram pelo mar a pé enxuto, e as águas formavam duas muralhas, à direita e à esquerda” (vv. 21d-22). Na escuridão, o silêncio da noite e dois elementos cósmicos: o mar hostil, devorador, e o vento (já no relato javista) a serviço de Deus (Sl 104,4). “De pé enxuto”, lit. “sobre a terra seca”, como num novo Gênesis e no final do dilúvio, a água se retira e a terra seca aparece no meio dela (Gn 1,9; 8,1-5). A água hostil (cf. Gn 1,2; Sl 18,5s) se transforma em muralha protetora, em passagem segura para a luz do amanhecer que vem do leste. Direita e esquerda significam também sul e norte. “Na perseguição, os egípcios entraram atrás deles com todos os cavalos do Faraó, seus carros e cavaleiros, e foram até o meio do mar” (v. 23) Quando os egípcios vão atrás deles, as águas se fecham e os engolem (Sb 10,18s), mas não sem nova ordem litúrgica e sua execução imediata: “Javé disse a Moisés: ‘Estenda a mão sobre o mar, e as águas se voltarão contra os egípcios, seus carros e cavaleiros’. Moisés estendeu a mão sobre o mar (vv. 26-27a). As águas voltaram, cobrindo os carros e os cavaleiros de todo o exército do Faraó, que os haviam seguido no mar: nem um só deles escapou. Os filhos de Israel, porém, passaram pelo meio do mar a pé enxuto, enquanto as águas se erguiam em forma de muralhas, à direita e à esquerda” (vv. 28-29).

A recordação desta passagem aflora muitas vezes no AT, a tal ponto que esta libertação foi cantada como o milagre por excelência (Sl 77,17-20; 106,9). Isaías fala da volta do exílio babilônico como de um novo êxodo (Is 43,16-21). Nos registros do Antigo Egito, porém, não se encontra nada sobre esta fuga dos escravos hebreus, talvez por vergonha sobre a derrota (costuma-se registrar só as vitórias do faraó) ou por que achassem insignificante a fuga de alguns grupos de escravos. Pode ser que tivessem acontecido várias fugas de grupos distintos que se uniram depois num relato épico e único. Pelo menos um grupo atribuiu a libertação a seu deus Javé. O que mais se pode afirmar com certeza é que um homem de nome egípcio, Moisés deve ter tido conhecimento dos pontos fracos das fronteiras e do exército egípcio, por isso não escolheu a rota mais curta seguindo pela praia, mas a mais longa (cf. 13,17s) por onde o exército não conseguiu mais seguir, mas atolou (afundou).

Não é possível determinar o lugar e o modo deste acontecimento de Ex 14; mas aos olhos das testemunhas apareceu com uma intervenção espetacular de “Javé guerreiro” (Ex 15,3) e tornou-se um artigo fundamental da fé javista (Dt 11,4; Js 24,7; cf. Dt 1,30; 6,21-22; 26,7-8). Este milagre do mar foi colocado em paralelo com outro milagre da água, a passagem do Jordão (Js 3-4); a saída do Egito foi concebida de maneira secundária à imagem da entrada em Canaã e as duas apresentações misturavam-se no cap.14. A tradição cristã considerou este milagre como uma figura da salvação, e mais especialmente a salvação pelo batismo (1 Cor 10,1) e torna sua leitura obrigatória na vigília pascal.

Nessa ocasião, Moisés e os filhos de Israel entoaram este canto a Javé: “Vou cantar a Javé, pois sua vitória é sublime: ele atirou no mar carros e cavalos” (15,1).

Este cântico é repetido (na primeira pessoa) pelo cântico antigo da profetisa Miriâm, irmã de Moisés, em 15,21 que retém somente a destruição dos egípcios. Miriâm é o nome hebraico traduzido por “Maria” em grego (cf. a participação feminina nos caps. 1-2). No seu livro Alcorão, o fundador do islã, Maomé, confundiu esta irmã de Moisés (2,4-8; Nm 12) com Maria, a mãe de Jesus.

Este salmo de ação de graças (15,1-18; o salmo responsorial apresenta os vv. 8-10.12.17) é o primeiro e o mais celebre dos “cânticos” que a liturgia cristã toma do AT. Trata em toda a sua ampliação do tema da salvação miraculosa através do poder e da solicitude de Javé para com seu povo. O canto da vitória, que Miriam entoa em v. 21, é ampliado até englobar o conjunto das maravilhas do êxodo e da conquista de Canaã e até a construção do templo de Jerusalém, “em vosso monte, no lugar que preparastes para a vossa habitação, no santuário construído pelas vossas próprias mãos” (15,17).

Chegamos ao ápice da libertação da escravidão do Egito, uma experiência fundamental do povo de Deus: A passagem do “mar Vermelho” (em hebraico, dos caniços ou juncos; cf. 2,3; 2 Rs 9,26) assinala topograficamente a saída do povo: é a última batalha, não combativa, a última fronteira. O mar vermelho divide a geografia (entre a África e a Ásia), divide a história e se converte em linha divisória da existência. A passagem pelo mar é quase um nascimento do povo de Israel. Para os israelitas é como paradigma, para nós passar é salvar-se.

Existe neste livro uma versão poética, o canto heróico do cap. 15 (salmo responsorial de hoje e da vigília pascal); temos uma versão mais realista e psicológica, atribuída ao javista (cerca de 950 a.C) e outra mais litúrgica, doutrinal e abstrata, atribuída ao autor sacerdotal (cerca de 550 a.C.). Com essas duas e um toque de eloísta (cerca de 800 a.C.), diz a teoria documentaria, o último narrador compôs o presente capítulo. Isso explica as repetições temáticas e as mudanças de tonalidade. O milagre é narrado de duas maneiras que vamos apresentar segundo a teoria documentária:

Na primeira versão e mais realista, Moisés encoraja os israelitas fugitivos, assegurando-lhes que nada têm a temer nem a fazer (vv. 6.11-14). Então, “Javé fez o mar se retirar com um forte vento oriental, que soprou a noite inteira: o mar ficou seco” (v. 21). “De madrugada, Javé olhou da coluna de fogo e da nuvem, viu o acampamento dos egípcios e provocou uma confusão no acampamento” (v. 24). Os egípcios ali penetravam. O momento é a última vigília da noite, das 2 às 6h da manhã. A salvação chega pela manhã (Sl 17,15; 57). Menciona-se um elemento que faltava, o fogo, sinal da presença de Deus em Gn 15,17 e em Ex 19,18. Pela coluna de fogo e da nuvem, Javé separa os povos: ilumina o caminho do seu povo, enquanto o obscurece para os egípcios (13,21-22; 14,19-20). ”Então os egípcios disseram: ‘Vamos fugir de Israel, porque Javé combate a favor deles’” (v. 25b). “E, de manhã, o mar voltou para o seu leito. Os egípcios, ao fugir, foram ao encontro do mar, e Javé atirou-os no meio do mar” (v. 27). São engolidos pelo seu refluxo (ou pelo menos atolaram com seus carros de guerra). Nesta narrativa atribuída ao javista, somente Javé é que intervém; não se fala de uma passagem do mar pelos israelitas, mas apenas da miraculosa destruição dos egípcios. Esta narrativa representa a tradição primitiva. O eloísta deve ter contribuído com “o anjo do Senhor que ia adiante do exército de Israel se retirou e passou para trás” (v. 19a) identificando-o com a coluna da nuvem e do fogo e com os “600 carros de elite e todos os carros do faraó” (v. 7), assim Deus “emperrou as rodas dos carros, fazendo-os andar com dificuldade” (v. 25a). O javista concluiu: “Nesse dia Javé salvou Israel das mãos dos egípcios, e Israel viu os cadáveres dos egípcios à beira-mar. Israel viu a mão forte com que Javé atuou contra o Egito. Então o povo temeu a Javé e acreditou nele e no seu servo Moisés” (v. 30; cf. Is 37,36). Morte dos opressores e vida com liberdade, assim é o final do juízo de separação. Os israelitas são testemunhas e por isso mudam de atitude. O medo de antes se transforma em “respeito reverencial” (a mesma palavra hebraica) e a desconfiança (cf. vv. 10-12) se muda em fé.

 

A segunda narrativa, aqui incluída, é mais solene e litúrgica e destaca mais o papel do mediador Moisés, portanto, é atribuída à tradição sacerdotal: “Moisés estendeu a mão sobre o mar”, seguindo uma ordem de Deus e usando o bastão (cf. v. 16); então o mar se fende, “as águas se dividiram em duas. Os filhos de Israel entraram pelo mar a pé enxuto, e as águas formavam duas muralhas, à direita e à esquerda” (vv. 21d-22). Na escuridão, o silêncio da noite e dois elementos cósmicos: o mar hostil, devorador, e o vento a serviço de Deus (Sl 104,4). Como num novo Gênesis, como no final do dilúvio, a água se retira e a terra aparece no meio dela (Gn 1,9; 8,1-5). A água hostil se transforma em muralha protetora, em passagem segura para a luz do amanhecer que vem do leste. Direita e esquerda significam também sul e norte. “Na perseguição, os egípcios entraram atrás deles com todos os cavalos do Faraó, seus carros e cavaleiros, e foram até o meio do mar” (v. 23) Quando os egípcios vão atrás deles, as águas se fecham e os engolem (Sb 10,18s), mas não sem nova ordem litúrgica e sua execução imediata: “Javé disse a Moisés: ‘Estenda a mão sobre o mar, e as águas se voltarão contra os egípcios, seus carros e cavaleiros’. Moisés estendeu a mão sobre o mar” (vv. 26-27a). “As águas voltaram, cobrindo os carros e os cavaleiros de todo o exército do Faraó, que os haviam seguido no mar: nem um só deles escapou. Os filhos de Israel, porém, passaram pelo meio do mar a pé enxuto, enquanto as águas se erguiam em forma de muralhas, à direita e à esquerda” (vv. 28-29).

A recordação desta passagem aflora muitas vezes no AT, a tal ponto que esta libertação foi cantada como o milagre por excelência  (Sl 77,17-20; 106,9). Isaías fala da volta do exílio babilônico como de um novo êxodo (Is 43,16-21). Nos registros do Antigo Egito, porém, não se encontra nada sobre esta fuga dos escravos hebreus, talvez por vergonha sobre a derrota (costuma-se registrar as vitórias do faraó) ou por que achassem insignificante a fuga de alguns grupos de escravos. Pode ser que eram várias fugas de grupos distintos que se uniu depois num relato épico e único. Pelo menos um grupo atribuiu a libertação ao deus Javé. O que mais se pode afirmar com certeza, é que um homem de nome egípcio, Moisés, deve ter tido conhecimento das fraquezas do exército egípcio, por isso não escolheu a rota mais curta seguindo pela praia, mas a mais longa (cf. 13,17s), por onde o exército não conseguiu mais seguir, mas atolou (afundou).

“Nessa ocasião, Moisés e os filhos de Israel entoaram este canto a Javé: “Vou cantar a Javé, pois sua vitória é sublime: ele atirou no mar carros e cavalos” (15,1). Este cântico só repete na primeira pessoa o cântico bastante antigo da profetisa Miriâm, irmã de Moisés em 15,21, que retém somente a destruição dos egípcios. Miriâm é o nome hebraico traduzido por “Maria” em grego (cf. a participação feminina em cap. 1-2). Maomé confundiu no Alcorão esta irmã de Moisés (2,4-8; Nm 12) com Maria, a mãe de Jesus.

Não é possível determinar o lugar e o modo deste acontecimento de Ex 14; mas aos olhos das testemunhas, apareceu com uma intervenção espetacular de “Javé guerreiro” (Ex 15,3) e tornou-se um artigo fundamental da fé javista (Dt 11,4; Js 24,7; cf. Dt 1,30; 6,21-22; 26,7-8). Este milagre do mar foi colocado em paralelo com outro milagre da água, a passagem do Jordão (Js 3-4); a saída do Egito foi concebida de maneira secundária à imagem da entrada em Canaã e as duas apresentações misturavam-se no cap.14. A tradição cristã considerou este milagre como uma figura da salvação, e mais especialmente a salvação pelo batismo (1 Cor 10,1) é torna sua leitura obrigatória na vigília pascal.

Na ocasião da destruição do exército de Faraó, entoa-se um salmo de ação de graças (15,1-18; o salmo responsorial apresenta os vv. 8-10.12.17). É primeiro é o mais celebre dos “cânticos” que a liturgia crista toma do AT; trata em toda a sua ampliação do tema da salvação miraculosa que o poder e solicitude de Javé para com seu povo; o canto da vitória que Miriam canta em v. 21, é ampliado até englobar o conjunto das maravilhas do êxodo e da conquista de Canaã e até a construção do templo de Jerusalém, “em vosso monte, no lugar que preparastes para a vossa habitação, no santuário construído pelas vossas próprias mãos” (v. 17).

NBP 15,1-21: Até os tempos de Ezequias e Josias, Javé era visto como um Deus entre outros (v. 11,18,11; Dt 10,17), um Deus guerreiro (cf. v. 3), cujo culto e ação se davam na defesa armada em favor das famílias camponesas e de suas colheitas (ver nota a 14,1-14). Um antigo refrão (vv. 21 e 1), atribuído à profetisa Miriam (cf. Jz 4,4; 5,1.20-21; 1Sm 2), foi reelaborado no ambiente do Templo e do povo consagrado a Javé (vv. 17-18; cf. Dt 7,6; Sl 74,2; 78,54), dando origem ao cântico de Moises.

Evangelho: Mt 12,46-50

No evangelho de hoje, os familiares de Jesus o procuram. Mt copiou este (des)encontro com os familiares de Mc 3,31-35.

Enquanto Jesus estava falando às multidões, sua mãe e seus irmãos ficaram do lado de fora, procurando falar com ele. Alguém disse a Jesus: “Olha! Tua mãe e teus irmãos estão aí fora, e querem falar contigo” (vv. 46-47).

Mt não diz que Jesus estava numa casa (mas diz em seguida em 13,1; cf. Mc 3,20.31). Do lado de “fora” deste círculo das multidões (v. 23), os familiares procuram Jesus, são “a mãe de Jesus e seus irmãos” (v. 31).

O termo “irmão” abrange, em linguagem bíblica, também os parentes (cf. Gn 13,8). A expressão “irmãos e irmãs” de Jesus (cf. 13,55s; 3,31-35) é interpretada de maneira diferente: para os católicos são apenas parentes; para os protestantes são outros filhos de Maria. A Tradução Ecumênica da Bíblia (TEB, p.1882) anota: Na Bíblia, como ainda hoje no Oriente, a palavra irmãos pode designar tanto os filhos da mesma mãe, como parentes próximos (cf. Gn 13,8; 14,16; 29,15; Lv 10,4; 1 Cr 23,22).

A própria Bíblia não decide a questão (não está escrito em nenhum trecho da Bíblia que Maria teve apenas um filho, nem está escrito que teve mais de um), mais é tradição da Igreja desde os primeiros séculos que Maria não teve outros filhos além de Jesus. A Igreja Católica considera como revelação divina não só a Bíblia, mas também a tradição da Igreja. O que reforça o dogma da Igreja Católica é a entrega da mãe no pé da cruz ao discípulo amado (Jo 19,26-27). Se existissem outros filhos de Maria, Jesus não precisava entregá-la aos cuidados de um discípulo.

Aqui não se menciona o pai (cf. 13,55; Mc 6,3; 10,30). Então, José, destacado por Mt na infância (Mt 1-2), já deve ter morrido e Jesus adulto tornou-se chefe da família que quer agora romper o círculo dos seguidores e reclamar seu parente famoso.

Jesus perguntou àquele que tinha falado: “Quem é minha mãe, e quem são meus irmãos?” E, estendendo a mão para os discípulos, Jesus disse: “Eis minha mãe e meus irmãos. Pois todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (vv. 48-50).

Jesus não despreza vínculos familiares (cf. 15,4-6), por isso, ele tem um “Pai que está nos céus” (6,9; 23,9; Lc 2,41-52; Mc 14,36). Mas ele está criando uma nova família, não através da carne, mas através do Espírito (cf. Jo 1,12-13; Rm 8,14-17). Quem faz a vontade do seu Pai, fará parte desta família de Jesus. Quanto a Maria, ninguém como ela cumpriu a vontade do Pai e foi agradecida com o Espírito (cf. Lc 1,35-38). Jesus anuncia a vontade do Pai e a cumpre (26,42). A comunidade reza por ela na oração que Jesus ensinou (6,10). Será critério no julgamento (7,21-23).

O Papa Bento XVI, na Encíclica Deus caritas est, olha para a situação de Maria deixada de lado, durante os anos da vida pública de Jesus e percebe a sua grande humildade: aceita ser deixada de lado para que Jesus forme a sua nova família. Maria só se aproximará de Jesus no momento da cruz, quando os seus discípulos tiverem fugido (Jo 19, 25-27). Em Pentecostes, todos irão se juntar ao redor d’ela à espera do Espírito Santo (cf. At 1, 14). Santo Ambrósio comentando o texto de hoje diz assim: “Não se propõe aqui a recusa ofensiva dos parentes, mas ensina que os laços espirituais são mais sagrados do que os laços de sangue”.

O próprio Mt acrescentou que Jesus estava “estendendo a mão para os discípulos” (v. 49). Na tradição bíblica, este gesto significa diversas atitudes: carência (12, 13), hostilidade (26,51), benção (Gn 48,14) ou o poder e o julgamento de Deus (frequente em Ez, Jr, Sf). Em Mt, Jesus estende a mão ao leproso (8,3) e a Pedro que afunda (14,31), ambas demonstrações do seu poder auxiliador. Aqui significa que os discípulos estão sob a proteção do seu Senhor que estará com eles até o fim do mundo (28,20).

Para os judeus, “irmãos” já eram os conterrâneos, para os cristãos são os membros da comunidade. Além disso, os discípulos são “meus irmãos” (cf. 28,10; 25,40; 23,8; Jo 20,17; Rm 8,29; Hb 2,11s). Como irmãos de Jesus, podemos invocar Maria como nossa mãe (cf. Jo 19.25-27).

O site da CNBB comenta (citando Jo 15,15): Jesus não quer que nós sejamos seus servos, pois o amor que ele tem por nós não permite isso. O apóstolo São João nos diz no seu Evangelho que Jesus não chama os seus seguidores de servos, mas de amigos, porque lhes revelou tudo o que o Pai lhe deu a conhecer. Mas no Evangelho de hoje, Jesus vai mais além, ele nos mostra que quer que todos os que ele ama e o amam sejam membros da sua família, participem da sua vida divina. Para demonstrar o amor que temos por Jesus, não basta apenas afirmar o amor que se sente por ele, é preciso ir além, é preciso conhecer e realizar a vontade do Pai. Somente quem faz a vontade do Pai ama verdadeiramente a Jesus, torna-se membro da sua família e participa da sua vida.

 

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