23 de agosto de 2017 – Quarta-feira – Santa Rosa de Lima

 

As leituras breves da festa de Santa Rosa de Lima (Peru, 1586-1617), a primeira santa do continente americano, ilustram a dedicação da sua vida de oração íntima e penitência austera em meio às provações.

Leitura: 2Cor 10,17-11,2

A leitura é um trecho dos capítulos mais severas de 2Cor, porque Paulo enfrenta missionários “super-apóstolos” (11,4; 12,11) que se aproveitam do trabalho por ele realizado gratuitamente e procuram desacreditá-lo.

Quem se gloria, glorie-se no Senhor (10,17).

Este princípio enunciado por Jr 9,22-23, Paulo já o citou em 1Cor 1,31. “Gloriar-se” é atribuir a si os resultados e reivindicar méritos (cf. Dt 8,17s; Is 10,12-16 etc.). Gloriar-se “no Senhor” é gloriar-se por ter Deus como Senhor e por haver recebido tudo dele: é um orgulho paradoxal. Em sua defesa, Paulo se finge de insensato para se gloriar também, porém, mais da sua fraqueza e sofrimentos. Se esse texto lhe custou lagrimas (cf. 2,9), temos que perceber o pranto atrás das caçoadas como o palhaço que chora enquanto faz rir.

Pois é aprovado só aquele que o Senhor recomenda e não aquele que se recomenda a si mesmo (10,18).

Pouco antes, Paulo escreveu: “Alguns fazem recomendações de si mesmos, que se tornam insensatos, porque se medem com a sua própria medida e si comparam a si mesmos” (10,13; cf. o testemunho de Jesus em Jo 8,13-18; Dt 19,15: só é valido um testemunho de duas ou três pessoas).

 Oxalá pudésseis suportar um pouco de insensatez, da minha parte. Na verdade, vós me suportais (11,1).

Os coríntios já “suportam… de bom grado… os superapóstolos” (vv. 4-5.19-20), ou seja, falsos apóstolos que distorcem a mensagem original do evangelho. O verdadeiro apóstolo sente amor e ciúme que pode deixar a razão em segundo plano.

Sinto por vós um amor ciumento semelhante ao amor que Deus vos tem. Fui eu que vos desposei a um único esposo, apresentando-vos a Cristo como virgem pura (11,2).

Paulo utiliza a idéia tradicional do Deus ciumento (Ex 20,5; 34,14; Dt 4,24; por Jerusalém: Zc 1,14; 8,2) na imagem conjugal. Uma vez já desposada (com vinculo jurídico) a noiva-esposa deve conservar-se casta para seu marido (cf. Eclo 42,9-10: “na casa paterna não fique grávida”). Um homem encarregado de guardá-la vive solícito e vigilante; carrega por assim dizer, os ciúmes do futuro marido (cf. Ef 5,26). Desde os profetas, o amor de Javé por seu povo era simbolizado pelo amor do esposo e da esposa (Os 2; Jr 2,1-7; Ez 16,23).

O NT (Novo Testamento) retomou a imagem (Mt 22,2s; 25,1s; Jo 3,28-29; Ef 5,25-33; Ap 19,7; 21,2). A desposada é a igreja dos Coríntios. Cristo é o esposo, Paulo é o guardião que conduziu a comunidade de Corinto a Cristo. Agora ele teme que essa igreja se deixe seduzir por falsos apóstolos, que apresentam evangelhos diferentes. Para o apóstolo, cada comunidade está profundamente ligada a Jesus, seu Senhor único e exclusivo; e ninguém tem direito de apoderar-se de uma comunidade cristã.

A imagem do matrimônio exprime intimidade e pertença. Quem fez os votos de castidade, faz isso por amor exclusivo a Cristo, assim a noviça torna-se noiva de Cristo. Isabel Flores, apelidada “Rosa” em virtude da sua beleza, viveu a simplicidade da vida laical na Terceira Ordem Dominicana em Lima, Peru.

 

Evangelho: Mt 13,44-46

Ouvimos hoje um par de parábolas que se encontram somente no final do terceiro discurso de Jesus em Mt: a do tesouro e da pérola. Ambas demonstram a alegria de encontrar uma coisa de grande valor e a disposição de vender os outros bens para adquiri-la. Santa Rosa de Lima, porém, encontrou essa alegria do reino ao deixar os valores do mundo.

O Reino dos Céus é como um tesouro escondido no campo. Um homem o encontra e o mantém escondido. Cheio de alegria, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquele campo. O Reino dos Céus também é como um comprador que procura pérolas preciosas. Quando encontra uma pérola de grande valor, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquela pérola (vv. 44-46).

As duas parábolas formam um par (cf. a semente da mostarda e a fermento em vv. 31-33) com a mesma conclusão: Não importa, se um “encontra” por acaso e outro “procura” há tempo, quem acha o Reino dos Céus deve deixar tudo para entrar nele (cf. 4,22; 8,19-21; 9,9; 19,21.27-30; Lc 9,57-62).

Consideradas fora do seu contexto, essas duas parábolas dão ensejo a vários sentidos possíveis: valor do tesouro e da pérola, alegria da descoberta, obrigação de vender tudo. O tema “escondido/revelado” é primordial e traduz-se pela “alegria”. Enquadradas entre duas ameaças terríveis da “fornalha ardente” (13,42.50) que contrastam violentamente com a alegria, estas parábolas passam a ser uma exortação a vender tudo para possuir esta alegria.

O camponês teria tido outras opções: poderia ter retirado o tesouro em segredo, poderia ter obedecido à lei e publicar seu achado para ver se encontrar-se um dono legítimo, ou poderia fazer um empréstimo no banco. Mas ele “vai, vende todos os seus bens e compra aquele campo”.

O comprador de perolas é um empresário que importa ou exporta. Pérolas eram importadas da Índia e desde Alexandre Magno estavam na moda tornando-se símbolos de preciosidade. Não interessam aqui as circunstâncias da compra, exceto que ele “vai, vende todos os seus bens e compra aquela pérola”.

Para entrar no Reino de Deus é necessária uma decisão total. Apegar-se a seguranças, mesmo religiosas, que são falsas ou puras imitações, em troca da justiça do Reino de Deus, é preferir bijuterias a uma pedra preciosa de “grande valor” (cf. 6,33: “Procurai, em primeiro lugar, o reino de Deus”).

Já a sabedoria do Antigo Testamento foi comparada com tesouros, pérolas, pedras e metais preciosos (Pr 1,9; 4,7-9; Sb 7,9;…). Enquanto uns aplicaram a sabedoria à Lei (Eclo 24), Mt aplica esta preciosidade ao (Evangelho do) reino de Deus (cf. 7,18p); o discípulo “cheio de alegria, ele vai, vende todos os seus bens, e compra” este valor máximo que é o reino; cf. a vocação fracassada do jovem rico em 19,16-22p: “Vai, vende seus bens e dá aos pobres, e terás um tesouro no céu”.

Chama atenção o fato de que Jesus não precisa explicar estas duas parábolas, como outras antes e depois. Os discípulos já devem entender seu significado: é preciso apostar tudo no reino e não se apegar nas muitas coisas deste mundo (13,22: “o cuidado do mundo e a sedução da riqueza sufocam a palavra”; cf. 6,19: “Não juntais para vós tesouros na terra,… mas ajuntai para vós tesouros no céu…”).

O site da CNBB comenta: O Evangelho de hoje nos mostra a parábola na qual Jesus compara o Reino de Deus com um tesouro e com uma pérola. A comparação com o tesouro nos mostra o valor que o Reino de Deus deve ter nas nossas vidas, um valor que não pode ser superado por nenhum outro valor deste mundo. A pérola nos mostra a preciosidade inigualável que é o Reino de Deus para todas as pessoas. E tanto o valor como a preciosidade do Reino de Deus significam que todas as outras coisas perdem sua importância diante dele e só têm sentido enquanto contribuem para que o homem possa chegar até Deus.

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