25 de maio de 2017- Quinta-feira, Páscoa 6ª semana

 

Leitura: At 18,1-8

Depois do pouco sucesso em Atenas, capital da cultura intelectual (cf. 17,16-34), Paulo se dirige a outra cidade na Grécia, onde a mensagem cristã é acolhida melhor no meio popular.

Paulo deixou Atenas e foi para Corinto (v. 1).

Corinto é uma cidade de duas culturas, antes grega e agora romana, e de “dois mares” (Horácio), de dois portos (Licaon a oeste e Cencréia a leste). Reconstruída por Júlio César, tornou-se a capital da província romana da Acaia. O elemento romano e latino nela predominava; mas o comércio atraia uma população cosmopolita. Também a colônia judaica era importante. Corinto tinha péssima reputação devido ao culto de Afrodite (deusa grega de amor) e à licenciosidade dos costumes.

Corinto torna-se cidade do amor e da dor de Paulo, à qual dedicava muito tempo, muitos afãs e várias cartas (cf. 1 e 2Cor). O autor dos Atos, Lucas, nos oferece um mosaico de informações sobre a chegada e primeira atuação de Paulo.

Aí encontrou um judeu chamado Áquila, natural do Ponto, que acabava de chegar da Itália, e sua esposa Priscila, pois o imperador Cláudio tinha decretado que todos os judeus saíssem de Roma. Paulo entrou em contato com eles. E, como tinham a mesma profissão – eram fabricantes de tendas – Paulo passou a morar com eles e trabalhavam juntos (vv. 2-3).

A expulsão dos judeus de Roma pelo imperador Cláudio (41-54), conhecida pelo historiador Suetônio, poderia datar de 49 ou 50. Seus efeitos foram passageiros; ignoramos até que ponto e por quanto tempo foi observada (cf. Rm 16,3; At 28,17). Segundo Suetônio, foi consequência indireta da penetração do cristianismo.

Áquila e Priscila (chamada também Prisca (Rm 16,3; 1Cor 16,19; 2Tm 4,19) eram um casal judeu-cristão que fabricava material para tendas de campanha. Daqui em diante Priscila é sempre nomeada antes do seu marido; quer dizer que ela deve ter tido um papel mais importante para a comunidade do que seu marido (cf. vv. 18.26; Rm 16,3; 2Tm 4,19). O casal se tornou um excelente colaborador na missão de Paulo, primeiro em Corinto e depois em Éfeso (vv. 18s; 1Cor 16,19), e ainda em Roma (Rm 16,3; cf. 2Tm 4,19).

Paulo começa trabalhar com os dois, o apóstolo não só era mestre da lei, mas exercia também uma profissão com as mãos (como Jesus e os apóstolos, os rabinos também praticavam um ofício manual). Embora reconheça o direito dos missionários à sua subsistência (1Cor 9,6-14; Gl 6,6; 2Ts 3,9; cf. Lc 10,7), Paulo quis sempre trabalhar com as próprias mãos (1Cor 4,12), para não ser pesado a ninguém (1Ts 2,9; 2Ts 3,8; 2Cor 12,13s) e provar seu desinteresse (At 20,33s; 1Cor 9,15-18; 2Cor 11,7-12). Só aceitou auxílios dos filipenses (Fl 4,10-19; 2Cor 11,8s; cf. At 16,15). Recomenda também aos fiéis que trabalhem para proverem às próprias necessidades (1Ts 4,11s; 2Ts 3,10-12) e às dos indigentes (At 20,35; Ef 4,28).

Todos os sábados, Paulo discutia na sinagoga, procurando convencer judeus e gregos (v. 4).

Como em outros lugares, também gregos simpatizantes, tementes a Deus, acorriam à sinagoga dos judeus.

Quando Silas e Timóteo chegaram da Macedônia, Paulo dedicou-se inteiramente à Palavra, testemunhando diante dos judeus que Jesus era o Messias (v. 5).

Chegaram finalmente os dois colaboradores desta segunda viagem missionária com recursos de outras comunidades (cf. 17,14; 1Ts 3,1-6). Paulo escreveu as cartas aos fiéis de Tessalônica somente depois do regresso de Silas e Timóteo (cf. 1Ts 1,1; 3,6; 2Ts 1,1). 1Ts é a carta mais velha de Paulo que temos (escrita por volta de 50 d.C.), portanto a parte mais antiga do NT (Novo Testamento). Muitos exegetas, porém, consideram 2Ts uma carta posterior, escrita por um discípulo da terceira geração em nome de Paulo.

Chegando da Macedônia com auxílios (2Cor 11,8-9; Fl 4,15), Timóteo e Silas assistiram a Paulo na evangelização de Corinto (2Cor 1,19). Com a ajuda deles, Paulo dispunha de mais tempo para a pregação, chamada também “testemunho”, ou seja, demonstrar pela Escritura que Jesus era o Messias. O caráter messiânico de Jesus era o objetivo especifico da pregação para aos judeus (cf. 2,36; 3,18.20; 5,42; 8,5.12; 9,22; 17,3; 18,28; 24,24; 26,23).

Mas, por causa da resistência e blasfêmias deles, Paulo sacudiu as vestes e disse: “Vós sois responsáveis pelo que acontecer. Eu não tenho culpa; de agora em diante, vou dirigir-me aos pagãos” (v. 6).

Bem cedo acontece a ruptura, que Paulo expressa com uma variante do gesto conhecido: “sacudiu as vestes” (cf. Lc 9,5p: sacudir a poeira dos pés). As palavras que o seguem são bíblicas (cf. Lv 20,9-16; 2Sm 1,16) e dão a entender aos judeus que toda a responsabilidade de sua atitude e as consequências dela pesam sobre eles: “Vós sois responsáveis pelo que acontecer”, lit.: “Que vosso sangue caia sobre a vossa cabeça” (cf. 5,28; Mt 27,24s), é uma acusação greve, porque o sangue é a vida (Ez 33; 1Sm 25,31). Paulo não tem “culpa” (lit. está “puro”) do sangue do castigo deles (cf. Ez 3,17-21). Depois da rejeição por parte dos judeus, é a vez de pregar dos pagãos (cf. 13,45-47).

Então, saindo dali, Paulo foi para a casa de um pagão, um certo Tício Justo, adorador do Deus único, que morava ao lado da sinagoga. Crispo, o chefe da sinagoga, acreditou no Senhor com toda a sua família; e muitos coríntios, que escutavam Paulo, acreditavam e recebiam o batismo (vv. 7-8).

A outra face da moeda compensa amplamente o fracasso procedente (talvez alterando a ordem cronológica). Tício (variação de texto: Tito) Justo era provavelmente um incircunciso, temente a Deus. Indo na casa dele, Paulo rompe com a sinagoga (cf. 11,28). Mas converte-se nada menos que o chefe da sinagoga (1Cor 1,14.16) e muitos pagãos. Crispo foi batizado pessoalmente por Paulo, como também Gaio (1Cor 1,14, cf. Rm 16,23) e “a família de Estéfanas” (1Cor 1,16).

O batismo com “toda a sua família” (lit. “casa”, incluindo também servos e empregados) é normal nessa sociedade. Já antes em Cesareia, o romano Cornélio foi batizado com sua família (10,24.48); na cidade de Filipos, a comerciante Lídia e o carcereiro com suas famílias (16,15.31-34), agora é um judeu e chefe da sinagoga em Corinto que se converteu com toda sua família.

Que o chefe da sinagoga “acredita no Senhor” não é novidade, porque “Senhor” é tradução grega do nome hebraico de Deus, Yhwh (Javé), mas Senhor aqui designa Jesus Cristo (cf. 2,36 etc.). Funda-se uma comunidade, que será uma das mais importantes em território europeu. Os incansáveis viajantes fazem uma parada muito longa, de “um ano e meio”, dedicados ao “ensinamento” (v. 11, cf. a leitura de amanhã). Depois da evangelização pelo querigma (primeiro anúncio), essa atividade se poderia chamar catequese (aprofundamento e formação mais sistemática, incluindo preparação para sacramentos).

A leitura de hoje nos mostra como a Igreja nasceu nas casas dos cristãos. Só mais tarde, no século III, surgiram edifícios para o culto. Antes, as casas dos cristãos eram lugar da “igreja” (assembleia). Paulo chamou um casal de colaboradores. Quando as famílias se comprometem, a Igreja cresce. O testemunho para os filhos e para os colegas de trabalho é muito importante.

 

Evangelho: Jo 16,16-20

No discurso de despedida da última ceia, Jesus volta ao tema da sua partida e da tristeza dos discípulos. O gênero dos discursos de despedida, porém, quer se referir, além do tempo narrado, ao tempo atual das gerações posteriores.

(Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos:) “Pouco tempo ainda, e já não me vereis. E outra vez pouco tempo, e me vereis de novo” (v. 16).

Pela terceira vez no discurso de despedida, Jesus fala de “pouco tempo” (cf. 13,33; 14,19). “Já não me vereis” é um anúncio velado da sua morte.

“Pouco tempo” (cf. 7,33; 8,21; 13,33), por esta expressão, Jesus anunciava o fim imanente da sua obre terrestre e sua volta ao Pai. Mas o uso de dois verbos gregos (p. ex. “ter diante dos olhos”, “ver”) e dois tempos distintos indica uma diferença entre a maneira de ver Jesus no período que se encerra (cf. 14,19) e a que será concedida a partir da glorificação.

Como as gerações posteriores aos discípulos poderiam ver Jesus? Primeiramente, com os olhos da fé (cf. 20,29). Crer é “vir” a Jesus (5,40; 6,37.44s.65) e “ver” Jesus (6,40; 12,21). A outra forma de ver Jesus é na sua volta no fim dos tempos (parusia).

Alguns dos seus discípulos disseram então entre si: “O que significa o que ele nos está dizendo: ‘Pouco tempo, e não me vereis, e outra vez pouco tempo, e me vereis de novo’, e: ‘Eu vou para junto do Pai?’” Diziam, pois: “O que significa este pouco tempo? Não entendemos o que ele quer dizer” (vv. 17-18).

A pergunta desconcertada dos discípulos reflete a ambivalência do enunciado (inclui também v. 5; cf. v. 28; 17,5; 20,17 e 3,13; 6,62). Para a comunidade de João (cerca de 90 a 100 d.C.), já passou muito tempo desde a partida de Jesus. Pela boca dos discípulos, é a comunidade cristã que pergunta, ao ver que o retorno glorioso do Senhor, a parusia, demora (cf. p. ex. 1-2Ts; 2Pd 3).

Jo se coloca no contexto de uma escatológica realizada ou antecipada: apesar da ausência física de Jesus, o fiel conhece, por experiência e pelo testemunho do Espírito, que Jesus está vivo, perto, e assim o “vê” contemplando com os olhos iluminados da fé (cf. “tua luz nos faz ver a luz”, Sl 36,10).

Jesus compreendeu que eles queriam interrogá-lo; então disse-lhes: “Estais discutindo entre vós porque eu disse: Pouco tempo e já não me vereis, e outra vez pouco tempo e me vereis? (v. 19).

No contexto da ceia e da despedida, o anúncio de Jesus parece transparente: Não o verão quando morrer, vê-lo-ão quando ressuscitar, tudo sucederá em “pouco tempo”. De fato o vêem e se alegram (20,20). Num contexto mais amplo, obtido depois, não o verão quando deixar o mundo voltando ao Pai, voltarão a vê-lo ao experimentar sua presença gloriosa; nesse contexto, “pouco tempo” significa que sempre está próximo ao homem (escatológica realizada ou antecipada).

Em verdade, em verdade vos digo: Vós chorareis e vos lamentareis, mas o mundo se alegrará; vós ficareis tristes, mas a vossa tristeza se transformará em alegria (v. 20).

Começa uma nova resposta (vv. 20-23a), introduzida por “Amém, Amém” (traduzido “em verdade…). Jesus fala das dores e da tristeza já anunciadas em 15,18-16,4a.6; mas a novidade agora é que a “vossa tristeza se transformará em alegria” (cf. Sl 126), tristeza da paixão, alegria de rever o Cristo ressuscitado (cf. 20,20).

O site da CNBB comenta: Um pouco de tempo e os discípulos não verão mais Jesus, porque o mistério da cruz está próximo, e com ele, a morte e a separação. E mais um pouco e me vereis de novo, ou seja, todos os que acreditam farão a experiência do Ressuscitado, viverão sempre na sua presença, de modo que a tristeza da separação dará aos que têm fé lugar a uma alegria que jamais poderá ser tirada. Porém, por causa dos que não acreditam e por causa também dos nossos pecados, deveremos passar por diversas tribulações, mas, por piores que sejam, elas não podem vencer quem crê verdadeiramente.

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