27 de Outubro de 2018, Sábado: Naquele tempo, vieram algumas pessoas trazendo notícias a Jesus a respeito dos galileus que Pilatos tinha matado, misturando seu sangue com o dos sacrifícios que ofereciam (v. 1)

Leitura: Ef 4,7-16

Neste cap. 4, o autor da carta (provavelmente um discípulo de Paulo) encara sucessivamente três perigos que ameaçam a unidade da Igreja: a discórdia entre os cristãos (vv. 1-3; leitura de ontem), a necessária divisão dos ministérios (vv. 7.11) e as doutrinas heréticas (vv. 14-15), e a eles opõe os princípios e o programa da unidade em Cristo (vv. 4-6) no dinamismo de um crescimento (vv. 12-13. 15-16).

Unidade não significa uniformização, pois Deus concede dons diferentes a cada pessoa (vv. 7-13). Essa unidade na diversidade dá coesão à comunidade para que ela não seja dominada por doutrinas que a esfacelem (vv. 14-16).

Cada um de nós recebeu a graça na medida em que Cristo lha deu (v. 7).

“Cada um de nós recebeu a graça” (4,7). Trata-se aqui das graças particulares destinadas ao serviço da Igreja, isto é, os “dons, carismas” (cf. 1Cor 12,1).

Daí esta palavra: “Tendo subido às alturas, ele capturou prisioneiros, e distribuiu dons aos homens”. ”Ele subiu”! Que significa isso, senão que ele desceu também às profundezas da terra? Aquele que desceu é o mesmo que subiu mais alto do que todos os céus, a fim de encher o universo (vv. 8-10).

A pluralidade dos dons e carismas vem de Cristo que distribuiu seus dons, como faz um vencedor esplêndido. Este motivo literário se encontra em Sl 68,19; aqui é adaptado sem esforço, graças a versão grega. Segundo os métodos rabínicos, o autor da carta evoca este texto apenas para encarecer dois termos – ele “subiu” (vv. 9-10) e ele “concedeu” (v. 11) – nos quais ele encontra anunciadas a ascensão de Jesus e a efusão do Espírito. Os verbos “descer” e “subir” evocam o vocabulário do quarto Evangelho (cf. Jo 3,12s; 6,51-62).

“Capturou prisioneiros, e distribuiu dons”. Talvez o fato de Paulo se declarar prisioneiro (em v. 1; cf. 3,1) tenha inspirado a citação deste Salmo.

“Desceu também às profundezas da terra”; pode referir-se à terra dos vivos, qualificada de “inferior” em comparação com o céu (Is 44,23; cf. “debaixo do sol” Ecl 4,7.15 etc.); neste caso se refere à encarnação. Também pode designar o mundo subterrâneo, abissal, a morada dos mortos, o xeol (Nm 16,33; Dt 32,22; Ez 31,14; Sl 63,10), onde desceu Cristo antes de ressuscitar e de subir “mais alto do que todos os céus” (cf. Fl 2,6-11; 1Pd 3,19). “Todos os céus” (plural): os três ou os sete, segundo diversas representações. Cf. a viagem cósmica da Sabedoria em Eclo 24,5 e do salmista em Sl 139,8.

Uma interpretação judaica aplicou o Sl 68,19 a Moisés no Sinai: “Tu subiste ao céu… aprendeste a Torá (Lei) e a deste de presente aos homens” (Targum sobre os Salmos; cf. Rm 10,5-7). Jesus subiu aos céus e deu o Espírito (Pentecostes era a festa do dom da Lei). Ef não evoca a profusão do Espírito e as línguas, mas a enumeração dos diversos ministérios (dons, carismas instituídos) dados à Igreja (v. 11).

Desceu e subiu “a fim de encher (plenificar) o universo”. Percorrendo assim todo o universo, a fim de Cristo dele tomou posse como também do pleroma (plenitude) que ele “encabeça” (1,10) e encara inteiramente sob seu poder de “Senhor” (cf. 1,20-23; Cl 1,19; Fl 2,8-11). Cristo plenifica o universo porque plenifica a Igreja (cf. 1,22s). Isto se realiza graças aos mistérios evocados a partir do v. 11.

E foi ele quem instituiu alguns como apóstolos, outros como profetas, outros ainda como evangelistas, outros, enfim, como pastores e mestres. Assim, ele capacitou os santos para o ministério, para edificar o corpo de Cristo, até que cheguemos todos juntos à unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, ao estado do homem perfeito e à estatura de Cristo em sua plenitude (vv. 11-13).

A Tradição Ecumênica da Bíblia (p. 2271) comenta: Retorna a ideia da abundância dos dons do Cristo. O v. 7 mencionou a graça concedida a cada um. Todavia, ao contrário de 1Cor 12 e de Rm 12,3-8, Ef não evoca aqui a diversidade dos dons do carisma. A epístola põe o acento na iniciativa do Senhor que dá à Igreja os homens necessários a sua edificação. Nesta lista dos ministros, depara-se uma ordem que mantém a primazia do apóstolo, dando ênfase aos ministros da Palavra, inspirada, sem dúvida, pelo contexto (vv. 13-15).

“Apóstolo” é título próprio do NT, os outros quatro têm antecedentes no AT (evangelista em Is 40,9). Os dons relembrados são os carismas de governo e ensino, importantes para a comunidade permanecer unida no conhecimento e no compromisso da fé.

Aqui, os “santos” (v. 12) parecem ser mais especialmente os missionários e outros que ensinam (cf. 3,5), mas talvez sejam também todos os fiéis, na medida em que eles concorrem para edificar a Igreja (cf. At 9,13). Pode-se, todavia compreender de outro modo: “para o aperfeiçoamento dos santos, visando à obra do ministério, visando à edificação…”; tríplice meta fixada para os ministros em que os batizados são então beneficiados. A diversidade dos dons que cada um recebeu de Cristo não pode ser fonte de divisão, inveja e competição na comunidade, mas deve servir “à unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus”. A variedade de dons é desejada por Cristo, para que cada um se coloque a serviço de todos.

“Até que cheguemos… ao estado do homem perfeito e à estatura de Cristo em sua plenitude” (ou: o estado do homem consumado (perfeito, adulto). Não simplesmente o cristão chegado ao estado de “perfeito” (1Cor 2,6; Cl 1,28), mas o Homem Perfeito num sentido coletivo; ou próprio Cristo, “o Homem Novo”, arquétipo de todos os regenerados (2,15), ou, melhor ainda, o Cristo total, “Cabeça” (v. 15; 1,22; Cl 1,18) e “membros” (v. 16; 5,30) constituindo o seu Corpo (1Cor 12,12).

Assim, não seremos mais crianças ao sabor das ondas, arrastados por todo vento de doutrina, ludibriados pelos homens e induzidos por sua astúcia ao erro (v. 14).

Continua a ideia do crescimento em idade ou estatura e em maturidade (cf. Lc 2,40.52). De passagem adverte contra as heresias (falsas doutrinas) conjurando a imagem sapiencial do mar agitado (cf. Mc 4,35-41; 6,45-52).

Com toda uma tradição literária, os escritores paulinos fazem da criança o símbolo da imaturidade espiritual e intelectual (1Cor 3,1; 13,11; Gl 4,1.3). Nós não devemos permanecer como crianças. Isso não contradiz o apelo do Evangelho, que convida a mudar (converter) para se tornar como criancinhas (cf. Mc 9,33-37; 10,13-18p; 1Pd 2,2), humildes e confiantes em Deus. Vivendo o amor autentico que preserva a unidade e respeita a diversidade, a comunidade se torna capaz de discernir as falsas doutrinas e manter sempre vivos o esforço e a tensão que a levam a crescer sempre mais, tornando-se a verdadeira Igreja de Cristo.

Motivados pelo amor queremos ater-nos à verdade e crescer em tudo até atingirmos aquele que é a Cabeça, Cristo. Graças a ele, o corpo, coordenado e bem unido, por meio de todas as articulações que o servem, realiza o seu crescimento, segundo uma atividade à medida de cada membro, para a sua edificação no amor (vv. 15-16).

O tema do Corpo de Cristo recebe um novo desenvolvimento com relação aos esboços de 1Cor 12,12-30 e Rm 12,4-5. Graças às afirmações referentes ao Cristo-cabeça, ao mistério e à missão da Igreja, Ef ressalta a soberania de Cristo, a responsabilidade do corpo e exprime, numa perspectiva universal, a vida que anima o povo de Deus.

A ideia do crescimento, encetada em Cl 2,19, adquire toda a sua importância. A esperança escatológica reveste uma nova forma: a espera da parusia (volta de Cristo) é substituída pelo motivo deste crescimento do Corpo (Igreja) em direção à cabeça até sua plena realização. Enquanto os apóstolos e Paulo estavam cheios de ansiedade esperando a volta de Cristo em breve (1Ts 4,17; 1Cor 15, 51s), as próximas gerações se deram conta de que precisa crescer no mundo, inculturando-se no Império Romano (cf. as cartas pastorais; 2Pd 3). – Nota-se enfim até que ponto o tema do Corpo e do seu crescimento é combinado com o da casa de Deus e da sua edificação (cf. Ef 2,20-22; Mt 16,18; 1Cor 3,10s; 1Pd 2,4ss). Pode-se recordar o verbo “edificar, construir”, dito da modelagem da esposa Eva, Gn 2; cf. Ef 5,22-32).

No grego original, os vv. 10-16 formam uma frase só! A Bíblia do Peregrino (p. 2810) comenta: Embora a expressão seja arrevesada, fica clara a mensagem de unidade e a primazia do amor.

 

Evangelho: Lc 13,1-9

Neste relato próprio de Lucas, Jesus acaba de falar sobre o sentido conjuntura histórica e a urgência da conversão.

Naquele tempo, vieram algumas pessoas trazendo notícias a Jesus a respeito dos galileus que Pilatos tinha matado, misturando seu sangue com o dos sacrifícios que ofereciam (v. 1).

“Algumas pessoas trazendo notícias a Jesus”; o que lhe contam pode assinalar o significado do presente. Tal acontecimento é de outra maneira desconhecida, bem como o acidente mencionado no v. 4. Se era um acontecimento histórico, só podia ser no Templo de Jerusalém durante a festa da Páscoa na qual leigos podiam participar do sacrifício.

Um massacre de samaritanos aconteceu durante o sacrifício no monte Garizim pelos soldados romanos no ano 35 a.C.. Talvez Lc o tenha transferido ou confundido. Às vezes, os zelotas (rebeldes violentos como Barrabás) foram chamados de “galileus”, porque muitos destes extremistas vieram da Galileia (cf. At 5,36s). A descrição da matança, “misturando seu sangue com os dos sacrifícios”, pode designar um ataque durante o ritual ou numa procissão e, além dos homicídios, acusa uma impiedade contra as oferendas e uma profanação do templo. É um fato abominável, mas retrata bem o caráter cruel de Pilatos (descrito fora dos evangelhos pelos autores judaicos Filon e Flávio Josefo).

Jesus lhes respondeu: “Vós pensais que esses galileus eram mais pecadores do que todos os outros galileus, por terem sofrido tal coisa? Eu vos digo que não. Mas se vós não vos converterdes, ireis morrer todos do mesmo modo (v. 2-3).

O ensinamento é claro: nenhuma relação direta e precisa existe entre falta e calamidade (comparar Jo 9,3); mas essa desgraça pública é um convite providencial para o arrependimento.

Os fariseus deviam ter interpretado o fato com o princípio de retribuição (nenhum castigo sem culpa, cf. Jo 9). Para Jesus não vale a aplicação mecânica do princípio de retribuição (o grande problema do livro de Jó), mas as desgraças alheias podem conservar sua força de admoestação. O que para uns é desgraça, seja para outros uma advertência.

A Bíblia do Peregrino (p.2502) comenta: Sobre a força da admoestação em cabeça alheia, cf. Ezequiel em seu julgamento comparativo: Ooliba-Jerusalém não se corrigiu, pelo contrário, “viciou-se mais que sua irmã” Oola-Samaria, quando ela sofrer o castigo exemplar, “serão admoestadas todas as mulheres” ou seja, cidades, nações (Ez 23,11.48). Amós, por experiência própria, prega sobre admoestações vãs, (Am 4,6-13). Os livros sapienciais advertem, quem não aproveita o tempo para arrepender-se, não se livrará da desgraça (Sl 7,13; 50,22), e exortam para vigilância: “Não demores em voltar a ele nem delongues de um dia para outro” (cf. Eclo 5,5-7).

E aqueles dezoito que morreram, quando a torre de Siloé caiu sobre eles? Pensais que eram mais culpados do que todos os outros moradores de Jerusalém? Eu vos digo que não. Mas, se não vos converterdes, ireis morrer todos do mesmo modo” (vv. 4-5).

A notícia detalhada mostra a historicidade do fato, talvez a construção do aqueduto por Pilatos tenha causado a queda da torre. Lc podia ter visto nestes dois fatos um anúncio da guerra judaica que os zelotas junto com os saduceus começaram em 66 d.C., mas os romanos venceram e destruíram Jerusalém com seu Templo no ano 70 (cf. 19,41-44; 22,28-31).

E Jesus contou esta parábola: “Certo homem tinha uma figueira plantada na sua vinha. Foi até ela procurar figos e não encontrou. Então disse ao vinhateiro: ‘Já faz três anos que venho procurando figos nesta figueira e nada encontro. Corta-a! Por que está ela inutilizando a terra?’ Ele, porém, respondeu: ‘Senhor, deixa a figueira ainda este ano. Vou cavar em volta dela e colocar adubo. Pode ser que venha a dar fruto. Se não der, então tu a cortarás’” (vv. 6-9).

Lucas apresenta como parábola o que nos outros evangelistas sinóticos (Mc e Mt) é a ordem de Jesus à figueira de secar, um gesto simbólico e ato de severidade (Mc 11,12-14p) situado entre a entrada em Jerusalém e a purificação do Templo. Lc preferiu esta parábola sobre a paciência. Esta parábola retoma as ameaças clássicas contra a árvore infrutífera e improdutiva.

A Bíblia do Peregrino (p. 2502) comenta: O tema é também o tempo último para arrepender-se. A “figueira” pode ser símbolo de Israel (Jr 8,13; Os 9,10; Mq 7,1). “Fruto” é metáfora frequente de ação responsável e de suas consequências (Pr 1,31; 12,14; 31,31). Um dado próprio dessa parábola é a intercessão do vinhateiro a favor da figueira pedindo moratória (cf. as sucessivas intercessões de Amós, duas escutas, duas reservas: Am 7,1-9; 6,1-3). Embora Jesus introduza essa moratória, cada árvore pode esgotar seu tempo de tolerância.

“Ainda este ano”, talvez uma alusão à duração do ministério de Jesus, como se deduz do quarto evangelho.

O site da CNBB comenta: Quem vive na graça de Deus tem a vida dentro de si. Ao contrário, a paga do pecado é a morte. Esta verdade deve sempre estar presente em nossas mentes, a fim de que possamos, apesar dos nossos pecados, buscar a verdadeira vida que vem de Deus. A partir dessa consciência, devemos procurar constantemente a conversão, a busca da santidade, a coerência da nossa vida com a fé que professamos. O Evangelho de hoje nos mostra que Deus tem paciência conosco e, por meio da sua graça, está sempre contribuindo para a nossa conversão e para a nossa santificação, mas é necessário que também nós procuremos fazer a nossa parte.

 

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