27 de Setembro 2019, Sexta-feira: “E vós, quem dizeis que eu sou?” Pedro respondeu: “O Cristo de Deus” (vv. 19-20).

25ª Semana do Tempo Comum 

Leitura: Ag 1,15b-2,9

Na leitura de hoje continuamos a profecia de Ageu. Este profeta atuava poucos meses, mas conseguiu motivar o povo para concluir a reconstrução do Templo em Jerusalém na época pós-exílio durante o reinado do rei persa Dario. Ageu pronuncia seu segundo oráculo (outros já contam 1,12-15a como segundo) que se compõe de duas peças: 1,15b-2,5, uma palavra de alento, e 2,6-9, uma promessa magnífica, hiperbólica; tudo pontuado por fórmulas de autoridade divina.

No segundo ano do reinado de Dario, no dia vinte e um do sétimo mês, fez-se ouvir a palavra do Senhor, mediante o profeta Ageu: (1,15b-2,2).

A introdução cronológica segue o mesmo patrão de primeiro oráculo (1,1). Encontramo-nos em meados de outubro de 520 a.C., o “dia vinte e um do sétimo mês” indica quase um mês de trabalho na reconstrução do templo. No calendário judaico, é o último e grande dia da festa das Tendas, uma das três festas de peregrinação à Jerusalém (juntamente com Páscoa e Pentecostes) e ocasião de grandes cerimônias no Templo que atraiam multidões (Lv 23,33-36.39-43; Dt 16,13-15; cf. Jo 7,37).

“Vai dizer a Zorobabel, filho de Salatiel, governador de Judá, e a Josué, filho de Josedec, sumo sacerdote, e ao resto do povo: ‘Há dentre vós algum sobrevivente que tenha visto esta casa em seu primitivo esplendor? E como a vedes agora? Não parece aos vossos olhos uma sombra do que era?’ (vv. 2-3).

Os destinatário deste oráculo são os mesmos do anterior (1,1). Talvez Ageu escolhesse esta data pela presença das autoridades civis e religiosas reunidas em Jerusalém junto com o “resto do povo” (repatriados). No reinado de Salomão, o templo fora dedicado durante essa festa (1Rs 8,2.65; cf. as profecias sobre o novo templo em Ez 45,25; Zc 14,16).

O patrão pergunta-resposta (1,9-11) continua na primeira parte deste oráculo. As três perguntas se referem aos sobreviventes e ao templo antigo de Salomão que fora destruído em 587 a.C. pelo rei babilônico Nabucodonosor.

As pessoas que viam a simplicidade dos primeiros trabalhos no Templo reconstruído ficavam desapontadas ao compará-lo com a suntuosidade do Templo de Salomão. Tudo acontecia em tom menor: um descendente de Davi sem trono (Zorobabel), um sumo sacerdote sem Templo (Josué). Os “sobreviventes”, anciãos com sua recordação nostálgica, engrandeciam o antigo Templo, deduzindo, pelo volume das obras, que o próximo Templo seria muito inferior (Esd 3,12) por causa do progresso lento da reconstrução desde 536 a.C.

Mas agora, toma coragem, Zorobabel, diz o Senhor, coragem, Josué, filho de Josedec, sumo sacerdote; coragem, povo todo desta terra, diz o Senhor dos exércitos; ponde mãos à obra, pois eu estou convosco, diz o Senhor dos exércitos. Eu assumi um compromisso convosco, quando saístes do Egito, e meu espírito permaneceu no meio de vós: não temais (vv. 4-5).

Nessa humildade vivida ressoou a palavra de Ageu. Lideranças e membros da comunidade são exortados a ter “coragem” (três vezes; mesma palavra dirigida ao Josué da conquista: Js 1,6. 9.18) e não temer.

“Compromisso” é em hebraico dabar (literalmente, “palavra”), com que temos um trio sugestivo (cf. vv. 4c.5ab) que São Jerônimo interpreta em chave trinitária: “EU estou convosco, … assumi um compromisso (MINHA PALAVRA) convosco, … MEU ESPÍRITO permaneceu (convosco) no meio de vós” (como outrora a coluna de fogo, “quando saístes do Egito”: cf. Ex 13,21-22; 14,19).

Ageu salienta que o importante não é o edifício, mas a aliança com Javé: “Eu estou convosco” (v. 4; 1,13). A seguir anuncia a promessa de um destino glorioso, em que as nações e suas riquezas se concentrarão nesse Templo.

Isto diz o Senhor dos exércitos: Ainda um momento, e eu hei de mover o céu e a terra, o mar e a terra firme. Sacudirei todos os povos, e começarão a chegar tesouros de todas as nações, hei de encher de esplendor esta casa, diz o Senhor dos exércitos. Pertence-me a prata, pertence-me o ouro, diz o Senhor dos exércitos. O esplendor desta nova casa será maior que o da primeira, diz o Senhor dos exércitos; e, neste lugar, estabelecerei a paz, diz o Senhor dos exércitos” (vv. 6-9).

A segunda parte do oráculo anuncia bênçãos futuras para a comunidade. A incerteza de que quando serão concedidas se indica por “ainda um momento”. Em vista das perturbações políticas do momento, considera-se muito próxima a realização messiânica (v. 6 é citado em Hb 12,26-27).

Tradições mais primitivas atribuíram o abalo cósmico a Deus (cf. Am 5,18; 8,8s; Is 2,13-21; 13,13; Ez 38,20; cf. Jl 2,10; 3,16). Também aos olhos de Ageu, só Deus dirige a história, mas aqui promete uma nova era.

A Bíblia do Peregrino (p. 2277) comenta: A promessa com a sua grandeza parece desmentir a proximidade do cumprimento. A terminologia nos faz contemplar um dia histórico transcendental, com acompanhamento de teofania cósmica e agitação internacional (Jl 2,10; 4,10; Sl 77,19). Chegarão três coisas: as riquezas das nações (cf. Is 60,9-11), a glória do Senhor (Ex 40,43; Ez 43,1-5), a paz e a prosperidade (Jr 29,11; Sl 122).

No momento em que o profeta anuncia a catástrofe que deve inaugurar a nova era, o mundo está em paz sob o reinado de Dario. O próximo abalo mundial e a reconstrução do Templo serão os prelúdios da era messiânica.

“Começarão a chegar os tesouros” (lit. “objeto de desejo”). O texto é messiânico descrevendo a felicidade desse tempo futuro. São Jerônimo traduziu-o por “o desejado”, acentuando o alcance messiânico. Lutero traduziu “a consolação”, aplicando-a ao Cristo. Calvino conhece as duas interpretações.

Outros veem nestes vv. 7-8 uma tentativa de desviar para o Templo o tributo que deveria ser pago ao rei da Pérsia. Nesse caso, o profeta Ageu estaria apoiando um movimento de rebelião contra o domínio persa (cf. a sentença de Jesus sobre a moeda de César em Mc 12,13-17s).

“Hei de encher de esplendor esta casa, … pertence-me a prata, pertence-me o ouro”. Os babilônios roubaram os tesouros e utensílios do culto no saque do templo em Jerusalém em 597 e 587 a.C. (cf. 2Rs 24,13; 25,14-17. Mas o “ouro” e a “prata” das nações (também da Babilônia) pertencem a Javé Deus e serão usados neste templo (cf. Zc 6,9-15). A situação da atual comunidade será revertida.

“O esplendor desta nova casa será maior que o da primeira, … neste lugar, estabelecerei a paz, ” cf. a paz entre Salomão e Hiram na ocasião da construção do primeiro Templo (1Rs 5,26). O Templo (cf. 2Sm 7,13) tornou-se, com Ezequiel, um tema essencial. A tradução grega acrescenta: “e que haja a paz da alma, para preservar todos aqueles que colocaram os fundamentos para erigir este Templo”. A palavra hebraica shalom (paz) significa muito mais do que ausência de guerra, é a plenitude da paz e prosperidade.

Este segundo Templo, que começou modesto, ganhará dimensões magníficas no tempo de Herodes, mas será deturpado e se tornará fonte de exploração. Jesus vai criticar essa degradação no lugar de encontro com Deus e símbolo da unidade do povo, e anunciará a substituição desse Templo por outro: seu próprio corpo (Mc 11,15-19; 14,58p; Jo 2,21). Desse modo, torna-se presente um futuro maior do que o sonhado por Ageu: o verdadeiro Templo que dá vida e une o povo é o próprio Filho de Deus, que se fez homem e não é apenas descendente de Davi, mas também seu Senhor (cf. Mc 12,55-37p; Sl 110,1).

Evangelho: Lc 9,18-22

O evangelho de hoje é uma peça-chave no evangelho mais antigo de Marcos (Mc 8,27-31): o primeiro dos discípulos, Pedro, professa sua fé em Jesus “Messias” (Cristo), mas Jesus, para evitar uma interpretação triunfalista, anuncia sua morte pela primeira vez. Lucas copia de Mc, mas a morte de Jesus já foi profetizada de modo enigmático no templo por Simeão na história da infância (Lc 2,34, cf. a tentativa de homicídio em Nazaré, 4,28-30)

Jesus estava rezando num lugar retirado, e os discípulos estavam com ele (v. 18a).

Comparando com os outros sinóticos (Mc 8,27-33; Mt 16,13-23), a versão lucana chama atenção por sua brevidade e também pelo contexto de oração em que se coloca. Em Lc, Jesus sempre reza diante de momentos decisivos (3,21; 5,16; 6,12; 9,18,29s; 11,1; 22,41p). Aqui talvez para indicar que além da confissão dos apóstolos por meio de Pedro se esconde uma profundidade insondável.

Segundo Mt 16,13 e Mc 8,27, a cena se passa na região de Cesareia de Filipe (Jo 6,59 situa cena semelhante em Cafarnaum). Lc se limita a notar o isolamento de Jesus com seus discípulos (“num lugar retirado”). Em Lc e Mc, como em Jo 6,67-71, este episódio decisivo se segue a multiplicação dos pães com cinco pães; em Mc e Mt, um pouco depois da segunda de sete pães para 4000 pagãos. Mc 6,45-8,26 e Mt 14,22-16,12 inserem, entre as duas multiplicações, uma viagem bastante longa em território pagão. Mas Lc concebe dois volumes, o Evangelho e os Atos dos Apóstolos, por isso omite esta viagem e reserva o anúncio do Evangelho aos pagãos para o segundo volume (cf. At 1,8).

Então Jesus perguntou-lhes: “Quem diz o povo que eu sou?” (v. 18b).

Jesus pergunta numa espécie de resumo de sua atividade até agora apresentando o futuro. Propõe a pergunta fundamental, “quem sou eu”, em dois tempos, para que a resposta dos discípulos se destaque sobre as opiniões do povo (v. 20). A pergunta é desafiadora (não simples curiosidade ou inquietação, como a de Herodes; cf. 9,7-9, o evangelho de ontem), e se dirige a todos.

Eles responderam: “Uns dizem que és João Batista; outros, que és Elias; mas outros acham que és algum dos antigos profetas que ressuscitou.” Mas Jesus perguntou: “E vós, quem dizeis que eu sou?” Pedro respondeu: “O Cristo de Deus” (vv. 19-20).

Cada um tem de dar sua resposta. O povo, com todo seu entusiasmo, não ultrapassa o nível profético ou de João Batista. Jesus repete a pergunta, agora a opinião dos discípulos é exigida. A eles foi dado conhecer o segredo do reinado de Deus (cf. 8,10p). Pedro responde como cabeça de todos os discípulos: “O Cristo de Deus”; a palavra grega Cristo (de crisma) significa “Ungido” (em aramaico: messias): primeiro título de Saul, rei ungido de Israel, depois título do monarca descendente de Davi (Sl 2,2.6; 18,51; 132,17; Lm 4,20). Na boca de Pedro, significa o Messias esperado e anunciado pelos profetas.

Lc repetirá esse título “Cristo de Deus” em 23,35. Ele já mostrou Jesus proclamado “Cristo” pelos anjos (1,32-33; 2,11), por Simeão (2,26.30) e pelos demônios (4,41), mas Pedro é o primeiro dos discípulos a dar este título a Jesus.

Mesmo sem o acréscimo de Mt (“Filho de Deus vivo”, Mt 16,16), essa confissão de Pedro é de grande importância e assinala uma guinada decisiva na carreira terrestre de Jesus. Enquanto a multidão se desvia em suas cogitações a respeito dele e se afasta cada vez mais, seus discípulos reconhecem pela primeira vez, de maneira explícita, que ele é o Messias (cf. 2,26). Daí por diante, Jesus vai consagrar seus esforços a formar esse pequeno núcleo dos primeiros crentes e a purificar sua fé.

Mas Jesus proibiu-lhes severamente que contassem isso a alguém. E acrescentou: “O Filho do Homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e doutores da Lei, deve ser morto e ressuscitar no terceiro dia” (vv. 21-22).

Como o segredo de messias em Mc, Lc liga estreitamente o silêncio que Jesus impõe aos seus discípulos sobre a sua dignidade messiânica ao anúncio de seu sofrimento e morte próxima. Só quando Jesus tiver ressuscitado, os Doze o proclamarão publicamente como Messias (At 2,36; cf. Mc 9,9p). Por ora, não deve divulgá-lo, para evitar interpretações equivocadas (ex. um messias nacionalista contra os romanos, guerreiro como Davi).

Não basta declarar e aceitar que Jesus é o messias; é preciso rever a idéia a respeito do messias, o qual, para construir a nova história, enfrenta os que não querem transformações. Por isso, ele “deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, sumos sacerdotes e doutores da Lei.” Estas três categorias são as três ordens que constituem o Sinédrio, o supremo conselho e tribunal dos judeus, que condenará Jesus a morte. Sua ressurreição será a sua vitória. E quem quiser acompanhar Jesus na sua ação messiânica e participar da sua vitória, terá que percorrer caminho semelhante: renunciar a si mesmo e às glórias do poder e da riqueza (9,23-26).

Lc não relata a intervenção de Pedro para afastar Jesus da morte (Mc 8,32-33; Mt 16,22-23), mas ele insistirá em 9,45 e 18,34 sobre o fato de que os discípulos não compreenderam esse anúncio (cf. 24,19-24). Esse anúncio será seguido de vários outros (9,44; 12,50; 17,25; 18,31-33; cf. 24,7.25-27).

O site da CNBB comenta: Jesus não é simplesmente um personagem histórico ou um mero objeto da razão humana, é uma pessoa viva, e uma pessoa só pode ser verdadeiramente conhecida através do encontro e do relacionamento. Só conhece verdadeiramente Jesus quem realiza na sua própria vida a experiência do Ressuscitado presente e atuante na sua história pessoal e comunitária, quem descobre que Cristo não é o sobrenome de Jesus, mas quem ele é verdadeiramente: o Messias, o Ungido de Deus, a segunda Pessoa da Santíssima Trindade, o Deus Encarnado, o Redentor de toda a humanidade. Mas é preciso que a descoberta de tudo isso seja de forma existencial, de modo que essas verdades não sejam um conjunto de palavras teóricas e vazias, mas manifestam o que Jesus significa nas nossas vidas.

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